EXTENSÃO

Iglu de Trocas disponibiliza expositor com itens para serem trocados. Projeto de grupo de estudos da UnB conta com parceria do CCBB

Freezer fica disponível em local de grande circulação do Centro Cultural Banco do Brasil. Foto: Heloíse Corrêa/Secom UnB

 

“Não usa mais? Traga para o Iglu de Trocas. Se gostar de algo, pode levar.” A mensagem é simples, a troca também. Afinal, basta abrir o freezer, deixar algo que não usa mais – mas que ainda esteja em bom estado – e pegar um objeto para si, se tiver interesse. A novidade integra o projeto Iglu de Trocas, que está disponível no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), no Setor de Clubes Esportivos Sul.

 

Iniciativa do Grupo de Estudos em Marketing Societal (Gems), a ação é coordenada pelo professor da Faculdade de Administração, Contabilidade, Economia e Gestão de Políticas Públicas (Face) da UnB, Diego Vieira. “A inspiração surgiu de uma visita que fiz ao Aquário de Ubatuba. Próximo da bilheteria, há um freezer como esse”, conta o docente.

 

Como o grupo está estudando comportamento do consumidor consciente e comportamentos de descarte, o projeto funciona como atividade de extensão. “Todo mundo tem em casa algo que não usa mais, mas que ainda está conservado. Uma das atitudes do descarte responsável é justamente a doação ou a troca, porque com isso aumenta-se o ciclo de vida do produto. Aquilo que não tem mais valor pra mim pode ter para outra pessoa”, expõe Diego.

 

O objetivo é estimular a troca solidária e também promover reflexões sobre consumo consciente. Prevista para durar um ano, a parceria com o CCBB também contempla atividades com visitantes, como oficinas com crianças. “Junto dos pedagogos que integram o Espaço de Criação, criamos algumas atividades lúdicas que envolvem troca de brinquedos”, relata.

 

Embora inicialmente a ideia fosse deixar o Iglu na própria Universidade, o Gems optou por inaugurar a iniciativa em um ambiente cultural, considerando o público que o frequenta, o conteúdo das atividades e a segurança 24 horas. No entanto, um segundo expositor já está sendo preparado, para ficar no campus Darcy Ribeiro. 

Professor Diego Vieira (ao centro) e os estudantes João Paulo Nascimento e Yuri Odaguiri. Foto: Heloíse Corrêa/Secom UnB

 

O primeiro freezer foi comprado a partir de uma vaquinha virtual. Para o segundo, a expectativa é formatar um projeto e firmar parcerias com empresas interessadas em associar sua marca à concepção de responsabilidade social corporativa. O planejamento está sendo feito pela equipe do Iglu de Trocas, que atualmente envolve sete estudantes. Entre as atribuições também estão: cuidar da manutenção do freezer, coletar dados e gerenciar as redes sociais.

 

Embora já existam iniciativas solidárias no Distrito Federal, é a primeira vez que uma ação como esta está disponível para toda a sociedade. “A gente conhece projetos parecidos como, por exemplo, empresas que mantêm guarda-roupas coletivos e postos de gasolina que disponibilizam micro-ondas para que moradores de rua esquentem sua comida. Mas igual a este eu desconheço em Brasília”, afirma o docente à frente do projeto.

 

DO FREEZER AO IGLU – Com o dinheiro arrecadado por meio de uma campanha na internet, o grupo comprou um freezer usado, doou o motor e fez instalações de luzes, rodas e plotagem. O design gráfico foi feito por uma aluna do professor Diego que se ofereceu para colaborar.

 

O Iglu foi inaugurado em dezembro de 2018 e já foram realizadas cerca de 500 transações desde então, segundo estimativa da equipe. Estudante do quinto semestre de Administração, Yuri Odaguiri atua na manutenção do equipamento e tem notado um interesse cada vez maior por parte dos frequentadores do CCBB. “Quanto mais as pessoas vão tendo contato, maior é a vontade de participar do projeto. Com o tempo, reparamos o aumento da diversidade e da qualidade dos itens deixados”, diz.

 

No entanto, o graduando ainda se preocupa com o uso da estrutura como local de descarte. “Infelizmente, ainda não há uma cultura muito difundida no país sobre esse sistema de trocas. De toda forma, fazemos a separação do que pode ser útil e do que não pode mais ser reaproveitado. Nesses casos, colocamos para reciclagem, dando uma destinação correta também”, assegura.

 

João Paulo Nascimento, estudante do oitavo semestre de Administração, participa da ação desde o início e está achando a experiência inovadora e muito enriquecedora para sua formação. “É gratificante perceber como uma ferramenta pode ser capaz de transformar a sociedade e incentivar o consumo consciente.”

