Liderança e responsabilidade social. Estes são motes que permeiam a atuação dos estudantes na Enactus UnB, projeto de extensão ligado à organização internacional homônima, sem fins lucrativos, que incentiva universitários no desenvolvimento de ações com foco em empreendedorismo socioambiental. Com 24 discentes de graduação e pós-graduação de diferentes cursos, o time da Universidade de Brasília foi destaque recentemente por dois projetos sociais desenvolvidos: o Capital Social e o curso Future Makers.
O reconhecimento veio durante o Evento Nacional Enactus Brasil (Eneb), realizado em julho deste ano, no qual a equipe foi premiada pela primeira vez. Trata-se de encontro promovido anualmente pela Enactus Brasil, presente em universidades públicas e privadas de 22 estados brasileiros, para troca de experiências entre universitários envolvidos na rede e para aproximá-los de empresas parceiras da iniciativa.
“A ideia da Enactus é promover uma liderança ativa e empreendedora, ou seja, que os universitários consigam fazer projetos e ter essa ação empreendedora dentro das universidades e, para além de ajudar as comunidades, eles também teriam esse crescimento pessoal e profissional”, explica a presidente da Enactus UnB e estudante de Relações Internacionais, Livya Ribeiro.
“Além de poder desenvolver soft e hard skills [habilidades subjetivas e técnicas] que você poderia desenvolver numa empresa júnior, você vai estar desenvolvendo esse lado mais humano e ajudando pessoas reais. Então, você pode fazer a diferença na vida de algumas pessoas”, acrescenta a discente.
Os estudantes são incentivados a atuar com base nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Para levantar os recursos necessários à realização dos projetos sociais, eles participam de editais das empresas que apoiam a rede brasileira no desenvolvimento de soluções inovadoras.
FINANÇAS EM FOCO – Voltado à educação financeira de comunidade em vulnerabilidade socioeconômica, o projeto Capital Social esteve no top oito do edital Ford C3: diversidade, equidade e inclusão, cujos premiados foram conhecidos durante o Eneb deste ano.
A proposta surgiu em 2021 e o intuito era atuar junto à comunidade da Cidade Estrutural com curso de educação financeira para mulheres de baixa renda.
“O Capital Social partiu dessa necessidade de enxergar o público de mulheres vulnerabilizadas no sistema que não conseguiam se inserir no mercado de trabalho e ter um tempo para conseguir uma renda extra", explica Matias Escalant, recém-egresso do curso de Administração e um dos precursores do projeto.
O curso foi ofertado on-line, durante a pandemia de covid-19, com quatro aulas disponibilizadas pelo YouTube. A oferta foi feita em parceria com o projeto Contabilidade Conectada, da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Gestão Pública (Face/UnB), coordenado pela professora Ducineli Botelho. A partir da colaboração, foi possível adaptar o conteúdo a uma linguagem mais inclusiva para o público-alvo.
A então coordenadora do Capital Social e hoje mestranda em Desenvolvimento Sustentável na UnB, Leilane Reporedo, lembra, no entanto, que a pandemia impediu a interação presencial com os participantes e que grande parte da comunidade não tinha acesso à internet, o que influenciou no alcance do curso. “Nesse primeiro momento, a gente teve impacto baixo da quantidade de pessoas que ficaram até o final do curso. Foram só quatro pessoas, mas elas deram feedback positivo.”
Ainda assim, Leilane conta que a experiência marcou sua trajetória acadêmica, já que foi sua primeira oportunidade de liderar um projeto. Além do aprendizado, ela relata um diferencial: poder desenvolver uma formação mais humana.
“O contato com as pessoas da comunidade foi o principal, no sentido pessoal, de conversar com as pessoas, entender um pouco sobre a história de vida delas, coisas que a gente nem imagina quando está na nossa bolha”, comenta a estudante, que hoje é conselheira do time.
REALIZAÇÕES E PORVIR – Na segunda fase do projeto, a Enactus UnB, já parceira da cooperativa de reciclagem do Distrito Federal Renove, passou a focar as ações no coletivo e ampliou o público do curso, incluindo homens catadores. A organização financeira foi assunto principal da capacitação presencial para os cooperados, realizada entre janeiro e fevereiro de 2023.
No curso, eles foram a presentados a conteúdos como traçar metas de vida, anotar despesas, gastos e receitas, guardar reserva, analisar crédito, fazer compras parceladas e pedir empréstimo em banco. Além das aulas, ainda junto ao Contabilidade Conectada, foram realizadas rodas de conversa e interações por plataforma de mensagens para apoiar os participantes no aprendizado dos conteúdos.
