A Universidade de Brasília recebe, até sexta-feira (28), o XXIII Congresso da Sociedade de Arqueologia Brasileira (SAB). A cerimônia de abertura ocorreu nesta segunda-feira (24), na Associação dos Docentes da UnB (ADUnB). Considerado o principal encontro científico da área no país e um dos maiores da América do Sul, o congresso reúne pesquisadores, estudantes, autoridades governamentais, instituições científicas e representantes de povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais. A edição de 2025 tem como tema Arqueologias pelo amanhã: sonhar outros mundos, que destaca a pluralidade epistêmica do campo e o protagonismo de diferentes povos na construção do conhecimento arqueológico.
A reitora Rozana Naves ressaltou a importância da pluralidade de perspectivas na arqueologia, a valorização de saberes tradicionais e o papel da Universidade na defesa da memória, da democracia e das políticas públicas que projetam futuros mais justos. “O plural me chama atenção porque revela muito do movimento científico nas diversas áreas do conhecimento, na possibilidade de abordar um mesmo objeto a partir de diferentes perspectivas e vozes, reconhecendo os saberes tradicionais e práticas distintas daquelas que a sociedade ocidental consolidou como padrão. E, mais do que o plural, também me marca essa projeção para o amanhã. Isso dialoga com as discussões que temos feito na UnB, inclusive sobre a criação de um curso de bacharelado em Arqueologia, articulando as potencialidades das nossas áreas para construir novos caminhos de formação”, disse.
O presidente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Leandro Grass, ressaltou o papel da arqueologia como ferramenta de inclusão, desenvolvimento socioambiental e valorização das comunidades tradicionais, e celebrou o trabalho conjunto entre o Iphan, a SAB e as universidades públicas. “Temos avançado na retomada da política do patrimônio cultural, na revisão de normativas importantes e no diálogo com as universidades para que uma arqueologia social e inclusiva possa realmente florescer no Brasil. A arqueologia é uma grande ferramenta de redução das desigualdades, de geração de oportunidades econômicas para comunidades tradicionais e de fortalecimento da preservação socioambiental.”
A presidente da Sociedade de Arqueologia Brasileira (SAB), Adriana Chifflet Dias, pontuou o significado de realizar o congresso na UnB, celebrando o acolhimento institucional, o esforço coletivo que tornou o encontro possível e a expectativa por uma semana de debates produtivos. “São mais de 450 trabalhos inscritos e cerca de 600 participantes, o que torna uma grande satisfação trazer o congresso para a casa de vocês, para a UnB”, afirmou.
Logo após as boas-vindas, o público acompanhou duas conferências que ajudaram a definir o tom do congresso. A pesquisadora Ana Cecília Maurício, da PUC-Peru, trouxe reflexões sobre os desafios contemporâneos da área. Em seguida, a chilena Patricia Ayala discutiu arqueologia, decolonialidade e a urgência de imaginar outros mundos possíveis – tema que mobilizou reações emocionadas da plateia e abriu espaço para conversas que seguiram pelos corredores.
PROGRAMAÇÃO – Com o congresso da SAB, até sexta-feira (28) a UnB se transforma em um grande mosaico de debates. A programação espalhada pelo Instituto de Geociências, Instituto de Ciências Sociais, Memorial Darcy Ribeiro, Faculdade de Tecnologia e outros espaços reúne sessões temáticas, comunicações científicas, oficinas, reuniões, exposições e exibição de produções audiovisuais. São dezenas de temas que atravessam o campo: arqueologia indígena, tecnologias líticas, microarqueologias, mudanças climáticas, arqueologia pública, arte rupestre, coleções e colonialismo, bioarqueologia, arqueologia urbana e colaborativa – cada um deles abrindo janelas para diferentes modos de compreender o território e seus patrimônios.
Questões como lugares sagrados e repatriação, patrimônio subaquático, desinformação, invisibilidade negra e os caminhos para uma arqueologia comprometida com a vida e com os direitos dos povos têm sido discutidas nas mesas-redondas. O congresso reserva, ainda, momentos de celebração: a entrega do Prêmio Luiz Castro Farias e do Prêmio Excelência SAB, além de várias sessões dedicadas ao lançamento de livros que revelam a vitalidade da produção científica brasileira. O encerramento terá a conferência de Eliel Benites, do Ministério dos Povos Indígenas, seguida de uma confraternização entre participantes.
Com 45 anos de história, a SAB mantém vivo um compromisso que atravessa gerações: defender o patrimônio arqueológico brasileiro e fortalecer uma ciência conectada com as pessoas, com os territórios e com a diversidade cultural do país. Ao receber esta edição do congresso, a UnB reafirma seu papel como espaço de diálogo, encontro e construção coletiva de saberes – um lugar onde a arqueologia ajuda a olhar para o passado sem perder de vista a urgência de imaginar futuros mais justos.
COMPROMISSO – A Universidade de Brasília, ao sediar o XXIII Congresso da Sociedade de Arqueologia Brasileira (SAB), reforça sua trajetória de promoção de diálogos plurais e engajamento com saberes tradicionais. Nas últimas semanas, a UnB também protagonizou momentos importantes de extensão, antirracismo e valorização cultural em sua programação institucional.
Durante a 25ª Semana Universitária (Semuni25), que ocorreu entre 3 e 8 de novembro, a Universidade ofereceu mais de 1,2 mil ações gratuitas em todos os campi. A mesa de abertura foi marcada pela presença da docente indígena Altaci Kokama, que refletiu sobre as relações de corpo, território e ancestralidade. Kokama afirmou que “o território, para nós, corpos indígenas, é a continuação dos nossos corpos” – frase que ressoa com a proposta de “sonhar outros mundos” que guia o congresso da SAB.
Também na Semuni25, o Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros (Neab) teve papel central nas discussões sobre raça, memória e justiça institucional. Um exemplo emblemático foi a outorga post mortem do título de Doutora Honoris Causa à antropóloga e intelectual Lélia Gonzalez, figura essencial no pensamento antirracista e na epistemologia negra. A cerimônia emocionou a comunidade universitária, com a neta de Lélia recebendo o reconhecimento, e foi apontada pela reitora Rozana Naves como “um chamado para abrir espaços, corrigir silêncios e aprender com quem veio antes”.
Em paralelo, a UnB promoveu o I Seminário Luiza Bairros, em celebração aos 22 anos da Lei nº 10.639/2003, que instituiu a obrigatoriedade do ensino da história e cultura afro-brasileira nas escolas. O encontro trouxe gestores educacionais, pesquisadores e ativistas para debater políticas étnico-raciais e o papel da universidade em promover a equidade.
Outro momento simbólico da Semana Universitária foi o II Encontro de Coletivos LGBTQIAPN+, que ocorreu na Maloca, campus Darcy Ribeiro. A programação incluiu uma oficina de grafismos indígenas, conduzida por estudantes da Associação dos Acadêmicos Indígenas da UnB (AAIUnB), reunindo arte corporal, tradições e coletividade.
