OPINIÃO

Arte: Patrícia Meschick

 

Giselle Rodrigues de Brito é coreógrafa, bailarina, atriz, doutora em Arte e professora de Artes Cênicas da UnB. Foi bailarina do Endança (grupo independente de dança contemporânea de Brasília), criou e dirigiu o Basirah - Cia de dança de Brasília, responsável pela criação de mais de 20 espetáculos, dentre os quais cinco deles em parceria com Hugo Rodas. Participou como coreógrafa convidada do American Dance Festival (1993). Estudou coreografia na London Contemporary Dance School at The Place. Contemplada pelo Rumos Itaú Cultural 2014/15 com o projeto de pesquisa AISTHESIS. Em 2016 ganhou prêmio SESC do teatro candango nas categorias melhor atriz, melhor direção, melhor espetáculo, figurino e cenografia pelo espetáculo Fio a Fio. Atualmente está como Chefe do Dept. de Artes Cênicas (UnB), integra o grupo Teatro do Instante, atua como curadora do Festival Internacional de Dança  de Brasília – MID e coordena o N.E.M – Núcleo Experimental em Movimento (CEN/UnB). 

Giselle Rodrigues

 

Este texto é um breve depoimento de minhas percepções como artista, amiga e parceira de criações de Hugo Rodas. Reflete minha admiração por essa pessoa maravilhosa, esse furacão em eterno movimento, que atravessou minha vida.


Conheci Hugo Rodas aos 14 anos, e sua figura me chamou atenção, pela beleza dos longos cabelos, mas principalmente pela pulsão de vida que ele emanava. O que mais me impressionou na sua trajetória, foi o rigor com que conduzia seus trabalhos e processos criativos, o domínio sobre cada parte, cada pessoa, cada cena, que compunha suas criações, além de, claro, sua capacidade de trazer a força do coletivo, dos belos coros de dança e música e de como seus espetáculos, e processos de criação, eram um acontecimento, uma experiência para quem participava e para quem assistia, sempre na presença de suas risadas e críticas debochadas.


Em processos seus que pude presenciar, Hugo expunha as fragilidades de seus elencos e trabalhava sobre essa vibração, muitas vezes tensa e explosiva, por vezes não muito confortáveis aos atores, atrizes e estudantes, pois Hugo era audacioso e provocativo, não propunha a coisa fácil. O desafio de romper com qualquer tipo de normalidade e conformidade, seja de si mesmo ou das noções do politicamente correto, para quem participava de suas montagens, tinha que estar presente em cada momento da exploração de suas propostas. Não havia espaço para dúvida. Rodas queria de seus atores, atrizes e estudantes a entrega incondicional ao ofício teatral.

Nessa tensão era possível ver o amor de Hugo por aquele fazer. Um amor “brutal”, como ele mesmo dizia. “É brutal!” Com o tempo as fragilidades eram superadas e transformadas na força e pulsão do trabalho coletivo que era levado aos palcos.


Como diretor e multiartista que foi, ensinou muito, e nunca desistiu de um estudante, um ator ou atriz, mesmo que, aparentemente, a pessoa não demonstrasse tanto talento para o ofício. Lá estava ele, a cutucar para ver o que dali poderia sair ou construir. Não deixava escapulir uma possibilidade, um potencial expressivo vislumbrado por ele. O rigor, reinava forte em suas conduções, não havia zonas de conforto, nem concessões para jogos fáceis.


Muito se aprendeu, muito se descobriu, muito se inventou, muito se construiu nesse processo. Repetir, insistir, persistir, resistir, exaurir o corpo, exaurir o choro, exaurir o riso, suar, gritar, dançar, sentir o coletivo, ser pura sensação dionisíaca. Esse era o Hugo! Assim era estar com ele!


Hugo era de um amor tão grande pelo fazer cênico, e uma pungência, intensidade e alegria com a vida, indescritíveis! Anjo e demônio ao mesmo tempo! Foi tão pulsante em vida, quanto na morte. Dançou ao som de jazz, até seu último respiro nessa vida, e partiu na presença de centenas de pessoas cantando, dançando e tocando tambores, em sua passagem para outras vidas. Uma multidão em comunhão, celebrando e agradecendo, um mestre do teatro, um mestre da cena, um mestre da vida.


Obrigada Huguito! Te amo sempre!

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