OPINIÃO

João Paulo Chieregato Matheus é professor e diretor da Faculdade de Ciências e Tecnologias em Saúde do campus UnB Ceilândia. É especialista em geriatria e traumatologia e nos fundamentos da fisioterapia.

João Paulo Chieregato Matheus

 

“Quem perde os seus bens, perde muito; quem perde um amigo, perde mais; mas quem perde a coragem, perde tudo”, escreveu Cervantes. E foi a coragem que marcou o começo de Ceilândia. Em 1971, milhares de famílias foram removidas das ocupações no centro de Brasília e levadas para um lugar distante, com pouca infraestrutura e muitas incertezas. Perderam casas, vizinhos e a proximidade com serviços. Mas não perderam a coragem.

 

Foi dessa coragem que nasceu uma cidade que não se deixou esquecer. Ceilândia precisou lutar por água, transporte, saneamento, escola, cidadania e também por universidade. Entre os anos 1980 e 2000, o Movimento Pró-Universidade Popular em Ceilândia (MOPUC), depois Associação Movimento Pró-Universidade em Ceilândia (Amopuc), mostrou que a comunidade não se cansava de reivindicar. Nada chegou por acaso, cada conquista foi fruto da insistência popular.

 

Agosto virou um mês simbólico. Em 11 de agosto de 1997, a UnB chegou à Ceilândia com o Núcleo de Prática Jurídica (NPJ), a partir das experiências do Escritório Modelo de Assistência Judiciária (EMAJ). Onze anos depois, em 26 de agosto de 2008, nasceu a Faculdade de Ceilândia, hoje Campus UnB Ceilândia: Faculdade de Ciências e Tecnologias em Saúde (FCTS/UnB), por meio do REUNI1 e da missão de levar o ensino superior público para a região administrativa que ainda possui a maior população do Distrito Federal. Não foi um presente, foi resposta a uma luta de décadas.

 

Nessa caminhada, um time incrível se juntou à comunidade para construir o Campus. Docentes, técnicos administrativos e colaboradores vieram de diferentes regiões do país, e também de Ceilândia, trazendo dedicação, experiência e muitos sonhos. Juntos, transformaram a faculdade em referência na área da saúde, reconhecida pelo MEC, ampliando oportunidades e assumindo a responsabilidade de oferecer respostas concretas às demandas da sociedade. Como nos lembra Paulo Freire, “Educação não muda o mundo. Educação muda pessoas. Pessoas transformam o mundo”. Aqui, nos corredores do Campus, essa ideia se confirma todos os dias, nos jovens que são os primeiros de suas famílias a se formar, nas pesquisas que enfrentam problemas reais do território, nas ações de extensão que tornam a universidade parte ativa da comunidade, nos projetos que apoiam escolas públicas, nos programas de saúde que chegam às regiões mais carentes, nas iniciativas culturais que valorizam a diversidade local e nos estudantes que conciliam estudo, trabalho e família para conquistar seus sonhos.

 

Hoje, 26 de agosto de 2025, celebramos 17 anos do Campus. É tempo de festa e também de refletir: estamos fazendo o suficiente? Precisamos estar mais perto dos jovens que saem do ensino médio, dos trabalhadores que estudam à noite, das mães e pais que equilibram sustento, cuidado e estudo. Precisamos ampliar nosso alcance e acolher as diferentes realidades de quem carrega nos ombros não apenas seu próprio futuro, mas também o da família e de uma sociedade que acredita na educação como força de transformação.

 

A história de Ceilândia mostra que dignidade se conquista com luta, e o Campus da UnB é prova disso. Celebrar 17 anos é motivo de enorme alegria e, sobretudo, de reafirmar o compromisso de olhar além dos muros acadêmicos, de reconhecer a força da comunidade que nos acolheu e de garantir que a universidade pública continue sendo um direito de todos.

 

Referência

1. Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais - REUNI.

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