OPINIÃO

Rose May Carneiro é professora, fotógrafa, cineasta e pesquisadora do curso de Audiovisuais da FAC/UnB. Coordenadora de extensão da FAC e do projeto Cine Pipoca no Rolê, um cinema itinerante com o foco nos Direitos Humanos (@cine.pipocanorole) apoiado pela FAP-DF. Integra os grupos de pesquisa (CNPQ) Gênero e Comunicação (@gecoms) e Narrativas e Experimentações Visuais.

 

Rose May Carneiro

 

Os road movies (filmes de estrada) são um gênero cinematográfico fascinante. Neles, a estrada é muito mais do que apenas uma paisagem ou cenário; ela é uma descoberta, uma espécie de metáfora para a jornada interior dos personagens. Tradicionalmente, este gênero tem sido dominado por protagonistas masculinos, refletindo um mundo onde a busca por liberdade e autodescoberta é vista como uma prerrogativa masculina. É comum, por exemplo, ouvirmos que “homens aventureiros” são audazes, bravios, corajosos. Já as “mulheres aventureiras” são lascivas, vulgares, disponíveis.

 

No entanto, a presença de mulheres como protagonistas em road movies não só quebram esses preconceitos absurdos, como também suscitam uma importante reflexão tanto no cinema, quanto no dia a dia, em uma prática social. Quando mulheres assumem o protagonismo nesses filmes, elas desafiam e subvertem as normas de gênero estabelecidas pelo patriarcado. Elas se tornam agentes de suas próprias histórias, ao explorar territórios desconhecidos e, ao mesmo tempo, ao enfrentar desafios que antes eram considerados exclusivos do universo masculino.

 

Essa mudança não é apenas significativa no contexto cinematográfico, no que tange à construção de um léxico, uma linguagem, mas também ao refletir e influenciar a percepção social do papel das mulheres na busca por liberdade, igualdade e autoconhecimento.

 

Infelizmente, a jornada para construir e dar voz a essas histórias nem sempre é fácil. Em meu papel de pesquisadora, por exemplo, fui tolhida em minha fala por hackers que usaram imagens pornográficas violentas para silenciar uma palestra que faria sobre este tema, no dia 28 de junho, pelo @gecoms (Gênero, Comunicação e Sociabilidades). Esse tipo de violência digital é um reflexo de uma sociedade que ainda tenta limitar a voz, a presença e a mobilidade das mulheres em espaços públicos e de poder. No entanto, assim como os protagonistas dos road movies enfrentam e superam obstáculos, nós, pesquisadoras e narradoras dessas histórias, também continuaremos nossa jornada.

 

A relevância de uma pesquisa qualitativa sobre road movies, com protagonistas femininas, não pode ser subestimada. Esses filmes não apenas ampliam a representação das mulheres no cinema, mas também oferecem novos modelos de identidade, reflexão e espelhamento sobre fruição e liberdade às mais diversas espectadoras. Filmes são fotografias que falam. Eles nos mostram e reiteram que a mobilidade e a liberdade não são exclusividades masculinas e que as mulheres têm um lugar legítimo na estrada da vida, ao enfrentar desafios, percorrer novas geografias, fazer escolhas, ter novos encontros e redefinir seu próprio destino.

 

Assim como a estrada nos road movies exige mobilidade e adaptação constante, nossa busca por novas descobertas e igualdade também deve ser resiliente. Nenhuma tentativa de nos silenciar, por mais pernóstica que seja, conseguirá nos parar. Continuaremos a trilhar nosso caminho, a explorar novos roteiros de viagens e a reivindicar nossos espaços, tanto na tela, quanto na vida real. A jornada continua, e nossa voz se fará ouvir, mais forte e clara, a cada passo dado.

 

Os road movies com protagonistas femininas representam uma importante evolução no cinema e na sociedade. Eles nos lembram que a busca por liberdade e autodescoberta é universal, desafiando as tradicionais narrativas de gênero. Como pesquisadoras e contadoras de histórias, continuaremos a explorar e celebrar essas jornadas, garantindo que nossos filmes, vozes e experiências sejam (re)vistas, ouvidas e valorizadas. A estrada é longa, mas a jornada vale cada conquista, cada novo lugar explorado, cada quilômetro rodado, cada passo.

 

*Crédito para ilustração: Marcela Ribeiro

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