PROTESTO

Para núcleo de pesquisa, violência é forma de negar os direitos humanos fundamentais às mulheres

Louise Ribeiro, 20 anos, jovem estudante do curso de biologia foi assassinada na semana do dia internacional das mulheres, pelo seu ex-namorado e colega, no laboratório de biologia, no campus da UnB. Ocorreu ao nosso lado, mulheres (estudantes, professoras e funcionárias). Como lixo, seu corpo foi enrolado em um saco plástico, colocado em um carinho de mão e levado para ser jogado ao abandono, onde, um dia depois, o assassino voltou para indicá-lo à polícia. Este assassinato causa enorme Indignação frente a uma vida interrompida de forma violenta, cruel e insana pelo ex-namorado; Incredulidade em termos que conviver diariamente com a sombra da violência de gênero no meio universitário; desesperança por sabermos que a violência está dentro do campus e que não vem de fora, podendo ocorrer com qualquer uma de nós.

 

Qualquer ato de violência (física, sexual, moral, psicológica ou outra) é, de fato, uma forma de negar os direitos humanos fundamentais às mulheres, assim como de nos impor a norma e disciplina patriarcais. Historicamente, foram construídas relações hierárquicas e sexistas entre homens e mulheres, que acabam sendo o fundamento dito natural da subordinação das mulheres. Aquelas que ousam desafiar a ordem patriarcal são perseguidas, sofrem ameaças e têm a vida sob risco. O medo da violação, do desrespeito, do constrangimento e da própria morte vem rondando os campi. Para termos a mínima (e, muitas vezes, falsa) sensação de proteção da violência, somos obrigadas a acatar um “mandato” de restrições que impactam diretamente em nossas formações, atuações, livre circulação, carreiras acadêmica e qualidade de vida. Temos que observar horários de sair e chegar, andar em grupo nos estacionamentos e nas travessias até os pontos de ônibus, receber críticas sobre nossas vestimentas, temer lugares de pouca iluminação, restringir o direito à diversão em festas e temer que a nossa alegria seja interpretada como consentimento à apropriação sexual do nosso corpo pelos homens.

 

O Núcleo de Estudos e de Pesquisas sobre a Mulher (NEPeM) se solidariza com a dor dos/as familiares, amigos/as, colegas, professoras/es e funcionários/as e lamenta, profundamente, o ocorrido. O NEPEM, há décadas, vem atuando, dentro de seus limites institucionais e humanos, no enfrentamento e combate às violências de gênero, que, cada vez mais, se manifestam visivelmente no interior do campus. Denúncias são feitas, debates são promovidos, oficinas ocorrem e, no entanto, as respostas por parte da administração, nos seus diversos níveis de institucionalidade, ainda são escassas.

 

Vale lembrar que a violência de gênero se tornou um problema global, sendo o Brasil um dos países onde as mulheres têm enorme chance de serem assassinadas: estamos na 5ª posição no ranking mundial de assassinatos. Muitos, dentre estes, são feminicídios - mortes cruéis praticadas contra as mulheres pelo simples fato de serem mulheres. Pesquisas informam que 3 em 5 mulheres já sofreram violência em seus relacionamentos, sendo o rompimento de relações afetivas ou a recusa a elas um dos momentos mais vulnerável à vida das mulheres. Segundo o Mapa da Violência - Homicídio de Mulheres de 2015, entre 1980 e 2013, foi assassinado o total de 106.093 mulheres, o que representa, aproximadamente, 11 mulheres assassinadas no país por dia. Em 1980, a taxa de assassinato de mulheres era de 2,3 por 100 mil mulheres, dobrando para 4,8 em 2013, o que corresponde a mais que 100%.

 

Choca-nos que, em lugar da irresignação e contundente denúncia, há “normalização” dessas violências, o que vai da aceitação social, como se fosse algo banal até o descaso e a culpabilização da vítima pela cultura machista. A preocupação e a atuação de coletivos feministas estudantis constituem, hoje, uma iniciativa extremamente relevante e um alento em nosso campus. Mas é preciso somarmos forças e assumirmos compromissos institucionais. As autoridades acadêmicas e dos órgãos públicos do DF devem se mobilizar e estabelecerem a prevenção e o combate a essas violências de gênero como prioridade. Em nosso meio universitário, o “tabu de sangue”, o “tabu de ofensa” e o “tabu de desrespeito” devem ser estabelecidos para nossa referência e como exemplos para a sociedade em geral. Ou seja, a principal lição de aula deve ser a cidadania, a civilidade, a resolução de conflitos de modo pacífico, a convivência ética com a diferença de gênero, de raça, classe social e religiosa.

 

Quais respostas serão apresentadas pela comunidade universitária e por sua gestão administrativa diante da morte de Louise e das outras manifestações de violências cotidianas vividas pelas estudantes, funcionárias e professoras?  Demandamos políticas institucionais e mecanismos de equidade de gênero que fortaleçam a segurança no interior do campus; que efetivem ações concretas e preventivas; que discutam profundamente o tema; que incentivem o enfrentamento à violência contra as mulheres nos campi, bem como que acolham e encaminhem, por meio de uma rede de atenção interna e externa, as denúncias de violência de modo exemplar para todo o país. Não é mais suportável que tais episódios se repitam e que a nossa população feminina esteja à mercê da boa vontade individual, dos esforços particulares e espontâneos na UnB.