OPINIÃO

Bruno Arthur Hochheim é doutorando em Direito pela UnB. Pesquisador de História do Direito e de Direito Público, é membro do grupo de pesquisa Percursos, Narrativas e Fragmentos: História do Direito e do Constitucionalismo, sediado na UnB. Conduz a iniciativa de divulgação científica “Tramas de História do Direito”, que procura difundir o estudo histórico da área jurídica.

Bruno Arthur Hochheim

 

O Código Eleitoral de 1932 e os seus 90 anos: entre as Constituições Federais de 1891 e de 1934, origem de importante legado para a de 1988

 

Em 24 de fevereiro deste ano, o Código Eleitoral de 1932 está fazendo 90 anos, uma dessas efemérides que nos convidam a refletir sobre o ocorrido, as suas origens, os seus legados. Para além disso, contudo, deve-se considerar outro aniversário: o de 131 anos da Constituição Federal de 1891 – também em 24 de fevereiro.

 

Embora essa sobreposição de datas não costume ser destacada pela literatura, ela não pode ser ignorada. Aniversários se prestam também a ser politicamente capturados para o avanço de determinada agenda, por se referirem ao passado e poderem gerar mobilização com base nele.

 

Em termos de contexto histórico, o Código Eleitoral foi criado em meio ao Governo Provisório de 1930 e suas instabilidades. Getúlio Vargas se equilibrava em meio a pressões opostas. Algumas forças pleiteavam a manutenção do governo de plenos poderes, outras demandavam a reconstitucionalização do país – muitas destas, aliás, posteriormente deflagrariam ou adeririam à Revolução de 1932, outro acontecimento político que neste ano terá importante efeméride. A criação do Código Eleitoral era, assim, um aceno à reconstitucionalização.

 

Ao tratar dos acontecimentos havidos no Brasil a partir de 1930, tende-se a destacar as rupturas e as novidades, mas em verdade existem mais continuidades do que se costuma ressaltar. A experiência do Governo Provisório de 1930, assim, é marcada por suas ambiguidades. Se o movimento, de modo geral, condenava a chamada “República Velha” e os seus vícios, adotando retórica de refundação nacional, por outro lado buscava no resgate das promessas republicanas a sua legitimação. Não por acaso, apesar de derrubada a Primeira República, as novas autoridades mantiveram a numeração sequencial dos decretos – a qual traçava as suas origens no Decreto nº 1, de 15 de novembro de 1889, por meio do qual o Governo Provisório de então, com Deodoro da Fonseca à testa, proclamava a república e a federação. Essa numeração sequencial, aliás, atravessaria as repúblicas brasileiras, sendo mantida até 1991, quando, após ter atingido o número 100 mil, em 11 de janeiro, foi reiniciada. O Código Eleitoral de 1932, sendo formalmente o Decreto nº 21.076, de 24 de fevereiro de 1932, era publicado também como aperfeiçoamento da república, cuja plena vigência estaria sendo retomada com a paulatina reconstitucionalização nacional; a sua edição no próprio aniversário da Constituição de 1891, recém-derrubada pela Revolução de 30, reforçava o simbolismo da medida.

 

O Código Eleitoral de 1932 introduziu uma série de alterações no sufrágio nacional, ainda que com o objetivo de concretizar os ideais republicanos. O Código previu a competência privativa da União a respeito das eleições, o sigilo do voto, o sufrágio feminino, a representação de minorias por meio do sistema proporcional, a Justiça Eleitoral.

 

Pode-se dizer, um tanto provocativamente, que a Constituição Federal de 1934 foi “compatível” com o Código Eleitoral de 1932, reproduzindo as suas linhas mestras. Esse desenho institucional é familiar aos brasileiros, dado que foi, tirando-se notáveis exceções, reproduzido nos regimes seguintes, sendo adotado pela Constituição Federal de 1988, a qual até hoje o prescreve.

 

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