Há semelhanças entre gerir a Universidade de Brasília e gerir uma cidade. A começar por sua população, que soma quase 57 mil pessoas, formada por estudantes (89,9%), docentes, servidores técnicos e terceirizados. Diferentemente de uma cidade, entretanto, a missão da UnB é ofertar ensino, pesquisa e extensão de excelência. Seu orçamento é peça-chave nesse propósito.
Para facilitar a compreensão do orçamento, uma apresentação pública foi feita à comunidade interna e externa no encontro UnB: situação e desafios – um diálogo com a Administração Superior. A exposição reúne dados orçamentários desde 2014, fornecendo um panorama comparativo ao longo dos anos.
A verba destinada à Universidade é estabelecida na Lei Orçamentária Anual (LOA), que define como o dinheiro público deve ser utilizado. Para 2019, o valor sancionado para a UnB foi de R$ 1,79 bilhão. Desse montante, cerca de 85% é vinculado a despesas obrigatórias, como pagamento de pessoal, incluindo aposentados e pensionistas. Essa parcela não é gerida pela UnB, estando a cargo do governo federal.

Para manter seu funcionamento, a UnB dispõe dos demais 15%, que é orçamento discricionário, correspondente a R$ 258,1 milhões neste ano. O valor é dividido entre custeio e investimento, sendo que ambos recebem aporte da Fonte Tesouro (oriundos do governo federal) e de fontes próprias (gerados pela UnB).
A maior parcela discricionária é destinada ao custeio, para despesas, como água, energia elétrica, serviços de vigilância e portaria. Para 2019, são R$ 229,9 milhões, sendo 64% de aporte da Fonte Tesouro e os demais aportados pela UnB. A verba para custeio representa menos de 50% do valor aportado em 2014 (R$ 476 milhões), revelando os cortes orçamentários que atingem a Universidade nos últimos anos.
O restante do orçamento discricionário é destinado a investimento, sendo aplicado em obras e edificações e em aquisições diversas, como livros, equipamentos eletrônicos, recursos para laboratórios. Para 2019, são R$ 28,2 milhões, sendo 70% dessa receita gerada por fontes próprias da UnB e os demais aportados pela Fonte Tesouro. O montante atual corresponde a apenas 31% do valor aprovado em 2014 (R$ 90,3 milhões), reforçando os cortes orçamentários.
“Olhando para o gráfico [abaixo], com a curva da LOA discricionária decrescendo ao longo do tempo, temos uma avaliação muito clara do esforço que a UnB tem feito para funcionar de forma plena, formando pessoas com qualidade e entregando pesquisa de ponta mesmo em um cenário adverso”, analisa a decana de Planejamento, Orçamento e Avaliação Institucional (DPO) Denise Imbroisi.
A decana acrescenta que, se os valores forem corrigidos pela inflação, o poder de compra da Universidade é quase três vezes menor do que em 2014. Além dos cortes, um outro fator preocupa a instituição: o bloqueio orçamentário.

BLOQUEIO – No início de maio, o Ministério da Educação bloqueou R$ 48,5 milhões na parcela do orçamento discricionário da UnB que é aportado pela Fonte Tesouro. O valor corresponde a 31,4% do total discricionário aportado por essa fonte (R$ 154,6 milhões). Ao se retirar do montante os recursos destinados à assistência estudantil (cerca de R$ 34 milhões), que não foram bloqueados pelo governo, o percentual de bloqueio na Fonte Tesouro chega a 39,2%.
“Além do bloqueio, há contingenciamento, que é liberação gradual dos recursos. No primeiro semestre, para realizar despesas de custeio na Fonte Tesouro, temos autorização para usar apenas 40% do valor anual, em vez de 50%”, acrescenta Imbroisi. Para despesas de investimento na Fonte Tesouro, a autorização é de apenas 10% do valor anual.
No contingenciamento, o governo libera um percentual menor do que o esperado para o período. O bloqueio é, por sua vez, uma medida orçamentária mais drástica, porque o crédito orçamentário se torna indisponível, ou seja, a Universidade não pode indicá-lo para fazer processos licitatórios, por exemplo.
Outra limitação às contas da instituição é a Emenda Constitucional 95, que implantou o teto dos gastos. Isso porque, mesmo que a Universidade obtenha um aumento de arrecadação em suas fontes próprias (com aluguéis e projetos, por exemplo), a utilização fica limitada ao teto aprovado na LOA.
“Nossa previsão até o momento garante arrecadar 96% do que foi aprovado pela LOA. Entretanto, existe a possibilidade de que, no decorrer do ano, novos projetos gerem receita para a UnB, aumentando nossa arrecadação. Se isso exceder o limite do orçamento aprovado, não podemos usar esses recursos", comenta a decana.

