Eduardo Oliveira Soares
No mês seguinte à inauguração da Universidade de Brasília, em 1962, foi criado o Centro de Planejamento, Ceplan, responsável pelo planejamento do ordenamento físico da UnB. Nesse mesmo ano seu primeiro Diretor, Oscar Niemeyer, projetou os galpões de Serviços Gerais de um pavimento. O detalhamento do projeto coube a João Filgueiras Lima, o Lelé, e o paisagismo original, a Alda Rabello. Em 1963, foi construído o conjunto de edifícios sendo um deles – o SG 10 – destinado a abrigar o Ceplan.
Portanto, 2023 marca os 60 anos de uma construção ímpar no campus, caracterizada pela simplicidade e refinamento. Já houve mudanças de atribuições e de nomenclatura da “unidade institucional” Ceplan, mas, ao longo das décadas, o icônico edifício conhecido como SG 10 manteve sua integridade e autenticidade. Mais ainda, foi se tornando uma referência de espaço dedicado a questões relacionadas à arquitetura e ao urbanismo. Aliás, a qualidade arquitetônica do edifício o levou a ser indicado ao tombamento por parte do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). A avaliação ainda está em curso.
São 60 anos de um prédio que sintetiza a integração entre a edificação e os espaços abertos dos jardins, algo característico do campus Darcy. O SG 10 abriga painéis artísticos do próprio Niemeyer, mobiliário original, maquetes que já se tornaram “históricas”, várias mapotecas com projetos relevantes. O conjunto desses acervos – o próprio edifício é parte do acervo arquitetônico da UnB – é algo a ser preservado e divulgado.
Pairando em paralelo ao que se vê ao adentrar o edifício do Centro de Planejamento Oscar Niemeyer há toda uma memória institucional e afetiva de quem utilizou ou conhece a trajetória do sexagenário SG 10. Memórias pessoais se imiscuem às relatadas por outras pessoas quando o assunto é esse prédio que já abrigou muito da vida institucional e acadêmica da UnB.
Dentre histórias, memórias e lendas sobre o SG 10: no auditório, Lucio Costa foi inquirido insistentemente por não aceitar críticas ao projeto de Brasília. Nesse mesmo espaço, Milton Santos foi admoestado por, ao se empolgar em uma palestra, escrever com giz no painel de fundo preto pintado por Niemeyer. A mangueira existente na frente do prédio nasceu do caroço de uma manga chupada pelo próprio Oscar Niemeyer. Aliás, a queda de mangas no telhado parece um bombardeio. Desde sempre, é lar de passarinhos, saruês, morcegos e muriçocas. Já ficou períodos praticamente vazio, quando minguaram os investimentos na estrutura física da universidade. Já sediou debates, propostas, sonhos e angústias dos profissionais técnicos administrativos que o ocupam. Os arquitetos vão à loucura quando algum colega se distrai – principalmente durante as reuniões – e encosta no painel de fundo branco pintado por Niemeyer. É tema de fotografias desde Marcel Gautherot até Joana França. Abrigou defesas de pós-graduação que foram consagradoras ou traumáticas. Foi ocupado por estudantes que exigiam melhorias nas condições dos espaços de estudo (com direito a palavras de ordem e cartazes fixados nas paredes). O emérito Prof. Coutinho sempre relata uma nova história quando o visita. O prof. Matheus Gorovitz ainda participa de reuniões para, finalmente, definir o projeto da Aula Magna idealizada na década de 1960. Faz isso tendo o painel com a proposta de Niemeyer para o mesmo edifício ao fundo. A trilha sonora do SG 10 são os ensaios dos alunos de música – com diversos instrumentos – que têm aula nas proximidades. Berimbau da capoeira, falas e gritos do pessoal do teatro também atingem os seus espaços.
É um edifício precursor no uso da técnica do concreto pré-moldado no país. Meca de arquitetos, urbanistas e estudantes. Até hoje aparecem pessoas visitando o prédio e relatando que tiveram aula nele em mil novecentos e antigamente. Cada relato informa e inspira a “nova geração” a cuidar dos seus espaços. Enfim, o edifício é um local indissociável da arquitetura, do urbanismo e do planejamento físico da UnB.
Porém, na “data redonda” de 60 anos de construção, a informação vinda da Administração Superior da universidade é que o SG 10 não mais vai abrigar o Ceplan (a caixinha organizacional), que será alocado em outro edifício do campus. Espera-se que o futuro uso do SG 10 esteja à altura da sua relevância e da sua trajetória. E que o edifício e seus acervos tenham a sua integridade e coesão garantidas. Aos 60, é hora de restaurar o SG 10 e de divulgar mais ainda a sua importância.
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