INTERNACIONALIZAÇÃO

Docente da Universidade de Cardiff, Marco Pomati apresentou metodologia adotada na União Europeia para monitorar privação material e exclusão social

Foto: Audrey Luiza/Secom UnB
Doutoranda Priscila Santos e professores Marco Pomati e Ana Cristina Collares fortalecem laços de cooperação internacional. Foto: Audrey Luiza/Secom UnB

 

Pobreza pode ser definida como carência do que é essencial à sobrevivência. O Banco Mundial aborda tal condição em números: indivíduos que possuem renda inferior a 1,90 dólar por dia vivem na extrema pobreza. Mas existem outras maneiras de traçar a linha da pobreza, que não avaliam apenas a renda. É nessa perspectiva que atua o doutor em Política Social Marco Pomati, um dos responsáveis pela metodologia utilizada em sensos oficiais da União Europeia.

 

“Para medir pobreza e privação material é preciso adotar indicadores sociais diferentes em cada país, porque esta condição varia de acordo com a realidade social”, disse Pomati, docente da Universidade de Cardiff, País de Gales, na abertura de seminário promovido pelo Departamento de Sociologia da UnB nesta terça-feira (23).

 

O docente integra um grupo de trabalho formado por especialistas de universidades europeias, convidado pelo Gabinete de Estatística da União Europeia, a Eurostat, para desenvolver uma metodologia de pesquisa que inclua indicadores multidimensionais de mensuração da pobreza e de padrões de vida.

 

“Os pobres são aqueles excluídos do padrão de vida minimamente aceitável em determinada sociedade. É preciso, então, identificar quais bens e tipos de atividades são essenciais para aquela sociedade e verificar quantas pessoas não conseguem atingir esse mínimo”, detalhou Pomati.

 

É a partir desse diagnóstico que são elaborados os questionários de pesquisa, contendo cerca de 17 itens. Os questionários são pensados por grupos focais em cada país, visando sua adequação à realidade social em análise. “A pesquisa pode incluir itens como ser capaz de viajar nas férias ou não ser capaz de pagar por três refeições diárias”, exemplifica o pesquisador.

 

Ao responder ao questionário, o entrevistado informa se tem ou não acesso a determinado item. Caso não tenha acesso, ele deve informar se não dispõe do item porque não pode pagar ou por não considerar necessário. Esta medida permite verificar a validade e confiabilidade das perguntas que compõem o questionário.

 

Após coletar os dados, os estudiosos fazem validações estatísticas, testando os itens dois a dois, para saber o impacto de cada par na mensuração da pobreza. Dados apresentados pelo docente mostram que, na Europa, consumir proteína diariamente e ter acesso à internet foram medidas importante para traçar a linha da pobreza. “São itens de tão amplo acesso na região que a privação a eles com certeza aponta para um situação de exclusão”, comenta Pomati.

 

Já em Uganda, na África, o estudo aponta outras variáveis da exclusão social. "Mais de 90% das pessoas consideram importante ter três refeições por dia, mas apenas 48% têm isso. Outro dado é que 54% dos entrevistados consideram essencial presentear crianças em uma ocasião especial, mas 70% não dispõem desse recurso”, complementa o pesquisador sobre resultados da metodologia.

 

Segundo Pomati, o método inclui melhores práticas de estudo porque combina a análise da renda ao conceito de privação e, assim, consegue mensurar outras dimensões da exclusão social. “Se a pobreza é avaliada apenas pela renda que possibilita ou não o acesso a comida, acaba sendo uma linha de nutrição ao invés de uma linha de pobreza. Dentro do percentual de pessoas que conseguem comer, existe uma porcentagem enorme de pessoas pobres. Comem, mas estão mal-nutridas, além de não terem acesso ao considerado como mínimo necessário naquela realidade social”, analisa o doutor em Política Social. 

Marco Pomati falou a estudantes e professores do ICS. Foto: Audrey Luiza/Secom UnB

 

COOPERAÇÃO – A vinda de Marco Pomati à Universidade de Brasília é resultado de convênio firmado com a Universidade de Cardiff, a partir de bolsa concedida pelo Programa Erasmus+, iniciativa da União Europeia de apoio universitário para mobilidade de estudantes e docentes do ensino superior.

 

“É uma troca sempre rica, com diálogo sobre como o ensino acontece em cada universidade, sobre metodologias de pesquisas adotadas, além de resultar em publicações internacionais conjuntas”, comenta Ana Cristina Collares, docente do Departamento de Sociologia da UnB.

 

Collares esteve na Universidade de Cardiff em novembro de 2018, quando estabeleceu contato com Pomati. “Ele integra um grupo criado na Inglaterra para fortalecer o ensino de métodos quantitativos nas Ciências Sociais. É exatamente a disciplina que leciono aqui na UnB, e por isso fui para esse intercâmbio. Tive oportunidade de ver como é o ensino da disciplina lá. E agora ele veio, para fazermos essa troca”, detalha a doutora em Sociologia.

 

A docente reforça os impactos da parceria para internacionalizar a área, tendo como foco o programa de pós-graduação do departamento. “Estabelecemos laços com outra região, compartilhamos tecnologias de ensino, e realizamos intercâmbio de alunos”, menciona sobre a troca que já possibilitou a ida de dois professores e dois estudantes da unidade.

 

Priscila Pereira Santos é doutoranda pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia e pesquisa relações entre privação material e alguns aspectos de sociabilidade. A acadêmica teve a oportunidade de passar seis meses na instituição do Reino Unido e garante que o intercâmbio elevou a qualidade de sua pesquisa.

 

“Acredito que a experiência foi um ponto de virada no nível do trabalho. Pude aproveitar muito, porque já tinha um projeto estruturado. Trabalhei com a pesquisa comparada entre a minha base de dados aqui do Brasil com os dados do European Social Survey, que é preenchido pelos países da União Europeia”, detalha.

Foto: Audrey Luiza/Secom UnB
O doutorando Tony Bezerra parabeniza o departamento e a Universidade pelos esforços em prol da internacionalização. Foto: Audrey Luiza/Secom UnB

 

“É possível que isso vire um capítulo da minha tese, mas já estamos trabalhando na publicação conjunta de um artigo internacional”, acrescenta Priscila. Ela incentiva a vivência internacional e reforça que é preciso se preparar. “Eu tinha essa perspectiva desde o começo do curso. É importante se preparar, para não perder a oportunidade por exigências como proficiência na língua”, indica.

 

Estudantes e docentes participaram do seminário realizado no Instituto de Ciências Sociais do campus Darcy Ribeiro. “Acho super importante a estratégia da UnB de buscar a internacionalização nesse momento de crise no país. É uma forma de se voltar para a experiência de outros países e ver como a pesquisa está sendo realizada em outros contextos”, avaliou Tony Bezerra, doutorando em Sociologia.

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