OPINIÃO

Albene Miriam Menezes Klemi é professora da Universidade de Brasília e doutora em História Moderna e Contemporânea pela Universidade de Hamburgo/Alemanha.

Albene Miriam Menezes Klemi

 

A 15 de novembro de 1889, o regime que tinha fundado e consolidado o Estado sob o ramo brasileiro da Casa de Bragança, chegou ao fim, derrocado de forma titubeante pelo chefe do golpe de Estado que culminou com a deposição do Imperador Pedro II. Ao alvorecer daquela sexta-feira, na capital do império rompeu um levante militar comandado pelo Marechal Deodoro da Fonseca, que induzido pelos republicanos, derrubou o ministério constituído meses antes pelo Visconde de Ouro Preto. D. Pedro II, inicialmente, avaliou esse episódio como “fogo de palha”. De fato, ao longo daquele dia, incertezas, boatos e apreensões pairavam sobre os partidários do regime republicano. No meio da tarde, ante a ausência de declarações explicitas, o vereador abolicionista e republicano de ultima hora José do Patrocínio proclamou formalmente a República na Câmara Municipal do Rio de Janeiro, no que veio a ser a única manifestação pública da mudança de regime. Ao anoitecer, após Deodoro aceder à ideia da implantação da República, sob às intrigas e argumentos dos republicanos, constituiu-se o primeiro Governo Provisório, tendo como chefe o próprio Marechal. Ainda naquele dia, o governo baixou o Decreto N.º 1 que asseverava: “Fica proclamada provisoriamente e decretada como forma de governo da Nação brasileira – a República Federativa.” E enunciava: “As Províncias do Brasil, reunidas pelo laço da Federação, ficam constituindo os Estados Unidos do Brasil.” Assim, sob extrema facilidade a única Monarquia nos trópicos foi aniquilada e a República instalada.

 

Uma vez proclamada, a República via-se diante de dois compromissos fundacionais, formar um governo constitucional e criar uma nação. Para atender esta última demanda, o Governo Provisória convocou eleições gerais, com voto direto e universal para os homens maiores de 21 anos e alfabetizados por meio do Decreto Nº 78-B, de 21 de dezembro de 1889 que “designa o dia 15 de setembro de 1890 para eleição geral da Assembleia Constituinte. Entre disputas políticas e crises, durante o Governo Provisório, Deodoro governava e legislava por meio de decretos e ia implantando vários pressupostos norteadores da República ou que atendiam às demandas dos próceres que tinham acendido ao poder no novo regime. Assim, onze dias pós proclamação da República, trousse à baila a preocupação com os imigrantes e pelo Decreto nº 13-A, de 26 de novembro de 1889, autorizava o Ministério do Interior e governadores de Estado a conceder naturalização ao estrangeiro que a requeresse, sem cobrar impostos.

 

Sob o argumento de impedir a fragmentação do território nacional foi decretada a chamada Grande Naturalização, por meio do Decreto nº 58-A, de 14 de dezembro de 1889, que determinou que seriam considerado cidadãos brasileiros todos os estrangeiros que já residissem no Brasil no dia 15 de novembro de 18989, salvo declaração em contrário feita perante a respectiva municipalidade, no prazo de seis meses da publicação do decreto. Era a naturalização forçada que rapidamente tornou-se objeto de críticas e protestos de alguns países europeus, berço dos imigrantes. Pelo Decreto nº 200-A, de 8 de fevereiro de 1890, que promulgava o regulamento da eleição para deputados à Assembleia a Constituinte, no inciso III do Art. 4º, enunciava que todos os cidadãos brasileiros declarados tais pelo decreto da grande naturalização, eram eleitores, e tinham voto nas eleições e seriam incluídos no alistamento eleitoral pela comissão competente. O De. nº 277D, de 22 de março de 1890, reitera a condição de cidadão brasileiro a todo estrangeiro nos termos do Dec. 58-A e faz uma correção ao decreto anteriormente citado: a inclusão no alistamento eleitoral não seria automática, mas sim, daquele estrangeiro que requeresse ser alistado eleitor. A este, sucederam-se outros decretos que faziam ajustes sobre o tema e determinava que a nacionalidade brasileira seria atribuída somente àqueles estrangeiros que “houverem requerido o alistamento e aos que tivessem sido alistados pelas comissões, independentemente de requerimento, reclamassem a entrega do título de eleitor”. (Dec. N. 480, 13/06/1890).

 

Desse modo, fica patente a recepção do Governo Provisório aos anseios políticos das oligarquias que corroboraram o golpe e deram sustentação à República no seu incerto despontar, ao que reporta à possibilidade de inserir os estrangeiros nas listas eleitorais e, por conseguinte, possibilitar o alargamento do eleitorado, no caso imediato, para a Assembleia Constituinte que iria moldar o arcabouço do Estado republicano. Aliás, sob grande influência da oligarquia paulista, ou seja, do Estado com maior fluxo de imigrantes. Na data prevista na legislação, ocorreram em todo território nacional as eleições das quais os republicanos saíram largamente vitoriosos.

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