"A melhoria da consciência ambiental vai abrir espaço para muita inovação no DF. É a oportunidade de desenvolver ideias e tecnologias de baixo custo. Nesse momento de crise, teremos o suporte de órgãos financiadores e, talvez, do próprio público interessado em investir em novas soluções”, afirmou Sérgio Koide, professor de Engenharia Civil e Ambiental, durante a aula pública Olhares sobre a crise hídrica no Distrito Federal, realizada nesta quarta-feira (22), na entrada norte do ICC, em comemoração ao Dia Mundial da Água.
O pensamento do docente resume o olhar compartilhado com a comunidade acadêmica pelos demais palestrantes. Mais consciência ambiental, novas oportunidades de emprego e desenvolvimento tecnológico foram apontados pelos especialistas como aspectos positivos que podem surgir da crise hídrica.
A presidente da Associação dos Produtores Protetores da Bacia do Descoberto (Pró-Descoberto), Rosany Cristina Carvalho, está otimista. A crise pode propiciar investimento do governo para capacitar o agricultor sobre como irrigar sua plantação e produzir utilizando menos água. “Temos canais de irrigação construídos há mais de 40 anos e que nunca tiveram ajuda do governo para serem melhorados. Temos esperança de que a crise seja um momento de oportunidade para o setor rural”, disse a produtora rural.
Como contrapartida, ela garantiu que o setor está comprometido com o meio ambiente. “Há muitos anos nos preocupamos com a questão hídrica na nossa região. Temos um histórico de resistência à especulação imobiliária e à grilagem de terras”, detalhou Rosany Cristina. A Pró-Descoberto desenvolve e participa de projetos de conservação ambiental.
"Parece contraditório, mas a crise é um momento que abre esperança. Traz um alerta para todos nós e nos gera novas oportunidades", afirmou o deputado distrital Chico Leite, presidente da Frente Ambientalista na Câmara Legislativa. De acordo com o parlamentar, entre as iniciativas da Frente estão a elaboração de projeto de lei sobre reuso da água e a criação do Pacto pela Água, que prevê direitos e obrigações para governo, instituições e população.
Para Chico Leite, é preciso combater as causas da crise. “Entre elas, a grilagem de terras, que privilegia o direito individual. Isso tem servido ao enriquecimento de algumas pessoas. Os pequenos produtores são nossos aliados, mas os grileiros são inimigos de Brasília. O direito de morar não pode se contrapor ao direito à vida. É preciso coragem para enfrentar esse problema", enfatizou o deputado.
Paulo Salles, presidente da Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento do DF (Adasa), defendeu que é preciso consertar os erros ao longo do caminho. “Brasília foi construída em um lugar privilegiado do ponto de vista hídrico. Contudo, a ocupação desordenada e irregular tem feito com que a região perca sua capacidade de abastecimento. Não podemos deixar que essa data se transforme no dia mundial sem água.”
Para o gestor da Adasa, novas opções de fornecimento de água devem ser encontradas. “O Sistema de Corumbá já deveria estar funcionando. Temos possibilidade de usar o Lago Paranoá, mas as obras ficaram paradas no tempo. Além disso, a própria ONU colocou a ideia de que devemos viver em racionamento, pois a realidade de escassez hídrica é uma problemática mundial."
A estudante de Ciências Ambientais Talita Rocha interpelou os palestrantes a respeito de medidas para recuperar águas degradadas do DF e produzir águas por meio da plantação de árvores e do controle do desmatamento. A universitária também enfatizou a importância de parcerias com o governo de Goiás, já que muitas nascentes e córregos ultrapassam o limite geográfico do Distrito Federal.
O professor de Engenharia Elétrica da UnB José Camargo da Costa ressaltou que a academia tem soluções importantes para contornar a crise hídrica. O docente compartilhou o resultado de uma pesquisa que oferece irrigação de precisão, que diminui em até 40% o percentual de água utilizado para esse fim. Segundo ele, falta apenas fazer o elo entre a solução proposta pela academia e o setor produtivo.
UnB EM AÇÃO – O chefe de gabinete da Reitoria, Paulo César Marques, afirmou que a Universidade tem revisto procedimentos administrativos e adotado medidas que visam um consumo mais consciente do recurso hídrico. O gestor divulgou também que a UnB está se preparando para o 8º Fórum Mundial da Água, que será realizado na capital no próximo ano.
Para isso, foi constituída uma pré-comissão que tem mapeado na UnB iniciativas e grupos de pesquisa relacionados à questão da água. A partir desse diagnóstico, será constituída comissão responsável por elaborar um calendário de atividades, a ser apresentado e validado pela comunidade acadêmica. No horizonte, a realização de um minifórum na UnB antes do Fórum Mundial.
"Temos a possibilidade de intervir nas construção das agendas de discussão do fórum. Podemos contribuir apontando as pessoas que militam e trabalham nessa questão", afirmou Paulo César Marques. “Queremos envolver toda a comunidade nesse esforço, abrir o olhar para a questão da sustentabilidade, porque isso é um desafio de todos nós.”
SOBRE – O evento foi organizado pelo estudante de Ciências Sociais João Marcelo Marques Cunha e promovido pelo Centro de Estudos Avançados Multidisciplinares (Ceam/UnB) em parceria com o Decanato de Extensão (DEX), Casa da Cultura da América Latina (CAL/DEX), Núcleo de Estudos Amazônicos (NEAZ) e Núcleo de Estudos Ambientais (NEA).
Maria Lúcia Pinto Leal, diretora do CEAM, enfatizou o papel da Universidade quanto à crise hídrica no DF: “Esse tema envolve direitos fundamentais e devemos participar subsidiando a construção de políticas públicas, com uma perspectiva crítica e capaz de dar respostas a questões complexas como a que estamos vivendo”.