OPINIÃO

Diana Vaz de Lima é professora de Contabilidade pública e previdência no Departamento de Ciências Contábeis e Atuariais (CCA/UnB) e de Governança e accountability no setor público no Programa de Pós-Graduação em Administração (PPGA/UnB) da Universidade de Brasília (UnB). Concluiu Programa de Pós-Doutoramento em Contabilidade e Controladoria pela FEA-RP/USP, é doutora em Ciências Contábeis pelo Programa UnB/UFPB/UFRN, mestre em Administração pelo PPGA/UnB, especialista em Administração Financeira pela Fundação Getúlio Vargas e contadora pelo Centro Universitário do Distrito Federal (UDF).  É coordenadora do Grupo de Estudos e Pesquisas em Governos Locais (GEPGL) e  membro da Academia de Ciências Contábeis do Distrito Federal (ACiConDF) e da Associação Brasileira de Contadores Públicos (ABCP).

Diana Vaz de Lima1 

 

O novo presidente do Brasil mal tomou posse e a reforma da previdência já está em sua pauta de prioridades. Os números impressionam e explicam o motivo de tanta preocupação: o Brasil gasta mais de 13% do PIB em previdência, e para o ano de 2018 foi apurado um déficit (contribuições menos despesas pagas) em mais de 200 bilhões de reais.

 

Só no ano de 2017, foram estimados mais de 100 bilhões de reais de sonegação e uma renúncia contributiva de mais de 40 bilhões de reais. Mais de 450 bilhões de reais não foram recebidos ao longo dos anos (dívida ativa). Relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) aponta que um em cada dez benefícios previdenciários é pago com erro ou fraude.

 

As mudanças que estão sendo discutidas afligem milhões brasileiros que ainda veem o sistema de previdência como a garantia de um futuro seguro e uma velhice tranquila. Muitas são as especulações sobre o tema, e os especialistas se dividem sobre o melhor caminho a ser traçado.

 

Os mais céticos não acreditam que existe déficit nas contas previdenciárias. Para essas pessoas, o problema reside na forma em que essa conta é feita: como a previdência está no “tripé” do sistema de seguridade social (saúde, previdência e assistência), não faltariam recursos para pagar os benefícios previdenciários. Contudo, o corte dos benefícios assistenciais, como o programa bolsa família (que representa apenas 0,5% do PIB), e os problemas de financiamento na área da saúde mostram o quanto o desequilíbrio nas contas previdenciárias afeta as demais políticas públicas.

 

Para outros, o problema reside na má gestão e na falta de fiscalização. Entendem que se os recursos que deixaram de entrar no “caixa da previdência” fossem cobrados, como os 450 bilhões de reais inscritos em dívida ativa, o problema estaria resolvido. Contudo, esquecem de considerar que a probabilidade de receber grande parte dessa dívida é remota, ou seja, dificilmente esses valores algum dia entrarão para os cofres públicos. E mesmo que esses recursos fossem integralmente arrecadados, cobririam pouco mais de dois anos de déficit nas contas previdenciárias.

 

Entre os que consideram que o sistema previdenciário é deficitário, não são poucos os que apresentam propostas para reequilibrar o sistema. A maioria defende uma idade mínima para os segurados começarem a receber os benefícios previdenciários (na faixa dos 65 anos) e a equiparação das regras entre homens e mulheres (as mulheres no Brasil têm um bônus de cinco anos comparativamente aos homens).

 

Na mesa de discussões da reforma previdenciária também não deve ser minimizado o impacto do envelhecimento populacional e da queda da fecundidade. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que a taxa de fecundidade no Brasil caiu de 6 filhos por mulher na década de 1960 para 1,7 filhos por mulher em 2018. Com relação à expectativa de vida, em 2018 o Brasil alcançou a maior média, quando a longevidade chegou a 76 anos contra 54 anos na década de 1960. O reflexo desses números é imediato nas contas previdenciárias: com menos contribuintes ao longo dos anos e mais despesas com benefícios pagos por mais tempo, a tendência é que o déficit da previdência continue crescente com o passar dos anos.

 

Como se vê, são muitos os desafios a serem enfrentados pelo novo governo. Além do aumento das exigências para receber os benefícios previdenciários e do cuidado com as questões demográficas, devem ser estabelecidas boas políticas de governança para combater os erros e fraudes apurados. O Governo brasileiro também deve investir em ações de transparência: a sociedade deve saber quem deve e quanto deve para o sistema, quais são suas fontes de financiamento e quem são os seus beneficiários.

 

Independentemente da proposta que vier a ser apresentada, é preciso considerar que a previdência é um patrimônio do trabalhador brasileiro. O Brasil está entre os países que oferecem a maior cobertura previdenciária para seus trabalhadores, com mais de 80% dos idosos amparados pelo sistema. Manter essa conquista vai exigir um pouco de sacrifício de cada um de nós.

 

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¹ Professora de contabilidade pública e de contabilidade do setor previdenciário do Departamento de Ciências Contábeis e Atuariais da Universidade de Brasília. Suas pesquisas são desenvolvidas nas áreas de contabilidade pública, governança no setor público e previdência.

 

 

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