OPINIÃO

Paulo José Cunha é professor da UnB, escritor e jornalista.

Paulo José Cunha

 

Sim, existe bom gosto e mau gosto em música. Não há como dizer que nesta área questão de gosto não se discute. Discute, sim. Porque não se trata apenas de opção estética. O bom gosto resulta de construção cuidadosa e bem conduzida, para a elaboração de produções sofisticadas e de elevado valor para a cultura em que estão inseridas. Já as produções de mau gosto resultam, na maioria dos casos, da opção mercadológica dos divulgadores culturais, mais interessados no faturamento rápido do que no esforço em prol da elevação do gosto musical de seus ouvintes. Ou, o que é pior, estão a serviço de algum projeto político-ideológico.  

 

O filósofo francês Pierre Bordieu (1930-2002), que se dedicou à sociologia e à filosofia, bem como às interseções entre esses dois campos, estudou a fundo a questão da dominação cultural, comum nos sistemas coloniais e em sociedades muito desiguais (como a nossa). Uma de suas conclusões foi a de que a desculturação dos povos traz consequências à cultura, a literatura à arte e... à política.  

 

Segundo o crítico Jamari França (ex-JB, ex-Globo on line), “se a pessoa consome uma música com alto grau de informação em termos de letra e música, digamos a MPB dos anos 1970, ela terá um grau de exigência maior. Se for uma pessoa simples, exposta a um tipo de música de menor conteúdo, sua exigência será menor”. 

 

E será menor inclusive em relação à literatura e à política. Sim, quando a arte e a cultura se abastardam, a exigência em relação à qualidade da política igualmente se reduz. Haja vista o que vem ocorrendo no Brasil. Um povo começa a ser politicamente dominado quando lhe roubam sua cultura e a substituem por outra ou impõem ao consumo simulacros de expressão cultural, simplistas e/ou retardadas. No Brasil de Bolsonaro e sua política de arrasa-quarteirão no setor da cultura, é o que se vem assistindo – e ouvindo - em relação às artes em geral, mas com ênfase na música popular que passou a predominar em praticamente todos os lugares e espaços de execução. Muitas pessoas estão deixando de frequentar restaurantes de cardápios excelentes por não suportarem a péssima qualidade da música do local. Sim, é verdade que sempre houve uma música de baixa extração rolando por aí. Mas era uma opção, e não produto de uma imposição cultural como ocorre hoje. Os donos dos restaurantes, quando confrontados com as reclamações, alegam que executam o que a clientela... gosta. Ou está gostando agora, porque, antes, gostava de produções mais requintadas. A MPB que hoje domina sem exceção tanto os meios de comunicação como também os bares, restaurantes, supermercados, lojas, oficinas etc., ganhou formidável impulso depois da chegada do atual desgoverno. Isso porque a falta de compromisso com o bom gosto incentiva a disseminação desse tipo de música. Na maioria, de melodias repetitivas e descompromissadas com a invenção e a criatividade, embalando letras de apelo direto e ostensivo a temas ligados ao sexo, à violência, e de incentivo ao consumo de bebidas.

 

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