O que há em comum entre os personagens Tintin, Spirou, os Smurfs e Lucky Luke? Certamente, não há quem não conheça ao menos um deles. Todos são de origem belga e estão em destaque na exposição Os faróis das histórias em quadrinhos belgas, disponível para visitação até o dia 17 de junho na Sala de Exposições da Biblioteca Central (BCE) da UnB. Desde o último dia 5, a BCE tem valorizado definitivamente esse tipo de obra, com a inauguração do Espaço de Pesquisa e Oficina Pagu – Espaço POP.
Com a proposta de um novo conceito de interação e uso da Biblioteca, o Espaço POP proporciona um ambiente lúdico para leitura, entretenimento e socialização. Todo o acervo foi doado por diferentes colaboradores e já conta com mais de 700 itens de histórias em quadrinhos (HQ) e dez jogos de tabuleiro. De acordo com a bibliotecária Ana Flávia Lucas, a expectativa é ampliá-lo em breve, uma vez que já foi feita requisição de novos produtos, seguindo as demandas de pesquisa e formação da Universidade.
O nome da sala é uma homenagem a Patrícia Rehder Galvão – conhecida como Pagu –, considerada uma das primeiras brasileiras que se destacou como desenhista. Tanto a exposição quanto a inauguração do Espaço POP fizeram parte da programação da I Jornada de Histórias em Quadrinhos da UnB, realizada nessa semana, entre os dias 5 e 7 de junho.
PROTAGONISMO FEMININO — A mesa formada só por mulheres já anunciava do que se tratava uma das principais conferências do evento, realizada nesta quinta-feira (7). Com o tema Mulheres e Histórias em Quadrinhos, o debate foi mediado pela professora da Faculdade de Comunicação (FAC) Priscila Borges e contou com a participação de Selma Oliveira e Regina Dalcastagnè, docentes da FAC e do Instituto de Letras (IL), respectivamente. Duas produtoras de HQ de Brasília e a quadrinista belga Flore Balthazar, uma das autoras da HQ Frida Kahlo, lançada no Brasil no ano passado, também participaram.
A experiência relatada pela autora europeia deixou claro que as dificuldades enfrentadas pelas mulheres no ofício não são exclusividade do Brasil, mas também existem na Europa. “Espero que a geração das quadrinistas não seja invisibilizada. As editoras ainda são muito masculinas e precisamos que a história dessa arte não seja escrita apenas por homens", criticou. Flore apontou como solução para esse problema a solidariedade internacional. A ilustradora, que já publicou quatro livros e faz parte de um coletivo de mulheres e quadrinhos, contou sobre sua felicidade ao conhecer várias produtoras brasileiras.
“É uma luta constante em um ambiente predominantemente masculino. É preciso se afirmar para não ser oprimida, apagada e ofuscada. A produção feminina no país é forte, mas não é legitimada e não tem visibilidade no mercado”, reforçou a ilustradora brasileira Renata Rinaldi, em um discurso emocionado. Ela também levantou questões sobre a linguagem da HQ, em geral marginalizada no meio das Artes Plásticas. “Por ser muito midiática e geralmente ligada a um produto comercial, é deixada de lado muitas vezes”, pontuou.
Quando se trata de produção independente, os desafios são ainda maiores. “Redescobri o interesse e a vocação para os desenhos quando cursava Comunicação Social na UnB, mas, na verdade, desde criança sempre gostei de contar histórias”, informou a quadrinista Taís Koshino. Seu trabalho é voltado para uma arte experimental, englobando temas pouco abordados, com cunho mais crítico e reflexivo. Como já teve produtos recusados pela mídia comercial, Taís lançou, em 2016, junto com outras desenhistas, uma coletânea de quadrinhos feita apenas por mulheres, chamada Topografias.
FEIRA – Logo após a conferência, foi realizada uma feira com produtores independentes. Representante do coletivo Fúrias, Morgana Boeschenstein foi uma das expositoras. “A iniciativa da UnB de abrir suas portas para mostrar esse trabalho dentro do contexto universitário é muito significativo para os produtores independentes”, elogiou.
A estudante de Ciências Biológicas Maria Cândida Paredes é apaixonada por quadrinhos e esteve na BCE para conhecer mais sobre a produção e o trabalho de HQ. “Eu não me identifico como autora, mas sei que há espaço para diversos tipos de atuação e quero me envolver mais na área”, contou.
Iniciativa de servidores da BCE, a I Jornada de Histórias em Quadrinhos teve a parceria da Embaixada do Reino da Bélgica e de dois grupos de pesquisa: o Gibi, da FAC, e outro em Literatura Brasileira Contemporânea, do Departamento de Teoria Literária e Literatura (TEL) do IL.
Nos dois primeiros dias, foram promovidas duas oficinas, que tiveram mais de cem interessados. A primeira foi de Produção de Personagens em HQ, com os professores Selma Oliveira, Priscilla Borges e Luciano Mendes. A outra foi de Ilustração, ministrada por Flore.