“Assistir a um eclipse é uma experiência surreal. Incrível. Tudo o que sabíamos em termos de ciência, nós vivenciamos. Temperatura caiu, vimos bichos noturnos saindo para o ambiente externo. Além do local em que estávamos ser belíssimo." Este é o relato de Renato Borges, professor do curso de Engenharia Elétrica da UnB e coordenador do projeto LAICAnSat, desdobramento do Laboratório de Aplicação e Inovação em Ciências Aeroespaciais (LAICA). “É um pôr do sol em 360 graus”, descreve Lorena Tameirão, mestranda em Sistemas Mecatrônicos na Universidade.
Ambos fazem parte da equipe que foi para a região de Rexburg, no estado norte-americano de Idaho, para lançar um balão estratosférico e coletar dados e imagens do eclipse solar total que ocorreu dia 21 de agosto. “O registro serve para compartilhar minimamente o que vivenciamos”, explica o professor.
A empreitada, nomeada missão Kuaray, foi resultado de parceria entre o LAICAnSat e o Clube de Astronomia de Brasília (CAsB). O eclipse solar de 2017 percorreu a América do Norte e teve seu ponto máximo de observação nos Estados Unidos. Além de observar o fenômeno, o objetivo da missão Kuaray foi registrá-lo em fotografias e vídeos a partir da estratosfera, a cerca de 30 km do solo. “O Clube de Astronomia nos trouxe a proposta de registrar o eclipse em 360° para fazer uma exibição em realidade virtual”, comenta o professor Renato Borges. “Até então, eclipses já tinham sido filmados de balões estratosféricos, mas não em 360 graus”, completa Augusto Ornelas, presidente do CAsB.
A equipe que viajou aos EUA foi composta por quatro integrantes do LAICAnSat (o professor Renato Borges, a mestranda Lorena Tameirão, a estudante de Engenharia Mecatrônica Stephanie Guimarães e o aluno de Engenharia Aeroespacial Matheus Fillipe) e quatro membros do Clube de Astronomia de Brasília (Augusto Ornellas, Marcelo Domingues, Arthur Svidzinski e Sérgio Rodrigues).
O desafio do projeto Kuaray era lançar plataformas estacionárias de alta altitude contendo câmeras para captar o eclipse e resgatar as plataformas no mesmo dia. O objetivo foi alcançado com sucesso. Foram usadas três câmeras Kodak e uma câmera Garmin 5k 360°. Tudo isso para promover divulgação científica.
O professor Renato Borges conta que as plataformas alcançaram 28 km de altitude do solo. No pico, chegaram a quase 30 km. “A ideia do vídeo final é de passar a sensação de estar assistindo ao eclipse dentro de um balão”, explica.
MISSÃO – A ida do grupo foi resultado de convite da Universidade Estadual de Montana e da Universidade de Dakota do Norte. Participante do projeto da NASA Eclipse Ballooning Project, a Universidade de Montana lançou, em 2014, um programa para observação do eclipse, com palestras e workshops. A mesma instituição cedeu os balões para a equipe de Brasília, além de gás combustível e apoio logístico.
No dia 20 de agosto, houve uma simulação de todo procedimento, exceto do enchimento do balão, que é um processo caro. O lançamento ocorreu no parque nacional Camas National Wildlife Refuge, no estado de Idaho. O ponto preciso foi determinado horas antes, por depender de questões meteorológicas.
No dia 21, data do eclipse, foram lançados cinco balões, quatro de altitude e um de pressão zero – que é usado por empresas privadas, como a Google, que o utiliza para o projeto de envio de internet a áreas remotas. “Houve aprendizado com o procedimento de lançamento da Universidade de Montana”, comenta o professor Renato Borges. O balão de pressão zero, por exemplo, foi uma novidade para a equipe brasileira. “A experiência nos permitiu vislumbrar novos usos e aplicações para o mercado. Vimos que não é uma realidade muito distante da nossa”, observa o docente.
APRENDIZADOS – Além disso, o lançamento permitiu à equipe aprimorar a aparelhagem. Concluíram, por exemplo, que a plataforma (em formato cúbico, construída pela própria equipe do LAICAnSat, com impressora 3D) estava pesada demais. Após retirarem algumas partes da estrutura, a fim de permitir o voo, perceberam que o cubo era mais resistente do que imaginavam.
Outro resultado da experiência foi o início das tratativas entre a UnB e a Universidade de Montana para o lançamento de nova parceria, visando a observação do eclipse solar total visível na América do Sul. O fenômeno acontece em 2019 e se repete em 2020. As instituições vão avaliar qual deles será acompanhado.
O objeto de pesquisa do LAICAnSat é a investigação de possibilidades para as plataformas estacionárias de alta altitude. A captura de imagens em 360 graus, como a que ocorreu no dia 21 de agosto, é uma dessas possibilidades, mas não a única. Segundo o professor Borges, é possível desenvolver ações com o Instituto de Meteorologia (INMET) e com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). “Nossa ideia é a de criar um ambiente para formatar propostas. Para a universidade entrar no processo de construção de ideias e de articulação entre interesses diversos”, comenta o professor.
VÍDEOS – Segundo Augusto Ornelas, as imagens da câmera principal embarcada no LAICAnSat estão em vídeos mais curtos, de 30 minutos cada, em formato 180 por 360 graus. Isso significa que cada vídeo tem apenas 30 minutos de voo e metade da esfera de visão. “O processo de edição inclui a costura das imagens semiesféricas em esferas completas, a estabilização das imagens, junção dos segmentos do vídeo para abarcar a filmagem completa de duas horas de duração – desde o lançamento até a queda – e edição final dos trechos do vídeo em realidade virtual, que será mais curto, mas trará as principais etapas do voo”, detalha o presidente do Clube de Astronomia de Brasília.
O vídeo final será disponibilizado em formato 360 graus no canal do Youtube e no perfil do Facebook do projeto. A equipe planeja utilizar as imagens para produzir, posteriormente, um filme fulldome para ser exibido em planetários. “Essa produção será disponibilizada sem custos para o Planetário de Brasília em um primeiro momento”, afirma o presidente do CAsB.
Confira o teaser: