Caio Frederico e Silva e Marcia Urbano Troncoso
O projeto Mundo Azul, desenvolvido no âmbito da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília (FAU/UnB), foca na inclusão de crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA) e constitui uma experiência aplicada em arquitetura sensorial exposta na CASACOR DF 2025, mostra que acontece na Casa do Candango (603 Sul) até 12 de outubro de 2025. A iniciativa parte da premissa de que a arquitetura desempenha papel central na mediação entre indivíduos e meio físico, sendo capaz de promover qualidade de vida e ampliar a participação social de grupos relativamente desconhecidos e eventualmente marginalizados.
O espaço experimental foi concebido como quarto infantil, configurado enquanto protótipo de ambiente terapêutico. Nesse contexto, a arquitetura de interiores assume função de capa protetora entre os excessos de estímulos do ambiente externo e as necessidades do universo interno de uma criança com autismo. A materialidade do espaço foi organizada de modo a favorecer concentração, acolhimento e segurança, por meio de soluções projetuais como o biombo curvo, a mesa circular e recantos protetivos (cesto-ninho, cama adaptada, piscina de bolinhas). Esses elementos, longe de serem apenas dispositivos formais, atuam como mediadores sensoriais que facilitam a comunicação, reduzem a ansiedade e promovem bem-estar.
Essa experiência reafirma o compromisso social da FAU-UnB com a produção de conhecimento voltado à transformação da realidade, assumindo a arquitetura como campo estratégico para a construção de uma sociedade mais inclusiva. Projetos como o Mundo Azul contribuem para consolidar uma prática acadêmica alinhada a políticas públicas nacionais e internacionais de garantia de direitos. No caso brasileiro, destaca-se a Lei nº 12.764, de 27 de dezembro de 2012, que institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista. O texto legal reconhece a pessoa com TEA como “pessoa com deficiência, para todos os efeitos legais”, garantindo-lhe direitos fundamentais, inclusive de acesso a serviços e espaços públicos em condições de igualdade.
A incorporação desses marcos legais à prática arquitetônica demonstra que a inclusão vai além de soluções técnicas isoladas: requer compromisso institucional e ético, capaz de reconhecer a diversidade neurológica como parte da condição humana. Nesse sentido, Gregorutti (2025) argumenta que a verdadeira inclusão pressupõe escuta ativa, acessibilidade comunicacional e sensorial, além da revisão crítica das práticas sociais e institucionais.
Diferentemente das soluções exclusivamente digitais — como o uso de realidade virtual e inteligência artificial para fins terapêuticos —, a experiência arquitetônica concreta mantém relevância insubstituível, pois possibilita presença, vínculo e conexão com o espaço vivido. O ambiente construído torna-se, assim, elemento essencial para o desenvolvimento da autonomia e da participação social.
O projeto Mundo Azul evidencia, portanto, que a arquitetura deve ser compreendida como agente ativo de inclusão, integrando dimensões terapêuticas, sensoriais e sociais. Ao alinhar teoria, prática projetual, compromisso institucional e diretrizes legais, reforça-se a centralidade da arquitetura na promoção de espaços mais justos, equitativos e humanos.
Referências
Lei nº 12.764 de 27 de dezembro de 2012. Institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista. Brasília, Presidência da República, [2012]. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12764.htm. Acesso em: 29 jan. 2025.
Gregorutti, Carolina Cangemi. Autismo: ciência, respeito e inclusão, Artigo de Opinião, Brasília, 2025.Disponivel em: https://noticias.unb.br/artigos-main/7932-autismo-ciencia-respeito-e-inclusao
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