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OPINIÃO

Pedro Demo é PhD em Sociologia, Alemanha, 1971; fez pós-doutorado na Universidade da Califórnia (UCLA - Los Angeles). É professor titular aposentado e emérito da UnB (Sociologia) e professor do Programa de Pós-Graduação em Direitos Humanos da UnB. Possui mais de cem livros publicados. 

Pedro Demo

 

O desempenho do Brasil no PISA sempre foi muito insatisfatório, em parte porque nosso sistema de ensino se dedica ao repasse conteúdo, não ao aprendizado. Em sala de aula, não existem atividades de aprendizagem sistemáticas, como ler, estudar, pesquisar, elaborar, argumentar, analisar. O PISA tem fama de não ser conteudista, evitando puxar pela memorização, embora muitos considerem ser apenas “menos” conteudista, pois todas as provas do formato do PISA tendem ao conteudismo.

 

Somente 2% dos estudantes brasileiros tiveram o maior nível de proficiência (níveis 5 ou 6) em pelo menos um conteúdo (média na OECD foi de 16%), e 43% ficaram abaixo do nível mínimo de proficiência (nível 2) nos três conteúdos (média da OECD de 13%). Em leitura, o Brasil ficou na 58ª posição de 79 países, à frente da Argentina (64ª); em matemática, na 71ª posição, também à frente da Argentina (72ª); em ciências, Brasil e Argentina empataram na 65ª posição. Sempre a Argentina apareceu à frente, mas, desta vez, supreendentemente, ficou atrás. Não serve de consolo, certamente, mas reforça o quanto é difícil melhorar o desempenho escolar.

 

Um pedaço importante do problema está no desempenho docente, questão que vai rebater na universidade, onde são formados os docentes (pedagogia e licenciatura). Não se trata de “culpa-los”, não só porque a correlação entre desempenho docente e discente não é mecanicista (linear), mas também porque aprendizagem ocorre na mente do estudante, não na aula do professor (é mediação, não causação).

 

A deficiência de aprendizagem pode dever-se a muitos outros fatores, alguns dos quais escapam da órbita escolar, como pobreza familiar dos estudantes, e a outros que continuam marcando a escola brasileira, como falta de condições minimamente adequadas de trabalho, ao lado da desvalorização docente crônica. É regra global que a melhoria da aprendizagem do aluno depende fortemente da qualidade docente, mesmo que o docente seja “fator externo”. Muitos reconhecem que a universidade não tem correspondido ao desafio, mantendo pedagogias e licenciaturas marcadas pelo “ensino instrucionista” (aula, prova, repasse), fabricando um “profissional do ensino”, quando precisamos de um “profissional da aprendizagem”.

 

Marcantemente, o PISA vem indicando que a Ásia despertou para este desafio e o impulsiona em tom maior. Quatro cidades chinesas ficaram com o primeiro lugar (Pequim, Xangai, Jiangsu, Guangdong), e Cingapura no segundo lugar, sem falar em posições elevadas do Japão e Coreia do Sul. Como asiáticos facilmente praticam memorização insistente, gostam de aula e transmissão de conteúdo, apreciam disciplina comportamental rígida, há críticas a este êxito asiático, preferindo-se pedagogias mais autorais ou formativas, como seria o caso da Finlândia (que já ocupou várias vezes o primeiro lugar, no passado).

 

Os tempos atuais não toleram mero repasse de conteúdo, que, ao final, é um tipo de imbecilização. Espera-se que estudantes, desde o pré-escolar, cultivem a curiosidade por ciência, pesquisa, experimentação, autoria, e para isso precisam de docentes autores, cientistas, pesquisadores. Atrair jovens dotados para a profissão docente é desafio enorme, porque temos uma história de nivelamento por baixo, em especial em áreas tidas como mais complexas, como matemática. Nosso desempenho em matemática tem sido kafkiano. No Ideb de 2017, apenas 9.1% dos estudantes brasileiros aprenderam matemática no ensino médio – aprender mal ou nada é a regra. Quando a escola deixa para trás 90% dos estudantes, desvela um sistema de ensino caduco.

 

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