EXTENSÃO

Baniwa, quechua, tikona e tupi são as línguas que integram o conteúdo do curso gratuito. Para este semestre, vagas já estão esgotadas

 

Autur Gonçalves, doutorando em Linguística, ensina a palavra obrigado em sua língua.
O doutorando em Linguística Artur Gonçalves ensina a palavra obrigado em sua língua: a Baniwa. Foto: Raquel Aviani/Secom UnB.

 

Matsia. A palavra apresentada pelo doutorando em Linguística Artur Garcia Gonçalves significa obrigado. O vocábulo faz parte da língua indígena baniwa, ofertada pelo UnB Idiomas na primeira turma de Línguas Indígenas e sua Diversidade. Com oferta gratuita, o curso de 45 horas-aula inclui as línguas quechua, tikuna e tupi.

 

Os encontros acontecem nas manhãs de sábado, no Centro de Convivência Multicultural dos Povos Indígenas da Universidade de Brasília, a Maloca. As aulas serão ministradas por quatro acadêmicos da UnB; três deles com formação para o ensino de línguas pelo Programa de Pós-Graduação em Linguística do Instituto de Letras (IL).

 

A novidade despertou tanto interesse nas comunidades externa e interna que as 30 vagas ofertadas foram preenchidas nos primeiros dias de matrícula. O UnB Idiomas estuda a possibilidade de ampliar a oferta para o próximo semestre. Diretora da Coordenação Indígena (Coquei/DIV/DAC), Cláudia Renault comemora a grande demanda pelo curso.

 

“Essa iniciativa abre espaço para que os acadêmicos indígenas da UnB possam atuar na docência e valoriza a cultura deles”, considera. Ela garante que, além da expertise da língua, os acadêmicos têm a formação necessária para exercer a docência. “Será uma prática da cultura tradicional aliada à prática acadêmica, representando bem o diálogo de saberes que esperamos ver dentro da universidade”, opina.

 

O baniwa Artur Gonçalves está cheio de expectativa por compartilhar sua língua. "Muitos só têm conhecimento sobre a língua tupi. Ainda nos reconhecem pela ideia genérica da palavra índio. Mas, na realidade, o que existe são povos indígenas, com uma enorme diversidade de língua, cultura e costumes. Essa diversidade está aqui na UnB e temos que mostrá-la.”

 

METODOLOGIA – A proposta do curso inédito surgiu da demanda dos indígenas por turmas do idioma inglês. Por meio de parceria entre a Coquei e o UnB Idiomas, os indígenas conquistaram a oferta gratuita de uma turma de inglês, oferecendo, em contrapartida, o ensino de suas próprias línguas.

 

Com duração de quatro horas, cada encontro aborda duas das quatro línguas contempladas no curso. Na primeira metade da aula é ministrado uma delas, após intervalo, a continuação é com outra. No sábado seguinte, é a vez das duas não contempladas anteriormente.

 

Aluno do último semestre de Antropologia, o indígena Iury da Costa Felipe será professor da língua tikuna e acredita que a iniciativa poderá contribuir para combater o preconceito. “Ao chegar na cidade grande, percebi que as pessoas tinham preconceito por eu ser indígena. Em sala de aula, eu era excluído quando se tratava de atividades em grupo”, conta o universitário, que valoriza o trabalho coletivo, uma das práticas do seu povo.

 

Iury também vê no curso a oportunidade de se desenvolver na docência. “Meu pai tem formação em matemática e física. Minha tia é formada em tikuna, português e espanhol. Sempre fui incentivado a fazer faculdade e pretendo ser professor”, compartilha o graduando, que já foi aprovado nas primeiras etapas do mestrado em Antropologia Social da UnB e pretende seguir na carreira acadêmica antes de retornar ao seu povo. 

O acadêmico Iury da Costa Felipe irá compartilhar a língua e os costumes do povo Tikuna. Foto: Raquel Aviani/Secom UnB
O acadêmico Iury da Costa Felipe (à esquerda) irá compartilhar a língua e os costumes do povo tikuna. Foto: Raquel Aviani/Secom UnB

 

PARCERIA – Coordenador geral do UnB Idiomas, o professor Gleiton Malta reforça a importância da nova oferta. "Por sermos um programa de idiomas, nada mais justo e lógico que contemplemos nossas línguas indígenas, dando-lhes o valor que elas realmente possuem. Estamos muito felizes com a parceria", afirma.

 

Psicóloga social na Coquei, Patrícia Monteiro e Silva participou da proposição do curso. "É uma experiência piloto. Nossa expectativa é que o ensino dessas línguas passe a integrar a oferta semestral do UnB Idiomas. O objetivo maior é incluir as línguas indígenas também como disciplinas da graduação e pós-graduação", informa.

 

De acordo com Malta, pretende-se garantir a oferta das línguas indígenas nos próximos semestres, mas a continuidade dependerá "da valiosa contribuição da Coquei e, principalmente, dos indígenas envolvidos no projeto”.

 

UnB IDIOMAS – O Programa Permanente de Extensão UnB Idiomas oferta cursos em diversas línguas. Há desde cursos sequenciais até cursos específicos para a 3ª idade. A iniciativa é proposta pelo Departamento de Línguas Estrangeiras e Tradução do IL.

 

Por semestre, o programa soma aproximadamente oito mil matrículas, sem contar as matrículas em cursos corporativos, que são contratos específicos com instituições públicas e privadas. Atualmente o UnB Idiomas oferece aulas de alemão, árabe, coreano, espanhol, esperanto, francês, grego moderno, hebraico, inglês, italiano, japonês, mandarim, russo e turco.

 

Os cursos acontecem nos quatro campi da UnB: Darcy Ribeiro, Ceilândia, Gama e Planaltina. As turmas são formadas por até 22 alunos, sendo garantida a oferta de duas bolsas por turma – uma para alunos participantes do Programa de Assistência Estudantil e outra para servidores da UnB. A exceção é o curso de japonês, cujas turmas têm no máximo 15 alunos.

 

O curso Línguas Indígenas e sua Diversidade contribui para ampliar a política linguística da UnB, que tem sido executada em parceria com o UnB Idiomas e integra o Plano de Internacionalização da instituição. 

 

SAIBA MAIS – Segundo dados do Censo de 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), há populações indígenas em todos os estados brasileiros e no Distrito Federal. Os indígenas somaram, em 2010, mais de 817 mil pessoas, de 305 diferentes etnias, representando 0,26% da população brasileira. O estudo aponta que são faladas no país 274 línguas indígenas. Entre estas, estão aquelas compartilhadas por indígenas de outros países, com destaque para povos da América Latina.

 

A UnB tem contribuído para o estudo e fortalecimento das línguas indígenas, inclusive por meio do Laboratório de Línguas e Literaturas Indígenas (LALLI), criado em 1999, e que apoia pesquisadores do Programa de Pós-Graduação em Linguística (PPGL), com ênfase na linha de pesquisa Teoria e Análise Linguística de Línguas Indígenas.

 

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