Dois robozinhos fofos que arrancam sorrisos de crianças, jovens e adultos. Jogar bola, cantar, dançar e praticar Tai Chi Chuan são só algumas das habilidades dessas criaturinhas. Mas, fazê-los esbanjar tanta simpatia por aí não é tarefa fácil. Se para muitos os robôs representam diversão, para a equipe UnBeatables, "dar vida" a esses humanoides é sinônimo de compromisso acadêmico, responsabilidade social e qualificação para o mercado de trabalho.
O grupo existe há mais de quatro anos e reúne alunos das Engenharias, sobretudo, da Mecatrônica. Inicialmente pensado para disputar competições nacionais e internacionais de robótica, ampliou seu campo de atuação e transformou-se em projeto de extensão. Além de colecionar vários títulos em torneios, desenvolve atividades, como visitas periódicas a escolas e hospitais com o intuito de aproximar o público infanto-juvenil do universo tecnológico.
"No âmbito acadêmico, temos a oportunidade de aplicar os conhecimentos aprendidos no curso e até aprofundar aspectos que a teoria não consegue abranger. Para a comunidade, queremos mostrar que a tecnologia é algo acessível", expõe a atual capitã do time, Débora Ferreira, estudante de Engenharia Mecatrônica.
"Trabalhar com esses robôs tem sido a melhor maneira de testar o que aprendi em sala de aula. Além da parte de programação, engloba a simulação de um sistema complexo, vários paradigmas da informática, tipos de processamento. Lido com situações que encontrarei, por exemplo, na indústria. A robótica é a oportunidade de colocar a mão da massa e ver resultados", relata Gildo Rodrigues, aluno de Engenharia Mecatrônica.
Os integrantes da UnBeatables são unânimes ao afirmar que a rotina do grupo ultrapassa a aplicação dos conteúdos aprendidos na graduação. Conduzir o processo seletivo para a entrada de novos membros, treinar os novatos, preparar os robôs para as competições, planejar e executar as atividades de extensão requer habilidades múltiplas.
A capitã Débora Ferreira conta que, em dois anos de projeto, desenvolveu competências que nunca imaginou possuir, como as relacionadas à gestão de pessoas e de processos.
"As questões burocráticas e a parte de divulgação e marketing do projeto são as que considero mais difíceis. Mas, também temos que desenvolver o código dos robôs para os campeonatos, manter contato com as escolas e hospitais e até administrar situações humanas, afinal, é preciso fazer com que os integrantes da equipe se conheçam e se gostem", brinca Débora.
FORMAÇÃO – Para a professora Mariana Bernardes, da Faculdade UnB Gama (FGA), a experiência dos alunos com a equipe evidencia aspectos da formação integral e holística ofertada pela Universidade de Brasília. Participar da UnBeatables, segundo a docente, estimula a busca por inovações para problemas que ainda estão em aberto, desenvolvendo o espírito crítico e questionador dos estudantes.
"Os desafios vivenciados pelo grupo exigem resposta imediata e seus integrantes precisam verificar, entre as várias opções de abordagem teórica, quais as mais adequadas para aquela situação específica. São futuros engenheiros que, quando estiverem no mercado de trabalho, estarão preparados para lidar com problemas novos, buscando novas soluções ou adaptando as que já existem", ressalta a coordenadora do projeto de extensão.
Outro aspecto positivo da experiência é a necessidade de trabalhar em equipe. "Temos alunos de vários cursos, com backgrounds e personalidades diferentes, e eles têm que trabalhar em conjunto para atingir um objetivo em comum. Quando eles vão para competições, ficam o dia todo juntos, dividem quarto, transporte e contam com a ajuda uns dos outros. É perceptível o desenvolvimento de um espírito de equipe. E também revela a capacidade de liderança de alguns", pontua Bernardes.
E não para por aí. As atividades de extensão, nas quais os alunos realizam apresentações de robótica para públicos diversos, cobram dedicação especial. "Eles têm que se organizar muito bem para as visitas. Planejar os roteiros, executar as atividades, estar com tudo certinho no dia do evento, trabalhar inibições. Percebemos melhora, inclusive, em quesitos de expressão oral e corporal", complementa a professora.
Egressa do curso de Mecatrônica, Cristiana Miranda relata que a participação na UnBeatables foi fundamental para sua inserção no ambiente de pesquisa. "Gostei tanto que resolvi continuar na pós-graduação da UnB. No mestrado, fui aceita para um estágio em um laboratório de pesquisa na Suíça, no qual apliquei vários dos conhecimentos adquiridos durante meus anos na equipe. Agora, estou tentando vagas de doutorado no exterior", depõe.
As perspectivas também estão no horizonte dos integrantes mais novos. Natalia Oliveira, aluna de Engenharia Mecatrônica, entrou no grupo em 2018, motivada pelos desafios práticos inerentes à natureza da equipe. “Trabalhamos com os problemas que de fato existem no mundo profissional, ou seja, fazemos acontecer. As competições, os títulos, os eventos de que participamos, tudo isso agrega ao nosso currículo", resume.
