OPINIÃO

Ricardo Festi é professor do Departamento de Sociologia e PPGSOL/UnB.

 


Cícero Muniz é doutorando PPGSOL/UnB.

Ricardo Festi e Cícero Muniz 

 

Este ano completam-se cerca de 99 anos que trabalhadoras e trabalhadores, sejam do campo ou da cidade, comemoram o 1º de Maio, o dia do Trabalho. Consolidada a partir de 1924 aqui no Brasil, esta data marca a comemoração da instituição do trabalho formal – que a posteriori seria abarcado pela Consolidação das Leis do Trabalho, a partir de 1943. Todavia, inúmeros outros países a comemoram. Mas por quê?


Esta data representa, em nível internacional, o reconhecimento simbólico e político das lutas de todas(os) que trabalham em prol de melhores condições, trabalho digno e pela emancipação social, e foi instituída a partir de uma homenagem às(aos) operárias(os) de uma greve ocorrida em Chicago (EUA), no ano de 1886. Nesta greve, milhares de trabalhadores reunidos reivindicavam a redução da jornada de trabalho de 13 para oito horas diárias, salários dignos e melhores condições de trabalho.


De lá para cá, graças a esses e outros movimentos, muita coisa mudou: após a Segunda Guerra Mundial, houve um esforço mais ou menos geral pela regulamentação do trabalho ao redor do mundo, com a instituição das jornadas em 8h por dia/44h semanais, salário mínimo, previdência e seguridade social, direito de associação, representação sindical… Em suma, houve um processo relativamente unificado entre movimentos de trabalhadores, governos, Estados e nações por um trabalho mais justo, digno e decente para trabalhadores ao redor do mundo.


Parecia então que o capitalismo havia encontrado e se submetido a um processo civilizatório que levaria a classe trabalhadora ao paraíso… Mas não. Em meados da década de 1970 do século passado, a combinação entre crises locais e globais, estagnação econômica, ascensão do neoconservadorismo, inflação e reestruturação produtiva e tecnológica trouxe um revés a esse processo, restabelecendo de novo o cabo de guerra entre o Capital e as forças do Trabalho. O surgimento e a ascensão do neoliberalismo marcam este período, e aqueles outros que virão.


Desde então, observamos, ora mais atônitos, ora mais combativos, uma investida feroz e selvagem do Capital sobre tudo aquilo que havia sido estabelecido até então. Desregulamentação e flexibilização do trabalho, regulamentação da terceirização, reformas trabalhistas e previdenciárias, aumento do trabalho informal, precarização do trabalho, acidentes de trabalho e insegurança, empreendedorização… A lista de processos retrógrados e reacionários é extensa, e não há como listar e se aprofundar em todos aqui. Em resumo, eles ilustram as várias investidas, em solo ou combinadas, contra tudo aquilo que foi construído com muito suor, muita luta, muitas lágrimas e muito sangue. Como resultado, eles deixam um legado de insegurança, desamparo, angústia e desolação. Parece que as forças do trabalho se encontram em um poço sem fundo, sob uma tempestade sem fim, onde o dia parece não poder raiar. E nesse sentido, você deve se perguntar: ainda há o que comemorar?


E nós humildemente lhe respondemos, camaradas: há sim! Tal qual aquelas(es) que há centenas de anos desafiaram a ordem estabelecida e se puseram a pôr a limite os grilhões que lhes aprisionavam, nós devemos nos inspirar no exemplo dessas mulheres, homens, negros, indígenas e (i)migrantes que se puseram em movimento em prol da igualdade e da liberdade, da dignidade e da vida. Diz o ditado popular que “enquanto houver vida, há esperança!”. E digamos, além: enquanto houver vida e esperança, haverá utopia a nos sustentar para seguirmos em frente.


Por isso, neste mais novo 01 de maio, convidamos vocês a pensarem, refletirem e somarem forças no agir por essa retomada da utopia, da esperança e da transformação. Vamos juntos renovar nossas lutas. Cada um(a) contribui com o que lhe é possível, e todas(os) nós, juntas(os), somamos um horizonte de revoluções.


E é imbuído desse espírito, muitas vezes pessimista da razão, mas de vontade ampla e fortemente otimista, que um conjunto de pesquisadoras(es) vinculados à Associação Brasileira de Estudos do Trabalho (Abet) se reunirá alguns meses adiante, entre 05 e 09 de setembro, na Universidade de Brasília, para debater e refletir sobre os “futuros do trabalho”, na esperança de reencontrarmos os caminhos para a reconstrução do trabalho digno, decente, e, também, da proteção social necessária a esta e às futuras gerações que vivem-do-trabalho.

É uma pequena contribuição, diante do tamanho da empreitada necessária, mas é um primeiro passo rumo a uma práxis transformadora. E você, o que vai fazer? Eu te digo, camarada: junte-se a nós.

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