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OPINIÃO

Dioclécio Campos Júnior é professor emérito da Universidade de Brasília, doutor em Pediatria e membro titular da Academia Brasileira de Pediatria.

 

 

Dioclécio Campos Júnior

 

Vivemos mais uma campanha eleitoral. Vazia, suja e cansativa. É o retrato fiel da falta de educação que reina na sociedade brasileira. Os políticos que buscam votos de uma população educacionalmente empobrecida atuam, salvo exceções, como protagonistas mal-educados para o exercício da missão potencialmente nobre de um cargo público.

 

As formas e os conteúdos utilizados pela maioria dos partidos e candidatos nada têm de original. Seguem as regras grotescas do mesmo jogo de interesses. Alternam mentiras, agressões ostensivas, destemperos éticos, sorrisos falaciosos, acenos artificiais, abraços automáticos. Poluem espaços públicos e privados com cartazes, faixas, fotos pessoais, jargões e slogans feitos para enganar eleitores. A superficialidade dos discursos e a mediocridade dos temas abordados são praticamente iguais. A única diferença está no estilo propagandístico trabalhado pelas empresas de marketing, em cuja lógica prevalece visível motivação pecuniária.

 

O povo tem sido alvo de artifícios calculadamente forjados para embevecê-lo. Os debates nada esclarecem, apenas mistificam. Ideias e pensamentos inovadores para o país ficam fora do cenário orquestrado pela pseudodemocracia que vivemos. Tudo está minuciosamente projetado para que ocorram apenas minúsculas mudanças de efeito concebidas para que o país continue como dantes no quartel de Abrantes.

 

Se a seriedade e o engajamento com os destinos de nossa sofrida nação fossem inerentes a uma campanha eleitoral, a educação despontaria como tema preponderante. Seria discutido em profundidade, desdobrado nas ilimitadas dimensões biopsicossociais que configuram sua abrangência universal. Iluminaria a maioria dos votos. Sem educação, banaliza-se o resultado de qualquer eleição.

 

A atual corrida eleitoreira, que vislumbra unicamente a ocupação do poder presidencial, parece ignorar o imenso alcance do investimento em políticas educacionais de legitimidade inconteste. Contra fatos não há argumentos. No Brasil, sucedem-se governos que subestimam a prioridade a ser assegurada aos procedimentos educativos capazes de diferenciar a evolução humana, técnica e profissional das novas gerações.

 

Educação de qualidade, igual para todos, é a principal conquista a ser alcançada. É um pleonasmo, porque sem alto padrão qualitativo não há educação, mas estratégico. Requer tempo integral para viabilizar a formação humana bem estruturada com valores éticos, morais, cognitivos e comportamentais de essência altamente civilizatória.

 

Construir escolas é importante, mas não é o essencial. A menos que sejam povoadas somente por educadores qualificados. Manter aluno em tempo integral numa escola ruim não é educá-lo. É impor-lhe a desqualificação cotidiana e intensiva, como se estivesse condenado a cumprir pena em regime de semi-internato, literalmente depositado no armazém de escombros de uma sociedade desigual.

 

Iniquidades, preconceitos, violência de toda natureza, uso e abuso de drogas, perda progressiva da capacidade de pensar de forma crítica, materialismo consumista, carência dos padrões altruístas, vida voltada unicamente para o prazer a qualquer preço, insensibilidade quanto aos primores da cultura artística de sublime inspiração são estigmas que tatuam facilmente pele e alma das vítimas de pais sem educação.

 

As avaliações feitas em sociedades desenvolvidos demonstram o óbvio. Deixam claro que a única variável capaz de melhorar o nível de desempenho dos alunos é a qualidade do professor. Assim, o melhor padrão educacional pressupõe, como requisito primordial, a qualidade do ensino. Sem professor devidamente diferenciado, não pode haver qualidade no ensino, portanto inexistirá educação.

 

O magistério é uma das profissões mais valiosas para a formação da cidadania. Infelizmente, o descaso para com os educadores é grave sintoma da nação brasileira, combalida pela enfermidade do atraso educacional cuja recuperação requer muito mais que as meras medidas paliativas que os governantes adotam para simular tratamento.

 

A criação da carreira nacional do magistério, com salários dignos e atraentes, deveria ser compromisso de todos os candidatos a presidente da República. Respeitar e valorizar os professores, distinguindo-os como personagens de vital importância para a construção de uma democracia verdadeira, são procedimentos indispensáveis aos avanços que a sociedade merece. Sem uma campanha menos eleitoral e mais educacional, o Brasil continuará a deixar tudo do jeito que está para ver como é que fica.

 

Publicado originalmente pelo Correio Braziliense em 20/09/2014.

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