PERSPECTIVAS – Para enfrentar o déficit orçamentário, a estratégia da Universidade, implementada em anos anteriores, foi incrementar receitas e reduzir despesas. Diante dos esforços já empregados, a reitora Márcia Abrahão garante que não há mais onde cortar gastos e aponta como únicas medidas viáveis daqui para frente o desbloqueio e o descontingenciamento orçamentário.
“Continuar buscando meios internos de sobreviver significa reduzir ainda mais as ações universitárias, no momento em que é preciso competir internacionalmente”, alertou Márcia Abrahão no encontro com a comunidade. A reitora informou que tem atuado junto ao governo, à Andifes (Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior) e a parlamentares para reverter as medidas governamentais de redução orçamentária.
O desbloqueio orçamentário foi defendido junto ao ministro da Educação, Abraham Weintraub, no último dia 16. Na última semana, em novo encontro com parlamentares de bancadas do Distrito Federal na Câmara e no Senado, Márcia Abrahão alertou que a reversão do bloqueio é uma pauta emergencial.
A apresentação pública à comunidade integra o esforço da instituição para que a comunidade esteja bem informada sobre os desafios enfrentados pela UnB, pelas demais instituições de ensino superior público do país e pelos órgãos que integram o Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia.
“Cada um de nós deve estar bem informado sobre o impacto dos cortes e do contingenciamento para o desenvolvimento do país”, alertou o vice-reitor Enrique Huelva. “Se não conhecermos bem nossa própria realidade, dificilmente conseguiremos defender nossa instituição”, acrescentou o gestor.
PANORAMA GERAL – Uma análise ampla da LOA mostra que, de 2014 a 2019, o orçamento da instituição cresceu de R$ 1,575 bilhão para R$ 1,798 bilhão. Entretanto, o incremento foi destinado somente à parcela de despesas obrigatórias, referente a pagamento do quadro pessoal. Conforme detalhado acima, a parcela de despesas discricionárias teve expressiva queda.
Ao analisar o orçamento geral é importante considerar outros fatores. No mesmo período, a UnB teve aumento não apenas no quadro pessoal, mas proporcionalmente na quantidade de alunos. Assim, sua população acadêmica saiu de 50 mil pessoas (49.616) para quase 57 mil. Isso explica a maior demanda por servidores.
Outro fator a ser considerado é a mudança no perfil discente, oportunizada pela expansão e democratização do ensino superior público. Uma pesquisa da Andifes revelou que 70% dos estudantes de universidades públicas federais têm renda per capita familiar inferior a um salário mínimo e meio. Parcela considerável desses acadêmicos depende do apoio institucional para concluir a graduação com sucesso.
A situação pode ser constatada na quantidade de refeições servidas gratuitamente a estudantes em condição de vulnerabilidade socioeconômica no Restaurante Universitário. De 2014 a 2018, houve aumento de 74,4% no número de refeições 100% subsidiadas pela Universidade. A UnB também ampliou a concessão de outros benefícios, como bolsas de auxílio-socioeconômico.
Mais informações sobre ensino, pesquisa, extensão, inovação e internacionalização estão disponíveis nas apresentações exibidas pelos gestores no diálogo com a comunidade.