OPINIÃO

Eduardo Bessa Pereira da Silva é professor da Faculdade UnB de Planaltina. Redige o blog Ciência à Bessa na rede Scienceblogs Brasil e é membro do comitê educacional da Animal Behavior Society.

Eduardo Bessa

 

O tópico mais quente do Google esse início de ano foi a nova ferramenta de inteligência artificial da OpenAI, o ChatGPT. As buscas pelo assunto ocuparam o 1º e o 2º lugar nos termos mais consultados, isso porque a plataforma considera a busca por chat GPT (com aumento de 3600%) diferente da busca por ChatGPT (com aumento de 2800%). O ChatGPT é uma ferramenta aberta de inteligência artificial que responde a perguntas semelhante a uma conversa. Ele foi treinado a buscar respostas com coerência gramatical e coloquialidade a partir de uma base de dados que não foi revelada e é o maior mistério cercando a ferramenta. Seu sucesso se deve a ter sido colocada à disposição de qualquer usuário mediante um cadastro simples.  

Devido à acessibilidade, ao bom funcionamento e à qualidade do material gerado, a ferramenta chamou atenção e mexeu com a imaginação. Acompanhando conversas em vários grupos de professores, uma das preocupações que vi no final do semestre passado era sobre quem tinha escrito uma série de trabalhos que foram apresentados como avaliação final das disciplinas. De fato, o ChatGPT se tornou uma preocupação para muita gente envolvida em educação superior.

E a preocupação tem motivos. A ferramenta tem potencial para abalar as bases do que entendemos como interação com as máquinas. Melhorias têm sido implementadas com agilidade e muitas empresas de tecnologia já estão correndo atrás para oferecer alternativas ao ChatGPT.  

Na educação, é claro que também precisaremos nos atualizar. Da mesma forma que tivemos que nos precaver para não deixar nosso ensaio de fim de semestre ser feito pela Wikipedia, agora teremos que nos preocupar com o ChatGPT. Mas esta não é a preocupação mais importante. Num mundo se afogando em informação, o ChatGPT apareceu como uma boia salva-vidas incrivelmente útil, relegá-lo à posição de ferramenta para trapacear é no mínimo questionável e a perda de uma oportunidade interessante.

A primeira atitude fundamental é entrar e experimentar um pouco a ferramenta. Uma pesquisa realizada pela Educause demonstrou que pessoas mais familiarizadas com o ChatGPT, se preocupavam mais com os problemas que ele causaria. Também é visível que a qualidade das respostas que ele gera em português é muito inferior àquela gerada em inglês, possivelmente por causa da base de dados que foi usada para seu treinamento. Em seguida, precisamos falar sobre o assunto já no começo do semestre que se inicia. Da mesma forma que nossos planos de aula e aulas inaugurais das disciplinas devem deixar claro aos alunos o que é plágio, como evitá-lo e por que ele é inaceitável, devemos incluir o ChatGPT nesse contexto da produção de conteúdo pelos alunos.

Outro fator importante é repensar nossas avaliações entre a retenção de determinadas informações e a produção de algo personalizado, criativo e com impactos sociais, que a ferramenta ainda não consegue fazer tão bem. O ChatGPT facilmente escreve um texto dissertativo explicando a situação geopolítica após os atentados de 11 de setembro. No entanto, se você propuser um debate público do assunto com alunos distribuídos em grupos que devem argumentar numa ou em outra direção e convidar um grupo de vestibulandos de uma escola pública da vizinhança para ajudar a avaliar a argumentação, as chances do ChatGPT atrapalhar sua avaliação são bem menores.

Dá mais trabalho, mas é assim que formaremos cidadãos para um mundo que precisa de pessoas que saibam ir além do que a inteligência artificial já faz.

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