OPINIÃO

José Matias-Pereira é economista e advogado. Possui doutorado em Ciência Política pela Universidade Complutense de Madri (UCM-Espanha) e pós-doutorado em Administração pela Universidade de São Paulo (FEA/USP). É professor-pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Ciências Contábeis da Universidade de Brasília. Autor, entre outros livros, de Finanças Públicas, 7. ed. GEN-Atlas, 2018.



José Matias-Pereira¹


As crises econômicas em um sistema capitalista ocorrem de forma cíclica por diversos motivos. Em geral são provocadas por crises severas oriundas do cenário externo; ou por governantes incompetentes e temerários que adotam políticas econômicas equivocadas, ou pela soma desses dois fatores. As crises causam efeitos danosos sobre a população, notadamente nos segmentos mais pobres, que são diretamente afetadas pelo desemprego e diminuição da capacidade consumir. Esse ciclo perverso, caso não seja enfrentado com políticas econômicas consistentes, tende a se reproduzir e se agravar.

 

Para compreender o que ocasionou a grave crise da nossa economia é preciso voltar no tempo recente. O Brasil, no período de abril de 2014 a dezembro de 2016, sofreu forte retração do Produto Interno Bruto (PIB). Uma retração dessa dimensão, como um tsunami, desestrutura a economia como um todo. Além dos efeitos negativos da crise mundial de 2008, a intensificação da crise brasileira decorreu da escolha de políticas equivocadas e temerárias adotadas a partir do biênio 2011-2012 pela área econômica do governo Dilma.

 

Dentre as medidas ‘inovadoras’ do governo Dilma merece destaque a adoção da denominada Nova Matriz Econômica (MNE), que provocou a redução da produtividade da economia, e por consequência, do produto potencial. A acentuada redução da atividade econômica provocou a elevação das taxas de desemprego, falências e diminuição acentuada de produção e investimentos.

 

A intensificação da crise política-econômica-ética que desaguou no impeachment da ex-presidente Dilma levou o seu sucessor, Michel Temer, no esforço de frear a crise, a propor e aprovar algumas medidas econômicas relevantes, com destaque para a PEC do teto dos gastos, reforma trabalhista e a Lei da terceirização. Essas medidas, no entanto, não foram suficientes para modificar de forma adequada o cenário econômico, conforme pode ser mensurado nos péssimos indicadores da economia brasileira apresentados a seguir:

 

– O desempenho do produto interno bruto (PIB) projetado para 2019 de 2,5% se mostra muito baixo do desejável. As contas do setor público consolidado (governo federal, os estados, municípios e as empresas estatais), registraram um déficit primário de R$ 108,258 bilhões (1,57%do PIB) em 2018. Recorde-se que, em 2016 e 2017, as contas ficaram negativas em R$ 155,791 bilhões (2,49% do PIB) e em R$ 110,583 bilhões (1,69% do PIB).

 

– A conta que registra o déficit primário (não inclui as despesas com o pagamento dos juros da dívida pública) totalizou R$ 379,184 bilhões em 2018 (5,52% do PIB). Incorporada à conta o gasto do governo central com os juros da dívida pública (resultado nominal), o déficit foi de R$ 487,422 bilhões em 2018, o equivalente 7,09% do PIB. Esse valor, utilizado na comparação internacional, é considerado alto para economias emergentes.

 

– A dívida líquida do setor público (governo, estados, municípios e empresas estatais) passou de R$ 3,382 trilhões em dezembro de 2017 (51,6% do PIB), para R$ 3,695 trilhões no fechamento do ano passado – o equivalente a 53,8% do PIB (a dívida líquida considera os ativos do país como as reservas internacionais). A dívida bruta do setor público em 2017 alcançou 74,1% do PIB (R$ 4,854 trilhões), e chegou a 2018 em R$ 5,271 trilhões (76,7% do PIB). Estima-se que a dívida bruta atinja 80% do PIB em 2021. O aumento da dívida bruta do setor pública gera dúvidas sobre a capacidade de o país honrar seus compromissos.

 

– No que se refere ao mercado de trabalho, constata-se que a população desocupada, entre 2014 e 2018, passou de 6,7 para 12,8 milhões; e a média anual de subutilização da força de trabalho saltou de 15,5 milhões em 2014 para 27,4 milhões em 2018.

 

O Brasil, diante desses dados preocupantes, encontra-se numa encruzilhada: ou adota medidas consistentes e amargas para reequilibrar as contas públicas, ou vai permanecer com a sua economia travada. Assim, a decisão do governo Bolsonaro de promover a reorganização das finanças públicas e a retomada do crescimento do país tem como primeiro obstáculo à solução do problema fiscal, que passa pela reforma da previdência social. É importante alertar, porém, que os problemas do Brasil, conforme evidenciados nos péssimos indicadores econômicos assinalados, vai exigir a realização de outras reformas estruturais, como por exemplo, a reforma tributária, política, justiça e a refundação da administração pública.

 


¹ Professor de Finanças Públicas e pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Ciências Contábeis da Universidade de Brasília. Doutor em ciência política (UCM-Espanha) e pós-doutor em administração (FEA-USP)

 

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