UnB.FUTURO

Pesquisador René Lévy apresentou principais debates acadêmicos feitos na França sobre tema  

 

Foto: Beatriz Ferraz/ Secom UnB

 

Um padre degolado na cidade francesa Rouen; o atentado em Nice, que vitimou 84 pessoas e o ataque à casa noturna Bataclan, em Paris, com saldo de 130 mortos. Esses são três dos ataques terroristas que ocorreram na França, na história recente. O impacto foi o esperado pelos perpetradores: causaram clima de insegurança. René Lévy, mestre em criminologia pela Universidade de Montreal e doutor em Direito pela Universidade de Bordeaux, foi convidado para a segunda edição deste semestre do UnB.Futuro e proferiu palestra com o tema Jihadismo, radicalização, Islã: uma visão sobre os debates acadêmicos na França. O encontro foi na tarde da última quarta-feira (21), no auditório da Reitoria da Universidade de Brasília.

 

Estiveram presentes o reitor Ivan Camargo e o decano de Pesquisa e Pós-Graduação, Jaime Martins de Santana. A professora Maria Stela Grossi Porto foi a mediadora do encontro.

 

“Há muitas questões abertas sobre o tema. A palestra não procura extinguir o assunto. Apenas incitar o debate”, afirmou. Para tanto, iniciou com os conceitos de terrorismo e jihadismo. O primeiro refere-se aos atos de violência cometidos por uma organização com objetivo de causar insegurança, para chantagear um governo, satisfazer ódio contra uma comunidade, um país, um sistema. Já jihadismo corresponde às ideias e ações dos fundamentalistas extremistas que recorrem ao terrorismo para reivindicar o conceito de Jihad Islâmico.

 

Lévy esclareceu: “Não é a primeira onda de terrorismo pela qual a França passa”. O pesquisador se refere aos atentados ocorridos, na década de 1960, principalmente, em decorrência da guerra da Argélia, que resultou na independência do país, até então, colônia francesa.

 

Professora Maria Stela Grossi mediou o encontro. Foto: Beatriz Ferraz/Secom UnB

Segundo Lévy, estima-se que que 15 mil jihadistas provenientes da França tenham sido fichados pela polícia. A faixa etária dessas pessoas gira em torno dos 25 anos. Uma análise dos 22 terroristas que atacaram o território francês desde 2012 indica que são homens jovens, entre 19 e 34 anos. Dois terços deles nasceram na França ou são de nacionalidade francesa. Trinta por cento havia feito viagens à Síria, Iraque ou outros territórios da jihad, antes dos atentados. Outros 25% haviam feito tentativas de viagens.

 

“Não é a primeira vez que jovens se mobilizam para combater por uma causa no exterior, contra seu país. Um exemplo é a Guerra Civil Espanhola”, comentou. “Não quero dar a impressão de que estou comparando as duas causas. Mas destacando as semelhanças do ponto de vista analítico”, preveniu. “Existem também os exemplos da Nicarágua e da guerra da Bósnia e Herzegovina".

 

O convidado listou quatro condições estruturais do combatente voluntário. A primeira refere-se à existência de uma ideologia. “Uma grande narrativa opondo duas visões de mundo”, disse. Além disso, há “um teatro de operações concreto que dá a ideia de que a participação de um indivíduo será decisiva para os andamentos do conflito”, explicou. Soma-se a isso uma organização logística e máquina de propaganda para mobilizar as pessoas. Por fim, população suscetível a ceder ao apelo.

 

Segundo Lévy, são múltiplas as vias de acesso à radicalização. Entre elas, lista-se o papel da família e do círculo de amigos. Considera-se, também, o papel da frustração e do ressentimento de não pertencimento à região ou à comunidade. Levanta-se, ainda, a possibilidade de algum desvio psicológico ou psiquiátrico dos autores dos atentados.

 

René Lévy destaca que essa não é a primeira onda de ataques. Foto: Beatriz Ferraz/ Secom UnB

ISLÃ – “A profunda secularização da sociedade francesa causa entraves à compreensão do fenômeno religioso da jihad por parte dos estudiosos franceses", asseverou Lévy. “Não conseguem compreender como a fé pode ser o motor das violências”, prosseguiu. “Não estamos vendo uma radicalização do Islã, mas uma islamização da raiva, do radicalismo”, disse.

 

Por fim, o palestrante comentou sobre os desafios existentes: frustrar os ataques; prevenir e tratar a radicalização; construir um Islã “compatível nas sociedades ocidentais". Lévy destacou que o desafio principal é a “demasiada quantidade de ideias e insuficiência de dados. Há necessidade de um esforço maior de investigação”, encerrou.

 

UnB.FUTURO – A Comissão UnB.Futuro é um espaço de reflexão, conduzido pelo Decanato de Pesquisa e Pós-Graduação (DPP) em parceria com o Núcleo de Estudos do Futuro da UnB (n-Futuros/Ceam), em que se propõem ideias e ações para construir um modelo de universidade compatível com a realidade e com as demandas da sociedade contemporânea. São promovidas diversas reuniões para debater temas ligados à educação, cultura e ciência e tecnologia. A partir do assunto escolhido, faz-se o convite para que um especialista do assunto ministre conferência introdutória à comunidade acadêmica, seguida de debate.