OPINIÃO

Eduardo Guimarães Santos é doutorando do Programa de Pós-Graduação em Ecologia pela Universidade de Brasília.

Eduardo Guimarães Santos

 

Há muito tempo a humanidade entendeu que possuía a força necessária a fazer mudanças significativas no planeta Terra. Esse poder de mudança extraordinária tem sido extensivamente demonstrado com dados quantitativos no mapeamento da história humana. Por exemplo, a expansão humana é marcada pela extinção de animais, principalmente aqueles de grande porte que serviam como fonte de alimento. Além disso, causamos mudanças ainda pouco compreendidas ao modificarmos a vegetação e domesticarmos plantas e animais. Entretanto, esse poder sobre a natureza é perigoso pois parece sempre voltar para nos cobrar um preço alto. Como exemplo, vivenciamos chuvas torrenciais na região sul que são causadas por mudanças ambientais globais. Observadores perspicazes já haviam constatados essas mudanças a partir de eventos pontuais, onde a exploração da natureza era realizada de forma intensa. Vejamos as palavras que Friedrich Engels proferiu há mais de 130 anos:

 

Não fiquemos demasiado lisonjeados com nossas vitórias humanas sobre a natureza. Esta se vinga de nós por toda vitória desse tipo. Cada vitória até leva, num primeiro momento, às consequências com que contávamos, mas, num segundo e num terceiro momentos, têm efeitos bem diferentes, imprevistos, que com demasiada frequência anulam as primeiras consequências. As pessoas que acabaram com as florestas na Mesopotâmia, na Grécia, na Ásia Menor e em outros lugares para obter terreno cultivável nem sonhavam que estavam lançando a base para a atual desertificação dessas terras, retirando delas, junto com as florestas, os locais de acúmulo e reserva de umidade. Quando consumiram na encosta sul dos Alpes os bosques de pinheiros que eram cultivados com tanto cuidado na encosta norte, os italianos não desconfiaram de que estivessem cortando pela raiz a produção de laticínios de sua região; desconfiaram menos ainda de que, desse modo, estivessem drenando a água de suas fontes montanhosas durante a maior parte do ano, para que, na época das chuvas, pudessem derramar torrentes tanto caudalosas sobre a planície.

 

Apesar disso, foi apenas em 1992 que os países se reuniram para discutir de forma ampla o tópico das mudanças ambientais e, entre elas, a perda da biodiversidade. Ou seja, a perda de espécies. Conhecida como Convenção da Diversidade Biológica, o evento ocorreu no Rio de Janeiro e foi um importante marco para definir as metas dos países em relação à exploração da natureza por nossa espécie. Nesse dia é proposto uma ampla discussão do tópico, gerando acordos de compromisso dos países com datas definidas, o que nos enche de esperança a cada ano. Essa discussão não é à toa. A biodiversidade presta serviços essenciais para nossa sobrevivência, dispersando sementes, polinizando plantas, adubando o solo, protegendo a água que bebemos, entre muitos outros serviços.

 

Entretanto, quando olhamos para os dados concretos não parece que avançamos muito para resolver o problema. De fato, desde 92 o número de espécies listadas como ameaçada de desaparecer nos próximos anos só aumentam. Por exemplo, se olharmos apenas para os grupos que melhor foram avaliados pelos especialistas, constatamos que 26% dos mamíferos, 12% das aves, 21% dos répteis e 41% dos anfíbios estão em risco de extinção. Ou seja, provavelmente irão desaparecer nos próximos anos, caso nada seja feito. Dessa forma, parece cada vez mais claro que a estrutura do sistema montado (o capitalismo), formulado com a premissa da exploração e da obtenção de lucro, não comporta a conservação da biodiversidade no planeta. Mas mudar o sistema é posto sempre como mais complexo, nos forçando a fazer o possível para amenizar o problema, apesar de nunca o resolver.


Celebremos então o Dia Internacional da Biodiversidade, tendo em mente um futuro que não seja a “Era da solidão”, profetizada por Edward O. Wilson. Me parece que apenas o “otimismo da vontade” é o caminho para seguirmos lutando contra a perda de biodiversidade, que voltará com certeza para cobrar a todos. Talvez tenhamos que subverter o tópico escolhido para a celebração do ano de 2024: “Faça parte do plano”. Pois até então, o plano não está dando certo, pois há muitos sabotadores.

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