“A gente também produziu um material de apoio que era um diário financeiro para o curso, com todos os conteúdos que as professoras passaram, mas de maneira prática, onde eles podiam preencher com os seus próprios gastos e receitas para poder ter essa organização financeira”, explica a estudante de Publicidade e Propaganda e atual coordenadora do projeto, Thaís Guedes.
Desta vez, o impacto foi significativo: 46 catadores participaram de ao menos uma das quatro aulas do curso, enquanto 33 concluíram a capacitação. Os relatos de satisfação pelos catadores e a demanda destes por aprendizado sobre empreendedorismo motivaram a equipe do Capital Social a iniciar uma nova etapa do projeto, ainda com a cooperativa Renove.
“A gente identificou isso e começou a pensar na próxima fase do projeto, que é o Programa de Capacitação Empreendedora, que foi o que a gente submeteu no edital da Ford e fomos selecionados. É para desenvolver um programa para capacitar os catadores num panorama sobre empreendedorismo e sobre como empreender”, compartilha Thaís.
Com o valor da premiação recebido este ano no edital Ford C3: diversidade, equidade e inclusão, os estudantes pretendem oferecer microcrédito para que os catadores possam desenvolver seus próprios negócios. A expectativa é que o Programa tenha início ainda este ano.
JOVENS EMPREENDEDORES – Em 2023, a Enactus UnB também foi uma das três vencedoras de um desafio lançado pela Standard Chartered. A ideia era ofertar um curso de empreendedorismo e empregabilidade de jovens, pensando as dificuldades de estudantes e egressos da graduação em serem alocados no mercado de trabalho e liderar seus próprios negócios.
“A demanda surgiu a partir de uma necessidade identificada pela empresa. Eles já tinham conhecimento de como capacitar pessoas nas questões de empreendedorismo e empregabilidade, mas não conseguiam alcançar tantas pessoas quanto gostariam”, aponta Matias Scalant.
Com conteúdos gravados pelos estudantes a partir de uma adaptação de materiais oferecidos pela Standard Chartered, o curso on-line Future Makers foi realizado em quatro módulos, com aulas disponíveis entre janeiro e abril de 2023.
Foram abordados assuntos como planejamento do futuro, emprego na era digital, a atuação como próprio chefe empreendedor e o empreendedorismo com propósito. Apesar de focado em jovens de 15 a 29 anos, o curso também atingiu pessoas de outras idades.
No desafio, a Enactus UnB destacou-se pelo número de inscrições alcançadas: foram 456. O quantitativo foi atingido graças à mobilização de toda a equipe. “A gente se propôs a desenvolver o curso, os materiais e a gerenciar os inscritos para conseguir fornecer o material. A gente fez uma mobilização interna no time porque, além de ser uma oportunidade de entregar valor para a sociedade, impactando esses jovens com essas capacitações, também recebemos recursos financeiros para investir nos nossos projetos a partir dessa oportunidade”, detalha Matias.
O curso Future Makers está disponível no YouTube. Assista:
APP PARA CUIDADORES – A Enactus UnB conta, ainda, com outro projeto social em atividade: o GEROcuidado, que concorreu ao Prêmio Inspirando Cuidado, do Instituto Sabin. A perspectiva é desenvolver uma plataforma que centralize informações para facilitar a gestão do cuidado de pessoas idosas, sobretudo se compartilhado.
“A atenção à pessoa idosa envolve muito cuidado. Você tem que estar ali atento, prestar atenção em como a pessoa está sentindo, se aconteceu alguma coisa, como ela está se alimentando, que horas tem que tomar remédio, tem que marcar consulta. São várias questões em torno da vida da pessoa idosa que acabam muitas vezes, infelizmente, sobrecarregando aquela pessoa ou aquela rede que está responsável pelo cuidado, seja cuidador formal ou informal”, explica Leilane Reporedo, que idealizou a iniciativa inspirada na relação de cuidado entre a mãe e a avó.
Na ferramenta será possível registrar aspectos da rotina da pessoa idosa e do estado de saúde por meio de informações de exames e consultas.
Apesar de não ter vencido o prêmio do Sabin, o projeto recebeu R$ 2 mil em recursos e mentoria do Instituto por seis meses. No momento, a plataforma está em desenvolvimento a partir de parceria com as disciplinas Métodos de Desenvolvimento de Software (MDS) e Engenharia de Produto de Software, ministradas na Faculdade UnB Gama (FGA) pelo professor Hilmer Rodrigues Neri.