OPINIÃO

 

Caio Ivo Simoni é membro do Grupo de Trabalho Estratégia, Dados e Soberania do Grupo de Estudos e Pesquisas em Segurança Internacional do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (GEPSI/IREL/UnB).

 

 

Laura Beatriz Ludovico é membra do Grupo de Trabalho Estratégia, Dados e Soberania do Grupo de Estudos e Pesquisas em Segurança Internacional do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (GEPSI/IREL/UnB).

 

Caio Ivo Simoni e Laura Beatriz Ludovico

 

Em janeiro de 2025, a Indonésia foi anunciada como membro oficial do BRICS+ ampliando o poder de compra, a circulação de bens e serviços e influência política dos demais membros. Mas, para além dos números do mercado e capacidade comercial, a ampliação de países-membros é resultado de um planejamento estratégico e geopolítico que está atento ao recente abalo da ordem mundial: essa medida comunica ao mundo que existe uma via com a real capacidade multilateral, principalmente no contexto da presidência brasileira do bloco. Neste artigo, produzido no contexto do Grupo de Trabalho Estratégia, Dados e Soberania, do Grupo de Estudos e Pesquisas em Estratégia Internacional do Instituto de Relações Internacionais (GEPSI IREL), exploraremos as implicações geopolíticas dessa expansão no contexto dos BRICS+. 

 

Antemão, cabem algumas considerações sobre o contexto de surgimento e sobre as ambições mais urgentes deste grupo de nações. Historicamente, especialmente após a Guerra Fria, os países do Sul Global têm como principal desafio se tornar independente da influência dos Estados Unidos na sua política e economia, uma vez que a hegemonia Ocidental condiciona e cerceia o desenvolvimento das nações sob sua órbita, culminando em países cujo progresso depende de um mercado amplamente dolarizado. Por exemplo, o mercado internacional é mediado pelo dólar, o que reforça a dependência econômica e limita a autonomia dos países do Sul Global, dificultando a diversificação de suas economias e o fortalecimento de suas moedas locais frente ao cenário global.

 

Essa conjuntura criou uma comunidade internacional cuja matriz de funcionamento está em uma relação de dependência das ‘nações pequenas’ para com as macroeconômicas. Como oposição a esse sistema e para possibilitar uma via alternativa, em 2009, surgiu o que hoje chamamos de BRICS+: Essa cooperação econômica por muito tempo manteve seu funcionamento entre seus 05 membros: Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, entretanto, dentre suas ambições está a de reformar as instituições multilaterais e, para tanto, precisou mudar sua estratégia de funcionamento.

 

Por exemplo, o abandono de termos como "país em desenvolvimento", "país emergente" e seus equivalentes reflete uma política emancipatória e soberana dos países do BRICS+, que buscam romper com narrativas hierárquicas impostas pela ordem global, reafirmando sua autonomia e protagonismo no cenário internacional. Isso pois essa classificação reproduz uma cartela colonial de conhecimento, visto que nenhum Estado simplesmente é imutavelmente subdesenvolvido, ele se torna dessa forma devido ao processo histórico particular de exploração desenfreada guiada por motivações e expansões imperialistas.

 

Essa problemática foi levantada pelo próprio Banco Mundial, em 2015, o que provoca a reflexão: Se a criação do BRICS tem por base o agrupamento de nações ‘emergentes’ ou ‘em desenvolvimento’, como encarar, por exemplo, a China, maior parceira comercial mundial, potência diplomática e líder em avanços tecnológicos como uma nação ‘em desenvolvimento’?

 

Assim, abandonemos os ditames ocidentais.

 

Por muito tempo, no entanto, os BRICS permaneceram como uma eterna promessa de algo grandioso, mas sem caminhos para executar esse potencial. Esse cenário mudou quando 3 de seus membros passaram por turbulências, reinvenção e ameaça política: Brasil, China e Rússia.

 

Durante o governo do ex-presidente Jair Messias Bolsonaro, o Brasil enfrentou uma política adepta à hegemonia Ocidental no país através de uma mudança paradigmática da agenda da diplomacia, transicionando brevemente durante o governo do ex-presidente para uma política externa que priorizava acordos bilaterais, ao invés de multilaterais. Além disso, os representantes do governo, com seus ideais alinhados com a extrema direita, se aproximavam do presidente estadunidense de forma insistente e preocupante, abandonando a tradição multilateralista e universalista do Itamaraty. Assim, durante seus quatro anos como presidente do país, a diplomacia brasileira enfrentou uma crise política e uma falta de identidade, tinha orgulho de ser o ‘quintal dos Estados Unidos’, o que culminou numa falta de espaço para o apoio aos BRICS+.

 

Esse cenário mudou com a reeleição do atual presidente após quatro anos de governo Bolsonaro: Lula se realinhou com a política tradicional do Itamaraty, que envolve a reorganização da comunidade internacional tendo como norte o multilateralismo. Presidente na criação do BRICS, Lula possui os ideais em acordo à razão existencial dessa cooperação. 

 

Atualmente, o BRICS+ conta com 11 membros e também com membros parceiros, e ao traçar o perfil da cooperação é possível perceber que sua maioria é asiática e tem grande poder de compra em commodities específicas: o Irã e a Arábia Saudita, com o petróleo, e a China, com o desenvolvimento tecnológico. Ao traçar esse padrão é evidente que nenhuma adesão é um ‘auxílio emergencial’ para as nações - pelo contrário, o convite visa potencializar as ferramentas existentes.

 

Assim, a adesão da Indonésia fornece à instância econômica a base de previsibilidade e aumento do seu poder de mercado, visto que o país é a maior economia do sudeste asiático, bem como tem a maior população da referida região. Em uma visão geral, consiste em um país com capacidade de desenvolver o Estado sem abrir mão da qualidade de vida e assistência, além de possuir recursos naturais estratégicos e uma posição geopolítica privilegiada, como seu controle sobre rotas marítimas cruciais, incluindo o Estreito de Malaca, por onde transita grande parte do comércio global. Ou seja, combinada com sua população jovem e crescente mercado consumidor, a posição estratégica da Indonésia faz do país um ator chave no fortalecimento do BRICS+ e na promoção de uma ordem econômica mais multipolar. 

 

O cenário que vai se formando é de alianças e estratégias em coexistência com crises econômicas, ideológicas e sociais. A expansão do BRICS+, com a adesão de países como a Indonésia, sinaliza uma alternativa concreta à ordem global centrada no Ocidente, oferecendo um modelo de cooperação que privilegia o multilateralismo e a soberania nacional. Ao mesmo tempo, a concentração de poder e influência em blocos como OTAN e BRICS+ evidencia a disputa por hegemonia e reconfiguração das lideranças globais, deixando claro que o mundo caminha para uma nova fase de rearranjos geopolíticos. Os países mais frágeis a essas conjunturas precisam escolher sua dinâmica de resiliência às essas instabilidades: Ocidente ou BRICS+, ‘de quem dependerão’ ou ‘como poderão legitimar sua soberania’.

 

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