Traduzir, transcrever e tentar transmitir às pessoas cegas as sensações provocadas por uma poesia. Emocionar. Esse é o objetivo da Poesia Sensorial, projeto desenvolvido pelos professores Augusto Rodrigues e Eclair Almeida Filho e pela doutoranda Josina Nunes, todos do Instituto de Letras (IL) da Universidade de Brasília. O projeto de pesquisa prevê a transposição de obras literárias para o sistema braile.
A primeira poesia a ser traduzida é Un Coup de Dés, do escritor francês Stéphane Mallarmé. Segundo os pesquisadores, esses textos criam uma relação da palavra com o som e o ritmo. Por isso, eles consideram que traduzir poesia é envolver múltiplas experiências dos sentidos. É uma relação intrínseca da imagem com a visão, fala, tato e olfato. Sendo assim, poesia, e a sua tradução, envolvem todo o corpo. “É a criação de uma “imagem de tradutor”, que se desloca no tempo e realiza um trabalho histórico, linguístico e poético”, enfatiza Augusto Rodrigues.
Para elaborar o trabalho, os pesquisadores traduzem os textos escolhidos e, simultaneamente, fazem as transposições para o método Braille. Todo o suporte técnico necessário às transcrições é realizado pela professora Carolina Dias Pinheiro, responsável em transferir todos caracteres para a impressão no sistema de leitura para cegos.
A pretensão dos pesquisadores é inserir todo o material traduzido nas diversas plataformas virtuais e instituições de apoio aos cegos. Dessa forma, as pessoas poderão a qualquer momento acessar romances, poesias e partituras de músicas.
“Nossa proposta é fazer as pessoas cegas recitarem e cantarem as poesias”, relata Eclair Almeida. Para o professor de Tradução, é muito interessante a ideia de colocar as pessoas com deficiência visual em contato com o universo das artes. O pesquisador diz que a Poesia Sensorial tem como referência o projeto Musibraille, da UFRJ. Os dois projetos de pesquisa destinam-se a criar condições favoráveis à aprendizagem artística para pessoas com deficiência visual. Para os pesquisadores, as condições oferecidas aos cegos devem ser equivalentes às das pessoas com visão normal.
AUTOR - Poeta e crítico literário, Stéphane Mallarmé (1842/1898) destacou-se por ter produzido uma literatura que se mostra, ao mesmo tempo, lúcida e obscura. Ele desempenhou papel fundamental na evolução da literatura no século XX, especialmente nas tendências futuristas e dadaístas. O escritor também pode ser incluído como um dos precursores da poesia concreta. Escreveu Le Vathek de Bekford (1876) e Les Dieux antiques (1879), entre outras obras. O poeta francês foi escolhido pelos pesquisadores para inaugurar o projeto, por ser considerado um revolucionário no modo de se ver, sentir, ouvir e ler a poesia moderna.
Além das poesias de Mallarmé, Augusto Rodrigues avalia a possibilidade de traduzir obras literárias de diversos autores e disponibilizá-las para as pessoas cegas. Em breve, o professor de Literatura pretende oferecer versões de textos de E.E. Cummings, Paul Valéry e outros artistas.