José Geraldo de Sousa Junior
Em abril, o Supremo Tribunal Federal aprovou a colocação do busto de Victor Nunes Leal na sala própria da mais alta Corte de Justiça de nosso país.
Uma justa e corretíssima homenagem a uma das mais proeminentes figuras públicas do Brasil, advogado, jurista, sociólogo, político, escritor, professor, foi ministro naquele tribunal, não obstante a maneira brutal, em tempos de obscurantismo, como foi interrompida a sua judicatura no STF.
Nascido em 11 de novembro de 1914, este é, portanto, o ano do seu centenário e, certamente, essa é a razão que motiva a decisão de tão eloquente celebração. De algum modo, reconhecimento e desagravo.
Agora é a UnB quem presta tributo a um de seus fundadores. Em sua última reunião, no mês de outubro, o Conselho da Faculdade de Direito da UnB aprovou atribuir ao edifício que a abriga, o nome do notável jurista.
O STF soube cumprir com o dever de honrar aquele que foi um de seus mais destacados membros, suficientemente profícuo para inscrever na história substantiva de nosso tribunal constitucional, no curto tempo em que nele teve assento (de 1960 até 16 de janeiro de 1969, quando foi afastado por força do Ato Institucional nº 5 (AI-5), de 13 de dezembro de 1968), um legado no qual se inclui, além de votos magistrais, a criação e o primeiro procedimento de institucionalização das denominadas súmulas da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.
Agora é a vez da Faculdade de Direito da UnB, que teve Victor Nunes não apenas como um de seus mais brilhantes professores, mas um protagonista que se mostrou imprescindível no convencimento do presidente Juscelino para a criação da própria universidade. Roberto A. Salmeron, em seu livro A universidade interrompida: Brasília 1964-1965 (Editora Universidade de Brasília, Brasília, 1ª edição, 1999; 2ª edição, comemorativa do cinquentenário da universidade, 2012) faz a crônica desse protagonismo.
Mas essa participação ganha mais intensidade na própria narrativa de Victor Nunes lançada em seu discurso de retribuição à homenagem que a universidade lhe prestou em 1984, ao lhe conferir o título de Professor Emérito: "Oswaldo Trigueiro, em almoço comigo e Cyro dos Anjos, lembrou um episódio que poderia influir no espírito do presidente, o do epitáfio de Thomas Jefferson, por ele mesmo escrito. No seu breve texto, o grande estadista omitiu ter sido secretário de Estado e presidente de seu país, fazendo constar somente que havia fundado a Universidade de Virgínia, além de ter escrito a declaração da independência dos Estados Unidos e a lei de liberdade religiosa do seu estado. Fui incumbido de levar esse estímulo ao presidente Juscelino. O presidente, ao ouvir o recado de Oswaldo Trigueiro, deu um salto na cadeira. Na realidade, ele ouviu com muito interesse e compostura e comentou: "Será que o Clóvis (referia-se ao Ministro da Educação) pode ter esse projeto concluído antes da mudança da capital?".
Estávamos por volta de outubro de 1959. Respondi que, autorizado por Cyro dos Anjos, tudo já tinha sido feito por Darcy Ribeiro, com um grupo muito competente de professores e cientistas. E assim a mensagem que acompanhou o projeto da Universidade de Brasília foi assinada pelo presidente Juscelino na nova capital, no dia da sua inauguração, em 21 de abril de 1960.
A outorga do título de Professor Emérito representou, sem dúvida, uma distinção condigna do justo reconhecimento a tão relevante contribuição. Mas cabia, ainda, à Faculdade de Direito da UnB prestar o devido tributo àquele que foi um de seus docentes mais brilhantes, seja como professor das cadeiras de Introdução à Ciência Política e de Direito Constitucional, seja como coordenador do Curso-Tronco de Direito, Economia e Administração, embrião da atual Faculdade de Direito, fazendo dele, portanto, o seu primeiro dirigente.
Jurista, professor e escritor, o autor de Coronelismo, enxada e voto pertence àquela estirpe que sabe exercitar a compreensão plena do ato de interpretar a realidade e proferir juízos acerca de nosso agir no mundo, rejeitando a falsa oposição entre o político e o jurídico, ao entendimento de que, para se realizar, "a Justiça não deve encontrar o empecilho da lei". Victor Nunes Leal, com efeito na UnB e no Supremo, levou, em significativa antecipação, o direito a andar pelas ruas porque, "quando anda pelas ruas, colhe melhor a vida nos seus contrastes e se prolonga pela clarividência da observação reduzida a aresto".
Quando se registra 50 anos do golpe que vitimou também Victor Nunes, o simbolismo do ato aprovado pela Faculdade de Direito da UnB é marca de memória. Presta-se a ressignificar o legado de tão formidável contribuição à história da UnB, de sua Faculdade de Direito, da cidade que as acolhe e da democracia brasileira.
Artigo publicado originalmente no Correio Braziliense em 17/11/2014.
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