COMPETIÇÕES – A UnBeatables nasceu para disputar torneios de robótica e, com isso, aplicar, simular e aprimorar conhecimentos da área. Mais precisamente, os alunos e seus simpáticos robôs participam de campeonatos de futebol no Brasil e no mundo, trocando experiências e colecionando vários títulos. Entre estes, o tricampeonato na Robocup – principal disputa internacional da área – e o tetracampeonato na Competição Latino Americano e Brasileira de Robótica (CBR-LARC).
Nos torneios, os alunos precisam preparar os robôs para disputar um jogo de futebol. Antes da partida, os humanoides são programados para andar, enxergar a bola, chutar, fazer gols. Depois que entram em campo, os robôs são autônomos e não há interação com o grupo, seja por tela de operação ou por controle. Assim, o robozinhos já programados precisam “por conta própria” se entender, comunicarem-se entre si e desenvolver a estratégia do jogo.
O professor Roberto Baptista, da FGA, explica que a robótica consiste na interação entre os sensores dos robôs e o conhecimento sobre comportamento físico da máquina, ou seja, como as ações dos robôs interagem no ambiente.
"São os programas de computador desenvolvidos pelos alunos que amarram essas informações. Dessa forma, pode-se dizer que os alunos colocam a inteligência no robô. Então, de fato, os melhores alunos programam os melhores robôs e consequentemente ganham o jogo."
A capitã Débora Ferreira conta que o maior desafio, além do desenvolvimento dos robôs, é fazê-los se adaptar às condições da competição. "Mesmo com treinamento prévio, adequar-se às condições do local é bastante difícil porque tudo influencia o reconhecimento do robô. E são novas dificuldades a cada ano. Antes, os gols tinham cor diferente, agora não. Isso confunde os robozinhos, pois eles não sabem qual o lado que eles têm que chutar."
Como ponto positivo, o estudante de Engenharia Mecatrônica Bruno Murta destaca a integração das equipes nas competições. "Trocamos informações, nos ajudamos, temos boa noção do desenvolvimento dos programas dos adversários e a convivência ótima. É uma boa troca de conhecimento", opina.
Na visão de Gildo Rodrigues, aluno envolvido com a robótica desde o ensino médio, participar dos torneios é experiência ímpar. "Tem aquela atmosfera de animação, todo mundo se empenhando ao máximo para cumprir o objetivo, não tem hora para dormir, para acordar, para comer, para nada. Mas é incrível e enriquecedor", detalha o integrante da UnBeatables, que esteve no mundial do Canadá, em 2018.
EXTENSÃO – Se estar nas competições é algo importante para a vida e para o currículo dos estudantes, são as visitas a escolas e hospitais que os transformam enquanto pessoas e futuros profissionais. Nestes locais, UnBeatables leva tecnologia ao público leigo, de forma lúdica e divertida.
"Trabalhamos dos pequeninhos aos maiores, com o desafio de tentar adaptar a linguagem para as diferentes faixas etárias. Ao mesmo tempo que não pode ser difícil, também não pode ser algo entediante", conta Débora Ferreira.
"Falamos sobre a parte física do robô, mostramos que ele tem uma câmera, sensores. Explicamos que a cabeça dele é um computador e que o robozinho vai funcionar como um computador funciona, basta ensiná-lo a pensar", revela a capitã do time.
As apresentações dos robozinhos são sucesso inquestionável com todos os públicos. Surpresa, fascínio, alegria, vibração e energia são algumas das sensações provocadas por cada gesto programado. Para arrancar tanta alegria, os humanoides dançam todos os ritmos. Já coreografaram músicas de filmes famosos, como Let it go, diversos funks e até Macarena, hit espanhol que fez sucesso no Brasil na década de 1990.
"Uma das primeiras perguntas que fazemos às crianças ou jovens é se alguém já viu um robô. Normalmente, ninguém responde que sim. Como é algo que eles não estão acostumados, ficam completamente encantados. Vemos brilho em cada rosto e conseguimos passar a mensagem de que é possível trabalhar com tecnologia", aponta Eric do Vale, estudante de Mecatrônica.
Além do roteiro já pensado, os estudantes de Engenharia procuram levar computadores e perguntar às crianças o que gostariam que o robô fizesse. A partir disso, programam as ações desejadas pelo público. "Didaticamente, mostramos que o robô funciona como se fosse um quebra-cabeça, uma construção de blocos. Ele tem um software próprio para mexer cada parte do corpo: braços, pernas, cabeça. Arrumando cada bloquinho, podemos fazer movimentos e coreografias", aponta Eric do Vale.
Como momento marcante, o estudante se recorda de uma visita a crianças autistas. "Tivemos a recomendação para ter cuidado com os robôs, que são frágeis, mas não precisamos disso. A criançada contemplava os robozinhos, todos ficaram encantados."
Débora completa que também foram alertados por algumas monitoras sobre a dificuldade de contato físico das crianças com outras pessoas. "Mas elas ficaram tão alegres com o robô que pegaram nas nossas mãos automaticamente. Fico emocionada toda vez que comento isso. Foi muito bonito."
"Nós sabemos o que está por trás daquele robô. Mas, para as crianças, é algo mágico, diferente, lúdico. É o robô ganhando vida. É gratificante ver a felicidade delas e mostrar que a tecnologia é algo possível", sintetiza Lívia Fonseca, integrante da UnBeatables e aluna de Engenharia Mecatrônica.