Adriana Modesto de Sousa
O alerta quanto às potenciais consequências ambientais decorrentes de atividades humanas predatórias, de modelos de desenvolvimento econômico não sustentáveis, de ações ou inações governamentais vem sendo reiterado por ambientalistas, pesquisadores e organismos internacionais de forma mais contundente desde a década de 19701,2,3.
Tendo em vista estratégias de conscientização relacionadas aos Transportes, alude-se “O dia mundial sem carro”, cujo propósito é sinalizar os malefícios causados pelo uso massivo dos automóveis, entre os quais a emissão de Gases de Efeito Estufa - GEE e respectivos desdobramentos. Destaca-se que embora os países mais industrializados sejam os principais responsáveis pela emissão de GEE, são as populações hipossuficientes as mais afetadas pelos extremos climáticos e intempéries4,5.
No contexto urbano é observado o uso massivo do transporte individual motorizado (carros e motos), sobretudo, em regiões metropolitanas desprovidas de diversificação modal ou gozando de falhas nos sistemas de transporte público coletivo como é o caso do Distrito Federal. Enfatize-se que esse, além de sua frota composta por mais de 2 milhões de veículos, recebe diariamente frota adicional oriunda dos municípios que compõem sua área de abrangência, o que contribui para os congestionamentos e ocorrência de sinistros de trânsito.
Buscando-se atenuar os impactos negativos decorrentes do uso massivo de automóveis, também em atenção à Política Nacional de Mobilidade Urbana, advoga-se em favor dos modos sustentáveis. No caso das regiões metropolitanas, que sejam priorizados os transportes de passageiros de alta capacidade e respectiva infraestrutura, pois esses oferecem maior capacidade, comodidade, segurança, além de reduzirem os tempos de viagem, elevando a qualidade de vida dos usuários e impactando favoravelmente no meio ambiente6.
Tais recomendações são corroboradas ao se constatar que a metrópole São Paulo, no contexto dessa redação, “respira” o pior ar do mundo há três dias. Brasília, por sua vez, cujas ruas têm cheiro de gasolina e óleo diesel, também já não “vê” a torre, dessas feitas em razão das queimadas7,8.
Reitera-se a relevância de abordagem sistêmica quanto ao tema, pois as condições climáticas extremas como fortes chuvas e/ou calor intenso, geram uma série de transtornos, principalmente, quando não há ações preventivas por parte do Estado; quando as vias não contam com drenagem adequada; quando a qualidade do pavimento é precária ou carente de reparos; quando não há limpeza e manutenção de bocas de lobo; quando não há regular desobstrução de galerias de águas pluviais, quando a iluminação pública é insuficiente ou quando os sistemas de transporte são obsoletos.
Em síntese, nos meses em que o Céu parece desabar e/ou o calor chega a sufocar, as condições adversas do tempo podem impor uma série de desafios, desconfortos e riscos para todos os usuários da via. Considerando-se o uso massivo de automóveis e os impactos negativos na qualidade de vida, saúde, meio ambiente e mobilidade urbana, entende-se que a solução passa necessariamente por uma real mudança paradigmática, por planejamento habitacional, de transportes e circulação que efetivamente desestimulem o uso dos automóveis, não condenando os mais vulneráveis a uma rotina de mobilidade mais penosa em razão de sua classe social.
Diante do exposto e o “O dia mundial sem carro”, sugere-se a reflexão: O DF e o Entorno são dependentes do modal rodoviário e parte da frota do transporte público coletivo sobre pneus é composta por ônibus convencionais, sem dispositivos que minimizem os efeitos do calor intenso, tornando as viagens mais desconfortáveis tanto para o usuário, como para o trabalhador dos Transportes. Mesmo a frota circulante do BRT, refrigerada, em razão do volume de passageiros que via de regra excede a capacidade de lotação prevista, acaba não sendo suficiente, mas o fato é que são esses usuários que contribuem socialmente não com um, mas com 365/366 dias todos os anos.
Indaga-se: “A estrada para o inferno é pavimentada de boas intenções?” Ou se verificam mudanças efetivas ou todos serão “asfixiados”, pelo visto, de uma forma ou de outra.
Referências
1.NAÇÕES UNIDAS. (1972) Declaração de Estocolmo sobre o Meio Ambiente Humano, no Relatório da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, UN Doc.A/CONF.48/14, em 2 e Corr.1 (1972). Disponível em: https://legal.un.org/avl/ha/dunche/dunche.html. Acessado em: 11/09/2024.
2. NAÇÕES UNIDAS. (1992) Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, no Relatório da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, UN Doc. A/CONF.151/26 (Vol. I), 12 de agosto de 1992, Anexo I. Disponível em: https://legal.un.org/avl/ha/dunche/dunche.html. Acessado em: 11/09/2024.
3.NAÇÕES UNIDAS. (2015) Objetivos de Desenvolvimento Sustentável – ODS. Disponível em: https://brasil.un.org/pt-br/sdgs. Acessado em: 11/09/2024.
4.VASCONCELLOS, E.A. (2006) Transporte e Meio Ambiente: conceitos e informações para análise de impactos. São Paulo: Ed. do Autor, 199p.
5.CUNHA, C. B; YOSHIZAKI, H. T. Y. e BARTHOLOMEU, D. B.. (2017) Emissão de Gases de Efeito Estufa (GEE) no Transporte de Cargas: modelos e aplicações no Brasil. São Paulo: Editora Atlas, 213p.
6.BRASIL. (2012) Lei 12.587, de 03 de janeiro de 2012. Institui as diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana; revoga dispositivos dos Decretos-Leis nºs 3.326, de 3 de junho de 1941, e 5.405, de 13 de abril de 1943, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, e das Leis nºs 5.917, de 10 de setembro de 1973, e 6.261, de 14 de novembro de 1975; e dá outras providências. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12587.htm. Acessado em: 11/09/2024.
7.CAPITAL INICIAL. Música Urbana. Disponível em: https://www.letras.mus.br/capital-inicial/44850/. Acessado em: 11/09/2024.
8.O GLOBO. (2024) São Paulo é a metrópole com a pior qualidade do ar no mundo pelo terceiro dia seguido. Disponível em: https://oglobo.globo.com/brasil/noticia/2024/09/11/sao-paulo-tem-a-pior-qualidade-do-ar-do-mundo-pelo-terceiro-dia-seguido.ghtml. Acessado em: 11/092024.
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