Auditório lotado para ouvir as vivências de ensino do professor José Pacheco. Na última terça-feira (17), o português idealizador da Escola da Ponte (projeto inovador iniciado na década de 1970 em território lusitano) conversou com estudantes e professores de Pedagogia e de outros cursos relacionados à Educação, no campus Darcy Ribeiro. O Diálogo com José Pacheco foi mediado pelo decano de Ensino de Graduação, Mauro Rabelo; pela professora Nara Maria Pimentel, da Faculdade de Educação; e o professor Ricardo Gauche, do Instituto de Química.
Em sua primeira fala, Pacheco agradeceu a oportunidade de aprender com os presentes. A partir daí, esclareceu-se que a proposta do evento seguiria os próprios princípios basilares da Escola da Ponte: todos aprendem com todos, sem hierarquia ou distanciamento entre o estudante e o professor.
Na primeira pergunta, o professor Ricardo Gauche questionou Pacheco se a Escola da Ponte foi influenciada por Carl Rogers, norte-americano cuja obra propunha uma relação não diretiva entre psicólogo e paciente. Rogers formula uma dinâmica semelhante entre professor e estudante, que se torna responsável pela condução do aprendizado.
Pacheco explicou que a iniciativa foi influenciada por Rogers e por outros pensadores, como Vygotsky. As formulações teóricas, contudo, foram construídas ao longo da trajetória da Escola. “A Ponte é eclética, é multirreferencial. Na época, não tínhamos acesso a estas bibliografias por causa da ditadura em Portugal. Tínhamos uma intuição pedagógica. O que observamos com a Ponte é que, no fazer educacional, raramente a teoria precede a prática”, explicou. “O projeto da Ponte começou com dois parágrafos. Hoje, tem mais de duas mil páginas, porque está se fundamentando.”
“Sabemos que não há dificuldade de aprendizado. O que há são dificuldades de ensino. Dos professores, podemos exigir duas coisas: que sejam competentes (e isso todos somos); e que sejam éticos. Se um professor ensina, o aluno não aprende e o professor que insiste no método de ensino não está sendo ético”, elaborou. Pacheco esclareceu os elementos base da Escola da Ponte: autonomia, responsabilidade, solidariedade. “Desenvolvem-se projetos coletivos, humanos”, disse.
Questionado pela professora Nara Pimentel sobre os grandes desafios das agências formadoras de professores, Pacheco comentou a importância de perceber que os problemas estão no ensino. “Temos muitos estudantes na plateia que, em breve, estarão em sala de aula. E, neste momento, Piaget e Carl Rogers desaparecem e esses professores irão se deparar com a realidade. Quando os alunos não aprendem, elaboramos que é problema do estudante, por dificuldade de aprendizado ou lentidão de raciocínio; por problema social; problema na família; problema de renda. Ninguém fala nada do problema do ensino, que tem base numa estrutura dos séculos XVIII e XIX. O problema é a escola e a ideia de que dá para ensinar todos de uma vez só e de uma maneira só. Percebi que a grande causa da falta de aprendizado está em mim, em nós, professores”, respondeu.
O convidado português prosseguiu comentando que o professor não deve fazer planejamento de aula. Deve ensinar ao aprendiz a planejar, a ter senso crítico. “Precisamos de uma nova construção social da aprendizagem. Se o professor dá aula, não aprende nada. Se faz projeto com o estudante, aprende junto”, afirmou.
Respondendo às perguntas do público, Pacheco comentou o papel de vanguarda do Brasil sobre a Educação no mundo. “Para quem não sabe, o futuro da Educação está no Brasil. Os melhores projetos estão aqui, tanto os que existem, quanto os que acabaram. E os melhores teóricos estão aqui, os que vivem e os que já morreram. O Projeto Âncora é cem por cento brasileiro. A comunidades de aprendizagem, por exemplo, não têm origem anglo-saxã ou catalã. Elas começaram no Brasil, em 1905.”
Umas das dúvidas mais presentes no encontro era qual estratégia devia ser usada para adequar o método da Ponte ao currículo básico nacional estabelecido pelo MEC. Segundo Pacheco, seria uma educação de comunidade. “E, para isso, é importante criar vínculo com o aprendiz. Sem vínculo não se aprende. As estratégias são adaptadas às situações. Ou seja, não há uma estratégia. O que precisa é cuidar das pessoas e deve-se começar pelos professores”, comentou.
Sobre a importância de a escola promover a inserção social, Pacheco reforçou a ideia de que um criminoso não nasce criminoso. “O criminoso é uma construção social. Os maiores estão em Brasília. Eles tiveram acesso a todos os recursos e educação de qualidade. Só não aprenderam a ser gente”, encerrou, respondendo à provocação de um doutorando em Pedagogia que pediu a Pacheco para correlacionar a atual crise política brasileira com o ensino nacional.