Ronaldo Pilati Rodrigues
Infelizmente, a corrupção é um tema recorrente para os brasileiros, sempre presente nos noticiários. Mas a extensão deste tipo de comportamento vai muito além das manchetes nos portais de notícia, pois o fenômeno da corrupção está presente em nosso cotidiano, nas relações sociais mais elementares. Lamentavelmente, a corrupção faz parte da cultura das nações e, portanto, isto não é exclusividade da cultura brasileira. No entanto, as evidências de que vivemos em uma cultura que promove um contexto social altamente suscetível à corrupção são muito fortes.
Há alguns anos estruturamos um grupo de pesquisa internacional em psicologia social transcultural, o Conexão Brasil, que tem como objetivo estudar o impacto que fatores relevantes da cultura brasileira exercem sobre processos psicológicos.
Como uma tentativa de avaliar como o contexto cultural pode afetar o endosso à corrupção, desenvolvemos alguns estudos experimentais que foram publicados no mês de setembro de 2014 no Journal of Cross-Cultural Psychology no artigo intitulado “Cultura de Corrupção? Os efeitos do priming de imagens de corrupção em um contexto altamente corrupto”. Neste trabalho, examinamos como pistas situacionais influenciam as intenções de endosso à corrupção entre brasileiros em dois estudos.
Apresentamos aos participantes imagens relacionadas à corrupção, mas com diferentes conotações comportamentais (imagens sugerindo corrupção política ou imagens de um malandro). As intenções de corrupção aumentaram em ambos os estudos quando os indivíduos foram expostos às imagens de políticos corruptos, comparados com uma condição controle. No Estudo 2, os brasileiros que se identificavam mais fortemente com seu país tiveram maior probabilidade de endossar situações de corrupção, particularmente quando foram expostos à imagem do malandro. Isto em função da dupla conotação do malandro, um símbolo nacional positivo e moralmente ambíguo.
Os resultados destacam que símbolos culturais, dentro de um contexto cultural específico, podem ser conectados a diferentes padrões comportamentais. Além disso, eles constituem uma evidência positiva de que existem símbolos culturais, reconhecidos implicitamente pelos brasileiros, que produzem um aumento do endosso de comportamentos corruptos. Isto é coerente com a ideia de que o compartilhamento de tais símbolos, permissivos a comportamentos assemelhados à corrupção, cria um contexto social potencializador deste tipo de ato – com implicações negativas profundas.
Esses resultados nos trazem uma compreensão importante de como a psicologia do brasileiro recebe influência de sua cultura de socialização no concernente à corrupção.
Assim, do ponto de vista prático, quando nos preocupamos em combater a corrupção, na verdade o que devemos atacar vai muito além do controle e punição, por parte dos órgãos estatais competentes, de agentes públicos ou privados envolvidos em crimes e corrupção. Isto é necessário, mas não suficiente.
A ação anticorrupção em nossa cultura deve passar pela alteração da permissividade cultural, produzindo uma cultura forte na coibição a este tipo de comportamento. Enquanto os cidadãos brasileiros não agirem cotidianamente na busca de coibir, perante seus pares, atos corriqueiros considerados como normais ou de consequência minimizada, tais como o desvio de verba no condomínio residencial ou o estacionamento no local irregular, as bases para a mudança cultural não serão lançadas. Muitos cidadãos brasileiros já buscam coibir tais ações.
Nossos estudos também indicam que precisamos modificar a norma social que favorece comportamentos corruptos, e uma forma de atingir isto é promover e divulgar a grande maioria de cidadãos que com suas ações diárias rejeitam a corrupção e não aceitam este comportamento negativo em suas vidas.
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