OPINIÃO

Thaïs de Mendonça Jorge é professora do Departamento de Jornalismo (FAC) e foi Secretária de Comunicação da Universidade de Brasília (UnB).

Thaïs de Mendonça Jorge 

 

No início de novembro, 25 alunas de um colégio no Rio de Janeiro foram vítimas de nudes falsificados. As fotomontagens delas foram difundidas nas redes sociais e o alcance só não foi maior porque um aluno - apenas um - denunciou a manipulação. Isto pode ser classificado como fake news? 

 

A expressão “notícias falsas” é um oxímoro, ou seja, uma palavra contradiz a outra. Se é notícia, não pode ser falsa. Se é falsa, não é notícia. “Notícias” significam informações verificáveis de interesse público, e as informações que não atendem a esses padrões não merecem o rótulo de notícias. 

 

A "brincadeira" ou a manipulação da imagem - no colégio carioca, assim como em outras situações recentes envolvendo pessoas famosas - constitui um ato de fraude: uma categoria particular de informação falsa em formas cada vez mais diversas de desinformação, inclusive em formatos de entretenimento como memes visuais. 

 

O termo “informação incorreta” se refere a informações enganosas criadas ou disseminadas sem intenção manipuladora ou maliciosa. Pode ser a minha tia replicando um vídeo do avanço da maré na praia de Copacabana incrementado com imagens do tsunami na Ásia. Tanto a desinformação proposital como a informação incorreta são problemas para a sociedade, porém a desinformação é particularmente perigosa pois é elaborada por pessoas, valendo-se de tecnologia automatizada capaz de chegar aos rincões mais distantes deste planeta. 

 

Trata-se de um terreno perigoso e pantanoso porque as falsas notícias divulgadas costumam ser gratuitas: usuários que não podem pagar por jornalismo de qualidade ou que não têm acesso a meios de comunicação independentes são especialmente vulneráveis à desinformação e informação incorreta. 

 

Dentro desse ecossistema que evolui com rapidez sem que tenhamos controle, o papel dos jornalistas e dos meios de comunicação é relevante. Estamos em meio a uma guerra. Tão sangrenta quanto a da Ucrânia ou a da Faixa de Gaza. Esta guerra também provoca mortes: só no Brasil foram mais de 700 mil as vítimas da pandemia de Covid-19, parte delas devido à desinformação, mentira e ignorância. 

 

A consequência de tudo o que está acontecendo vai além: um descrédito nas instituições e na própria existência fora do digital. Foi talvez por isso, pela naturalização do que é fake - pelo uso do deep fake, da inteligência artificial incorporada ao cotidiano - que os meninos do colégio católico do Rio de Janeiro acharam "normal" a disseminação das imagens de suas colegas. 

 

A desinformação e a informação incorreta são diferentes do jornalismo de qualidade, que cumpre com a ética e normas profissionais. Ao mesmo tempo, esse fenômeno também é diferentes dos casos de jornalismo ruim. O mau jornalismo inclui, por exemplo, erros contínuos sem correção, derivados de pesquisa e verificação malfeitas ou displicentes. 

 

Aqui se inclui a sensacionalização, que exagera para causar impacto, o jornalismo de superlativos, o apelo às chamadas "emoções baratas", item que chegou à internet como gênero: o clickbait ou caça-clique. 

 

Há a necessidade de um jornalismo sério e ético como antídoto à desordem da informação e o efeito indireto da degradação de notícias, o que atinge a credibilidade dos jornalistas e das notícias. Com as campanhas de políticos e autoridades contra os conteúdos da mídia, a consequência nefasta é que o público venha a descrer de todo tipo de conteúdo – incluindo o jornalismo - ou que acredite apenas em informações veiculadas pelas redes sociais e que se assemelhe aos seus sentimentos. 

 

O jornalismo precisa se antecipar na denúncia da desinformação. Assim como a academia, precisamos ser proativos para revelar tipos de desinformação, máquinas de desinformação e os meandros delas. Precisamos estudá-las, conhecê-las para poder dominá-las. Isto, somado à educação formal qualificada e à alfabetização midiática, ao capacitar o público a distinguir o que é notícia e desinformação, pode prevenir males maiores.

 

 

 

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