OPINIÃO

Juliano da Silva Cortinhas é professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília. Graduado em Direito pela Universidade Federal
do Paraná, mestre em Relações Internacionais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul e doutor em Relações Internacionais pela UnB. É professor visitante na Universidade da Virginia (EUA), onde atua com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).

Juliano da Silva Cortinhas

 

A invasão da Rússia à Ucrânia é, até o momento, a etapa mais importante de um longo processo iniciado há algumas décadas. Trata- se de um episódio que somente ocorreu por uma combinação complexa de fatores que, se não forem compreendidos, deixarão de gerar lições para que a paz seja reconstruída rapidamente e de modo duradouro. Entre as várias causas do conflito, três são mais relevantes, sendo duas estruturais e uma conjuntural.


A primeira é mais profunda, pois se refere ao reequilíbrio entre as grandes potências. Os Estados Unidos (EUA) vêm perdendo poder relativamente à Rússia e à China. Suas incursões imperialistas mal calculadas em várias regiões do mundo, uma sucessão de crises econômicas e os diversos problemas em seu sistema democrático minimizaram sua capacidade de liderar. Em paralelo, China e Rússia vêm aumentando seu poder relativo, a primeira com base em grande crescimento econômico, que permitiu a construção de um aparato de defesa moderno, e a segunda por meio da manutenção da forte capacidade militar e do crescimento econômico por meio exportação de commodities, o que tornou boa parte da Europa dependente dela.


A segunda causa estrutural é a ampliação excessiva da Organização do Atlântico Norte (Otan) em direção ao leste. Muitos ícones do chamado "realismo", uma das correntes mais difundidas das relações internacionais, avisaram sobre os riscos dessa expansão. John Mearsheimer, Henry Kissinger e George Kennan, entre outros, apontaram que era uma postura inadequada. Vídeos e artigos deles prevendo a possibilidade de uma reação russa viralizaram na internet nos últimos dias.


Além das causas estruturais, há uma mais específica. A Rússia é comandada por um líder imperialista, autoritário e hábil. Putin é um estrategista político e militar competente, que se mantém no poder em um cenário político extremamente complexo há mais de 20 anos. Essa capacidade lhe dá, na conjuntura atual, certa vantagem em relação a líderes de países democráticos que passam por processos de revisão de suas políticas a cada eleição.


Em princípio, parece natural apontar que quaisquer conflitos que envolvam grandes potências sejam fenômenos multicausais. Apesar disso, a velocidade dos tempos atuais, o excesso de informações, a soberba e o despreparo está levando líderes de ambos os lados a não compreender a complexidade da situação. Preferem, ao contrário, visões maniqueístas em que o lado de quem dá o discurso procura o bem, enquanto o mal está no opositor. O resultado é uma baixa capacidade de compreensão mútua, o que vem sendo agravado porque muitos analistas têm repetido acriticamente o discurso de seu lado preferido.

 

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Publicada originalmente no Correio Braziliense em 02/03/22.

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