OPINIÃO

 

Nós, estudantes do Mestrado Profissional em Sustentabilidade junto a Povos e Terras Tradicionais (MESPT), manifestamos nosso repúdio pelo assassinato de Vitor Pinto (2 anos) em Imbituba/SC, no dia 30 de dezembro, e pela morte de Jadson Lopes (1 ano), no Tekoha Kurusu Amba/MS, no último dia 6. A criança indígena, do Povo Kaingang, foi degolada na rodoviária dessa cidade localizada no litoral  de  Santa  Catarina. Já o  bebê Guarani Kaiowa apresentava quadro de vômito e faleceu no acampamento da retomada, situada no município de Coronel Sapucaia - Mato Grosso do Sul, por falta de atendimento médico.

 

Vitor acompanhava seus pais, que trabalhariam na venda de artesanato tradicional durante a temporada de verão, como fazem, historicamente, dezenas de outras famílias dos Povos Kaingang, Guarani e Xoklen nas cidades turísticas de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul. Sônia e Arcelino Pinto saíram com seus três filhos da aldeia Condá, em Chapecó, viajando 600 km em ônibus fretado pelos indígenas - para evitar as reclamações pelo transporte dos artesanatos e o preconceito corriqueiro nos ônibus regulares. A mãe relatou que pretendiam arrecadar recursos  para a compra de material escolar para a filha mais velha, de 16 anos, que pela primeira vez saira da aldeia para estudar em meio aos não-indígenas. Na mais legítima luta pela sobrevivência da família, Sônia e Arcelino perderam a vida preciosa de seu caçula.

 

Jadson, filho de Denis Lopes e Adersiria Batista, apresentava quadro de vômitos. Acionaram a Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI), no entanto, o bebê faleceu sem receber atendimento médico. Não foi  publicada nenhuma nota sobre o caso nos sites e redes sociais da SESAI e do Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI) de Mato Grosso do Sul. O Tekoha Kurusu Amba fica no Cone Sul do estado, em município distante 420 km de Campo Grande e constitui um dos acampamentos de retomada territorial dos Guarani Kaiowa. O cacique Elizeu Lopes denunciou a constante omissão da SESAI no atendimento à saúde da comunidade, afirmando ser a décima morte infantil nessa desde 2007.

 

É inaceitável o silêncio por parte da opinião pública e a omissão do Estado, quando uma criança Kaingang é assassinada de forma brutal em uma rodoviária e um bebê Guarani Kaiowa falece sem atendimento médico, no acampamento de uma retomada, no intervalo de apenas uma semana. Essa é a realidade de luto e de luta vivenciados pelos Povos Guarani Kaiowa e Kaingang, que constituem a segunda e a terceira maiores populações indígenas do país - 43,4 mil e 37,4 mil, respectivamente, segundo dados do Censo IBGE 2010. E não se tratam de casos isolados de violência contra a vida de indígenas, sendo que o preconceito e os assassinatos são um capítulo ainda não encerrado de suas histórias.

 

Consideramos que essas mortes representam, de forma acintosa, a negação do futuro aos Povos Indígenas, sobretudo àqueles que se encontram nas regiões de maior incidência de conflitos territoriais, decorrentes da usurpação de suas terras no processo histórico de  colonização do Mato Grosso do Sul e dos estados da Região Sul. Manifestamos nossa  solidariedade  às  famílias de Vitor e Jadson e aos Povos Kaingang e Guarani Kaiowa, compartilhando de seu luto, e reafirmando o nosso compromisso de encaminhar solicitações de  apurações e providências para as instâncias competentes.

 

Brasília, 13 de janeiro de 2016.

 

Estudantes da Segunda Turma (2015/2017)

 

Mestrado em  Sustentabilidade junto a Povos e Terras Tradicionais Universidade de Brasília (UnB)

 

O MESPT é uma iniciativa inovadora, que promove o diálogo de saberes e a pesquisa implicada, por meio da formação no nível da pós‐graduação de turmas multiétnicas, compostas por indígenas, quilombolas e demais estudantes oriundos de comunidades tradicionais ou não.

ATENÇÃO O conteúdo dos artigos é de responsabilidade do autor e expressa sua visão sobre assuntos atuais. Os textos podem ser reproduzidos em qualquer tipo de mídia desde que sejam citados os créditos do autor. Edições ou alterações só podem ser feitas com autorização do autor.