OPINIÃO

 

Gisele Pimenta de Oliveira é doutora e mestra em Comunicação pela Universidade de Brasília (UnB). Especialista em Assessoria de Comunicação e Marketing e formada em Comunicação Social, habilitação em Jornalismo, pela Universidade Federal de Goiás (UFG). Pesquisadora do Observatório da Radiodifusão Pública na América Latina. Servidora pública, jornalista na UnB. 

Gisele Pimenta de Oliveira

 

“Como você pretende conciliar o doutorado com o trabalho e, agora, duas crianças?”, indagou-me um dos professores da banca de seleção para ingresso na pós-graduação. À época, eu estava grávida do meu segundo filho, ainda no primeiro trimestre de gestação. A pergunta pode parecer despretensiosa para alguns, mas é justamente a “sutileza” simbólica da questão que ainda me assola. Não importa o quanto eu fale do fato, não consigo digerir. Ter filhos e emprego entra nos critérios formais de avaliação curricular? Um homem-pai ouviria esse tipo de pergunta?  Se eu tivesse respondido: “não faço a menor ideia”, seria aprovada?

 

Grávida e com uma criança de dois anos, fui selecionada. Meu filho nasceu em 28 de abril de 2017, cerca de um mês após o início das aulas. Não tranquei o semestre por licença-maternidade na pós-graduação, garantia oficializada recentemente pela UnB. Parar? Jamais. Eu consigo. Sou forte, batalhadora, guerreira. Coisas que a meritocracia nos ensina. Então, me sentindo absolutamente plena e realizada, lá estava eu assistindo à aula de metodologia uma semana após parir e com a cria literalmente amarrada em mim. Até que um anjo, a professora mais sensível e divina que já cruzou meu caminho, sussurra: Gisele, o que você está fazendo aqui? Vai para casa cuidar do seu bebê, e de você. Cirúrgica, a fala dela me abriu os olhos. Como poucas vezes na vida, senti que eu podia tirar minha fantasia de super-heroína. Não dar conta. Pedir ajuda. Chorar. Recuar. Desistir. Mudar os rumos. Enfim, ser humana.

 

O desfecho dessa longa jornada de muitas dores (e delícias) chamada doutorado não cabe nesse artigo. Quero abordar que, infelizmente, eu só passei a enxergar mães e crianças depois da minha maternidade. Pasmem (contém ironia), elas existem. E, queiram ou não, elas estão na universidade. Na graduação, na pós, nos espaços acadêmicos, nos setores administrativos. Alunas, técnicas, professoras, colaboradoras e terceirizadas são mães, mas muitas vezes precisam esconder isso. Esbocei algumas linhas sobre “maternidade invisível” (p. 49) no livro organizado pela turma de doutorandos em Comunicação da UnB e no relato de duas estudantes e uma docente, publicados pela revista Darcy (p. 30). Porém, a visibilidade precisa ser institucionalizada.

 

Quem são essas mães? Quais suas demandas específicas? Quantos filhos elas têm? Onde eles ficam enquanto elas trabalham e/ou estudam? Quem cuida deles (e delas)? Como elas estão? Reformulando a frase que inicia esse texto, essas mulheres precisam de garantias e proteção para conciliar trabalho, maternidade e qualificação educacional. Antes que algum “paizinho” reivindique seus direitos porque também tem filhos e passou noites em claro para cuidar deles, antecipo: a questão é estrutural. São as mulheres que assumem jornada tripla. Que perdem ou têm seus empregos ameaçados. Que sempre colocam o nome na certidão de nascimento dos filhos. Que carregam quase a integralidade da carga mental e física de organização das rotinas e cuidados. Que não podem fugir de suas “responsabilidades” individuais e sociais.

 

Clique aqui para ler o texto na íntegra.

 

ATENÇÃO – O conteúdo dos artigos é de responsabilidade do autor, expressa sua opinião sobre assuntos atuais e não representa a visão da Universidade de Brasília. As informações, as fotos e os textos podem ser usados e reproduzidos, integral ou parcialmente, desde que a fonte seja devidamente citada e que não haja alteração de sentido em seu conteúdo.