OPINIÃO

Suzi Huff Theodoro é professora do PPG em Meio Ambiente e Desenvolvimento Rural, da UnB. Geóloga. Doutora em Desenvolvimento Sustentável.

Suzi Huff Theodoro

 

A globalização encurtou distâncias e tem permitido incontáveis trocas de mercadorias e conhecimentos. No entanto, a pandemia do novo coronavírus e a guerra deflagrada no leste Europeu mostraram que essa conectividade tem pontos de fragilidade com força para desestabilizar economias e arranjos geopolíticos consolidados.

 

O caso do comércio de commodities é emblemático, em especial para países como o Brasil, que é um grande exportador de produtos semiprocessados (ferro, soja, milho, café etc.) e importador de insumos usados para viabilizar sua pujante cadeia agroindustrial. Os fertilizantes à base de nitrogênio, fósforo e potássio (NPK) estão entre os principais produtos da pauta de importação brasileira. A retomada econômica mundial, com o controle da pandemia, já vinha sinalizando que haveria escassez desses produtos no mercado internacional, mas a guerra agravou a situação, já que dois dos maiores exportadores de potássio (Rússia e Bielorússia) estão envolvidos no conflito.

 

O governo brasileiro apressou-se em propor alternativas que são irrealizáveis no curto prazo e inapropriadas por pretenderem liberar atividades de exploração mineral em Terras Indígenas. O Plano Nacional de Fertilizantes (PNF), lançado pelo Governo Federal, prevê que somente em 2050 o Brasil poderá ter alguma independência de insumos agrícolas, mantendo-o refém do mercado internacional pelos próximos anos. O destaque dado pelo PNF às cadeias emergentes foi tímido e pouco eficaz ao abordar as possibilidades representadas pelo uso dos bioinsumos e dos remineralizadores de solo. E é justamente nessas cadeias, que o Brasil teria as maiores condições de avançar e ter autonomia e autogestão a partir de fontes disponíveis regionalmente. Ambos já possuem um arcabouço jurídico e tecnológico consistente que permite ampliar e fortalecer a oferta de fertilizantes em todas as regiões do País desde o curto até o longo prazo.

 

No caso dos remineralizadores (eventualmente denominados agrominerais), a tecnologia da rochagem estabeleceu seus pressupostos e a Lei nº 12.890/2013 e a Instrução Normativa nº 05/2016 (MAPA) definiram suas condicionantes de uso e comercialização. A oferta desses insumos, que deriva de determinados tipos de rochas moídas, tem a finalidade de ampliar a oferta de nutrientes para os solos e plantas (para além do N, P e K) e está duplicado a cada ano, passando de 920 mil t/a (2019) para 1.500 milhão t/a (2021) e previsão de 3.000 milhões t/a em 2022 (Embrapa (2021); SGM/MME). Estudos recentes indicam que em 2030 a oferta chegará a 75 milhões de t. É provável que os incentivos previstos no PNF ampliem a oferta dos remineralizadores, uma vez que a sua demanda ganhou força em função da escassez das fontes convencionais e, principalmente, porque os resultados nas lavouras superam as expectativas dos agricultores (familiares e/ou empresariais). Hoje 29 empresas, distribuídas em nove estados, já possuem o registro para comercializar os remineralizadores. Mas o potencial é imenso, já que o Brasil é um pais de grande geodiversidade.

 

Importante destacar que as pesquisas conduzidas na UnB desempenharam um papel relevante na trajetória de construção conceitual e regulatória deste tema. Há exatos 50 anos, o prof. Emérito Othon Leonardos publicou o 1º artigo científico que estabeleceu o termo rochagem. Quase trinta anos depois, foi defendida a primeira tese de doutorado sobre o tema na Universidade com o título “Fertilização da terra pela terra”. Desde então várias parcerias interinstitucionais foram estabelecidas e cerca de 10 teses e dissertações foram apresentadas, além de vários artigos publicados em jornais e eventos nacionais e internacionais. Essa trajetória evidencia a importância da pesquisa e o papel de protagonismo da UnB na construção do desenvolvimento de oportunidades para o Brasil.

 

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