OPINIÃO

 

Mônica Castagna Molina é professora associada dos programas de Pós-Graduação em Educação e de Pós-Graduação em Meio Ambiente e Desenvolvimento Rural. É doutora em desenvolvimento sustentável pela UnB.

 

 

Juliana Rochet Wirth Chaibub Paulino é professora na UnB no Curso de Licenciatura em Educação do Campo (LEdoC) e no Mestrado Profissional em Sustentabilidade junto a Povos e Territórios Tradicionais (MESPT).

 

 

Janaína Deane de Abreu Sá Diniz é professora na Universidade de Brasília, campus Planaltina, nos Programas de Pós-Graduação em Meio Ambiente e Desenvolvimento Rural (PPG-Mader) e em Sustentabilidade junto a Povos e Territórios Tradicionais (PPG-PCTs).

Mônica Castagna Molina, Juliana Rochet e Janaína Deane de Abreu Sá Diniz

 

Os movimentos sociais do campo escolheram 17 de abril como um marco para a memória e a luta camponesas. A data remete ao massacre de Eldorado dos Carajás, ocorrido em 17 de abril de 1996 no município de Eldorado dos Carajás (PA). Há 28 anos, vinte e um trabalhadores rurais foram mortos enquanto lutavam por Reforma Agrária.

 

Ao celebrarmos o 17 de abril reforçamos o compromisso social e histórico de democratizar o acesso a terra, de fortalecer a agenda de discussão sobre sistemas alimentares diversos, justos e sustentáveis baseados na Soberania Alimentar e nas políticas agroecológicas que garantam a biodiversidade e a proteção dos recursos genéticos.

 

Ao rememorarmos Dia Internacional de Luta pela Terra afirmamos a indissociabilidade deste debate também com a garantia da Segurança Alimentar e Nutricional da população, entendida, no contexto brasileiro, como a realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis.

 

Dados do Censo Agropecuário (2017) apontam que o que alimenta população brasileira é a agricultura familiar. Mais de 75% da produção agrícola que abastece a mesa dos brasileiros vem de pequenas propriedades. Ainda de acordo com o Censo, a agricultura familiar é a base da economia de 90% dos municípios brasileiros com até 20 mil habitantes.

 

A agricultura familiar e camponesa está presente em todos os cinco biomas do País e conta com uma grande diversidade de organização. A forma de gestão das propriedades familiares, a utilização de mão de obra própria, a conservação e multiplicação de materiais genéticos locais, além da participação em circuitos curtos de comercialização, as coloca em consonância com os princípios agroecológicos. Nesse sentido, a Luta pela Terra, mais do que sobrevivência, pauta a qualificação da existência: a defesa da vida em sua relação orgânica com a produção de alimentos para o campo e para a cidade, o combate à fome e à má nutrição, a geração de renda, o direito à educação, a promoção da saúde em sentido integral, a promoção da justiça social e ambiental.

 

Nos últimos anos, a UnB vem oferecendo contribuições estratégicas para as populações do campo, das águas e das florestas na perspectiva do ensino, da pesquisa e da extensão universitárias. Um bom exemplo dessa colaboração está no desenvolvimento do Projeto “Investigando as potencialidades da práxis dos egressos da Licenciatura em Educação do Campo para promoção do desenvolvimento humano e social nas Escolas do Território Kalunga (GO) através da formação em agroecologia e manejo sustentável do Cerrado", aprovado na Chamada Pró-Humanidades CNPq/MCTIC/FNDCT no 040/2022.

O Território Quilombola Kalunga abrange os municípios de Cavalcante, Teresina de Goiás e Monte Alegre de Goiás, na região da Chapada dos Veadeiros, nordeste do estado de Goiás (GO), além dos municípios de Arraias e Paranã, no estado do Tocantins (TO). Na região vivem cerca de 1.500 famílias, distribuídas em 39 comunidades em mais de 262 mil hectares, que enfrentam diversos conflitos pela regularização e titularidade das terras. Em 1991, o território foi reconhecido pelo Estado de Goiás como Sítio Histórico e Patrimônio Cultural e, em 1992, pela Fundação Cultural Palmares do Ministério da Cultura (FCP/Minc).

 

Iniciado no ano de 2023, o projeto de pesquisa estruturou uma profícua rede de colaboração formada pela Universidade de Brasília, pela Universidade Federal de Tocantins, pelo Instituto Federal de Brasília, pela Prefeitura e secretarias municipais de Educação e de Agricultura de Cavalcante-GO e pela Associação Quilombola Kalunga. Conta com uma equipe multidisciplinar formada por membros da comunidade, gestores públicos locais, docentes, estudantes ativos e egressos do Curso de Licenciatura em Educação do Campo (LEdoC/UnB), além de pesquisadores e educadores associados.

 

O objetivo do estudo, que tem a participação como princípio metodológico, é realizar um diagnóstico compartilhado sobre a sociobiodiversidade do Cerrado existente nas Comunidades Quilombolas Kalunga do Vão de Almas e do Vão do Moleque, ambas situadas no município de Cavalcante-GO, com vistas a promover a inserção deste conteúdo no currículo escolar das Escolas de Ensino Médio existentes em tais comunidades . Tal processo almeja formar estudantes, educadores e membros das duas Comunidades Kalunga para o manejo sustentável da produção, associada à valorização de tecnologias sociais de aproveitamento do Cerrado, e inserção da mesma na alimentação escolar por meio do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA).

 

O diagnóstico nas comunidades quilombolas foi feito a partir de dois pontos geográficos, escolhidos por sua representatividade e condições de acesso às famílias: a Escola Maiadinha, localizada na comunidade do Vão do Moleque, e a Escola Santo Antônio, localizada na comunidade Vão de Almas. Desde o início da pesquisa, foram realizadas cerca de 30 visitas às casas, quintais produtivos e roçados, além de trilhas comentadas, rodas de conversa, entrevistas semiestruturadas e cartografia social

 

Em 2021, o território Kalunga recebeu da Organização das Nações Unidas o título de primeiro Território e Área Conservada por Comunidades Indígenas e Locais (Ticca) do Brasil. Esta titulação é concedida a regiões que mantêm a conservação da natureza e asseguram o bem-estar de seu povo.

 

Que cada vez mais as universidades públicas, institutos e centros de pesquisa, por meio de projetos de ensino, pesquisa e extensão participativos e socialmente referenciados, possam ser parceiras no reconhecimento dos territórios tradicionais e camponeses, bem como na visibilização de suas demandas e necessidades relacionadas à defesa da vida.

 

Clique aqui para ler o artigo na íntegra.

ATENÇÃO – O conteúdo dos artigos é de responsabilidade do autor, expressa sua opinião sobre assuntos atuais e não representa a visão da Universidade de Brasília. As informações, as fotos e os textos podem ser usados e reproduzidos, integral ou parcialmente, desde que a fonte seja devidamente citada e que não haja alteração de sentido em seu conteúdo.