OPINIÃO

 

Gecyclan Rodrigues Santana é doutorando em Direito na Universidade de Salamanca, Espanha. Mestre em Direito pela Universidade Federal do Espírito Santo – UFES, especialista em Direito Público pela Ufes, advogado, professor do Instituto Federal de Brasília – IFB. E-mail: gersant@usal.es

Gecyclan Rodrigues Santana

 

O Brasil é um país extremamente inóspito para as mulheres. Neste país, diariamente, as mulheres têm sofrido violência nas mais diversas formas, sendo o feminicídio a mais deletéria delas. Nesse contexto, insere-se a professora Lourdes Maria Bandeira, uma feminista obstinada, uma guerreira corajosa no combate ao feminicídio e a quaisquer formas de violência contra a mulher. Sua luta foi travada na sala de aula, no Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre a Mulher – Nepem, na Secretaria de Políticas para Mulheres, na CPMI que originou a Lei do Feminicídio e na bibliografia fundamental que construiu ao longo da vida.
Sua obra e suas ações constituem exemplos fundamentais no enfrentamento das relações assimétricas de gênero no Brasil. A coerência e a criticidade de seus argumentos, ancoradas em uma densa formação teórica e acadêmica, transformaram-na em uma das personalidades mais combativas deste país. A dura realidade da violência cotidiana contra as mulheres e os dados estatísticos reveladores da gravidade dessa violência constituíram o combustível da sua enérgica luta na defesa intransigente das mulheres.


Quem teve a honra de conhecê-la e de ouvir suas preciosas reflexões sobre a desigualdade de gênero e a condição precária das mulheres em face do persistente machismo da sociedade brasileira certamente não esquecerá a firmeza com que defendia suas ideias e a veemente eloquência de seu discurso contra o patriarcado. A professora Lourdes Bandeira, junto com várias outras mulheres corajosas, suas colegas de luta, sempre será uma referência no combate ao feminicídio e um orgulho para todos os seus alunos, entre os quais, felizmente, também me incluo.


Quando a conheci, em um seminário internacional promovido, em 2019, pelo Ceam – UnB, percebi estar diante de alguém extremamente cativante, inteligente e competente, alguém que poderia ajudar-me sobremodo no doutorado em direito na Universidad de Salamanca, na Espanha. A admiração por essa mulher tão aguerrida e o tema da minha tese de doutorado, o feminicídio no Brasil, aproximou-nos, e ela, generosamente, passou a orientar-me, com a segurança e a criticidade que lhe eram peculiares. Depois disso, vieram as aulas e o convite para ser coorientadora da minha tese na USAL, prontamente aceito por ela, o que me deixou extremamente honrado e feliz por ter alguém com tanta sensibilidade e competência a orientar-me em tema tão complexo e necessário.


A perda da professora Lourdes Bandeira deixa um enorme vazio em todos os que, de alguma forma, conviveram com ela, mas também deixa a certeza de que é preciso continuar o seu legado de luta e procurar transformar o Brasil em um lugar onde as mulheres sejam respeitadas em todos os seus direitos e tratadas com toda a deferência e dignidade que merecem. Essa tarefa é de todos nós, homens e mulheres comprometidos com um ideal de humanidade em que uma vida digna e cidadã não seja um pleito, mas uma realidade que haverá de concretizar-se neste país.

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