 

PRODUTOS DIVERSOS – Assim como não há restrição de quem possa participar, também não há impedimentos para os itens a serem disponibilizados, desde que estejam em boas condições de uso. 

Mais de 30% dos objetos deixados ou retirados são livros. Foto: Heloíse Corrêa/Secom UnB

 

É mais comum encontrar peças de vestuário, acessórios, jogos de tabuleiro, objetos de decoração, livros, brinquedos, DVDs e CDs. No entanto, alguns itens inusitados já foram deixados, como peças para moto, instrumentos musicais e pares de sapato muito velhos. Nesse caso, é feita uma avaliação daquilo que terá demanda. A manutenção é realizada semanalmente para garantir a preservação do expositor.

 

Para o docente Diego Vieira, a principal meta é tornar o Iglu autossustentável, ou seja, que ele pare de depender de muita intervenção da equipe. Ao encontrarem o freezer vazio, a equipe se mobiliza para disponibilizar itens novos e assim estimular as trocas.

 

Um dos participantes assíduos é o funcionário do Centro Cultural, Antonio Leonardo, que frequentemente traz coisas de sua casa que já não têm função lá. “É uma ideia fenomenal, precisa ter esses espaços em Brasília para gente ter a percepção do que é viver em sociedade, do que é você dar e ter algo em troca”, considera. 

Antonio Leonardo já pegou um carregador de celular e deixou peças de bicicleta. Foto: Heloíse Corrêa/Secom UnB

 

Para ele, que trabalha na área de comunicação, é um estudo de caso interessante, à medida que possibilita observar o comportamento das pessoas. “Reproduz em partes o que é a sociedade do Brasil. Muitos não cooperam tanto, mas a ideia vai crescendo. O caminho é difícil, mas necessário.”

 

Além dos entusiastas, há aqueles que ainda não despertaram a curiosidade de conhecer de perto a proposta, como a recepcionista Cilma José. Ela e outras colegas foram convidadas pelo professor Vieira para abrir juntos o freezer e disse que ficou surpresa.

 

“Eu via, mas não tinha ideia de como funcionava. Eu nunca trouxe nada, mas percebo que as pessoas estão participando. Eu acho muito boa essa iniciativa, porque agora que tá frio, por exemplo, pode trazer um casaco ou então fazer uma doação”, comenta.

 

COLETA DE DADOS – Outra faceta da ação é a pesquisa em marketing societal, expressão que significa marketing socialmente responsável. No ato da interação, há também um formulário que possibilita a coleta de dados sobre o comportamento dos usuários. Informações, como idade, sexo, objeto que deixou e/ou levou ficam registradas.

 

Até o momento, já foram preenchidos quase 200 formulários, mas Diego Vieira considera que a grande maioria não faz o devido registro. A partir desses dados, o grupo identificou três tipos de comportamento: “O primeiro é o da troca efetiva, em que a pessoa traz algo e leva outro. O segundo é o benevolente, em que o usuário apenas doa um item. E, por fim, há o oportunista, quando a pessoa se interessa por algo, mas não deixa nada”.

 

Para o professor, infelizmente, os oportunistas ainda são a maioria. Ainda que eles não façam o registro, isso é percebido durante a manutenção. “Há quem faça promessas. Por exemplo, um dia um rapaz me disse que gostou do boné e traria um casaco no dia seguinte.”

 

Os dados são coletados regularmente e alimentam um banco de dados próprio, disponível para que os alunos possam fazer trabalhos de conclusão de curso (TCC) e também iniciação científica.

 

Alguns dados já possibilitam estabelecer um perfil do usuário: a maioria (63%) são indivíduos homens e jovens com idade entre 20 e 25 anos (27%), sendo que mais de 70% dos participantes têm até 40 anos.

A maioria dos usuários do Iglu têm entre 20 e 40 anos de idade. Foto: Heloíse Corrêa/Secom UnB

 

Quanto aos objetos, a maioria das transações são com livros, representando mais de 30% entre os deixados e os levados. Os equipamentos eletrônicos e os DVDs também têm uma grande participação entre as trocas. 

DIVULGAÇÃO – O grupo realiza ainda um trabalho de divulgação, com um perfil no Instagram: @mktsocietal. A manutenção e monitoramento dessa página também gera dados de pesquisa. Além disso, é uma forma de fazer parte das redes de outras organizações, da sociedade civil e de outros atores com iniciativas parecidas.

 

“É muito importante para compartilhar conteúdo, trocar informação e sensibilizar as pessoas para a responsabilidade social”, defende o professor.

ATENÇÃO – As informações, as fotos e os textos podem ser usados e reproduzidos, integral ou parcialmente, desde que a fonte seja devidamente citada e que não haja alteração de sentido em seus conteúdos. Crédito para textos: nome do repórter/Secom UnB ou Secom UnB. Crédito para fotos: nome do fotógrafo/Secom UnB.