OPINIÃO

Flaviane Canavesi é docente na Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária da Universidade de Brasília (FAV/UnB). Coordenadora do Núcleo de estudos, pesquisa e extensão em Agroecologia. Doutora em Planejamento Urbano e Regional pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Mestre em Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade pelo Programa de Pós-Graduação de Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade (CPDA) da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), com formação em Agroecologia e Desenvolvimento Rural Sustentável pela Universidad Internacional de Andalucía (UNIA)/Espanha. Engenheira agrônoma graduada pela Universidade Federal de Viçosa (UFV).

Flaviane Canavesi

 

O acesso à alimentação diversificada, com produtos frescos, de qualidade e em quantidade suficiente tem impacto positivo sobre a saúde. Em conformidade com o Guia Alimentar para a População Brasileira do Ministério da Saúde, os alimentos in natura e minimamente processados devem ser a base de uma alimentação nutricionalmente balanceada, saborosa, culturalmente referenciada e promotora de um sistema alimentar social e ambientalmente sustentável.

 

Na agricultura, considera-se que num ambiente equilibrado, uma planta saudável será mais dificilmente atacada por pragas e doenças.

 

Há uma interrelação entre os seres na natureza, e a maior ou menor expressão de saúde corresponderá à forma como manejamos os ambientes para a produção de alimentos. Esta responsabilidade está diretamente relacionada em como praticamos a agricultura.

 

O contexto de crises sucessivas requer redefinições de conceitos entre os quais o próprio sentido da agricultura. Urge repensarmos, inclusive, os propósitos da ciência e da construção de conhecimentos nos sistemas agroalimentares afinal: para que(m) servem?

 

O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente considera que as doenças transmitidas de animais para seres humanos estão em ascensão e pioram à medida que habitats selvagens são destruídos pela atividade humana.

 

Estudos cada vez mais alertam sobre o impacto dos agrotóxicos na saúde como pudemos ver a partir da síntese científica elaborada no dossiê da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco).

 

O agronegócio impõe altos níveis de desestabilização aos ambientes e desorganiza os serviços ecossistêmicos, desestruturando a interconexão possível entre os elementos que conformam a sociobiodiversidade. Esse modelo desconsidera aspectos naturais e culturais e os conhecimentos acadêmicos e aqueles tradicionais e populares os quais a própria academia ainda não alcançou sistematizar.

 

A transição para sistemas agroalimentares mais saudáveis e sustentáveis parte de princípios e bases científicas que encontram na Agroecologia a construção de conhecimentos que permitem relações mais harmoniosas de produção e vida. Experiências são acumuladas em muitas práticas protagonizadas, sobretudo, pela agricultura familiar em sua diversidade identitária, povos e territórios tradicionais.

 

Sob o enfoque agroecológico, a agricultura passa gradativamente de uma abrupta desestabilização dos ecossistemas para uma interação com o meio habitado, conferindo maior resiliência e sustentabilidade aos agroecossistemas. Uma agricultura que coloque a vida em primeiro plano deverá ser a preocupação das questões científicas para dar respostas à alimentação, à qualidade de vida e à saúde.

 

Ao Núcleo de Estudos, Pesquisa e Extensão em Agroecologia da Universidade de Brasília (NEA/UnB) se coloca o desafio de repensar a agricultura atuando em rede multidisciplinar que agrega uma diversidade de perspectivas teóricas e de métodos. O NEA reúne pesquisadoras(es), estudantes, professoras(es), agricultoras(es), bem como suas representações e organizações, promovendo uma aproximação engajada entre Universidade e Sociedade.

 

Uma agricultura baseada em princípios agroecológicos presta relevante contribuição à saúde, ao produzir alimentos que garantem a segurança alimentar e nutricional acessíveis nos mercados de proximidade seja nas feiras, entregas de cestas domiciliares, na corresponsabilização transformadora das "Comunidades que Sustentam a Agricultura (CSA)" ou das "Comunidades Agroecológicas" em assentamentos rurais, e também em políticas públicas socialmente referendadas, como programas de compras institucionais e o Programa Nacional de Alimentação Escolar. O melhor destas experiências mostra que o papel do Estado como indutor dessa transformação, sobretudo em momentos de crise, é fundamental.

 

No que concerne às nossas escolhas alimentares, cabe-nos a decisão entre ser consumidora(r) ou cidadã(o). Valorizar sistemas de produção, em sua maioria protagonizados por agricultoras(es) familiares, cujos sistemas de produção agroecológicos são comumente fruto de luta pela terra, não somente possibilita uma melhor alimentação e impacto positivo sobre a saúde, mas transforma o consumo em cidadania, em engajamento, em compromisso. Isso pode resgatar o nobre serviço de nossa agricultura para o meio ambiente e para a saúde.

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