Uma experiência que contribui para a formação profissional, traz ganhos curriculares e, sobretudo, promove solidariedade, convívio e acolhimento. Esses são alguns dos benefícios em participar do Programa de Tutoria Especial (PTE), que apoia estudantes da Universidade de Brasília com alguma limitação ou deficiência. Acadêmicos de graduação ou pós-graduação podem se candidatar à oportunidade, que está com vagas abertas para participação voluntária ou remunerada. As inscrições seguem até 18 de abril.
Estudante do segundo semestre de Engenharia Mecatrônica, Andreza Rodrigues, de 19 anos, tem deficiência física e paralisia cerebral. No primeiro semestre a jovem cursou sete disciplinas e conta que teve um bom desempenho. “Na parte teórica do conteúdo geralmente não tenho dificuldade. O mais difícil, às vezes, é aplicar na prática, como nos exercícios. Algumas matérias são mais difíceis, como Cálculo”, explica a jovem. Diante das dificuldades, ela é determinada em sempre fazer seu melhor. “Não quero só passar nas disciplinas, meu objetivo é sempre aprender o conteúdo ao máximo”, diz, decidida.
Desde o semestre passado, Andreza está em busca de um tutor. “Ainda não consegui. Alguns colegas até manifestaram interesse em ajudar sem compromisso, mas quando falo sobre ser tutor, a resposta sempre é não”, lamenta a jovem. Questionada sobre o porquê das negativas dos colegas, ela responde: “sinceramente, não sei, as respostas me parecem vagas. Dizem que não se sentem seguros, que não têm disponibilidade, então não me sinto confortável para perguntar mais. Essa é a experiência que tenho até hoje”.
Apesar das recusas que a entristecem, ela não desanima. “Vou continuar tentando. O tutor vai me ajudar e pode ser que amanhã seja eu que ofereça ajuda com outro conteúdo que eu entenda mais que ele. Consiste em uma troca e talvez seja isso que as pessoas não entendam. O tutor não estará apenas doando, mas também recebendo", reforça.
A consideração é confirmada pela tutora Ana Angélica Alves, acadêmica do terceiro semestre de Licenciatura em Língua de Sinais Brasileira (Libras)/Português como Segunda Língua. “Todo dia a gente aprende com o outro. As pessoas com deficiência têm suas diferenças, mas todos são capazes. É uma troca de aprendizado e uma experiência que nos transforma”, garante a universitária, tutora desde o primeiro semestre do curso.
Ana Angélica não conhecia a iniciativa, mas aceitou com prontidão o convite do colega de curso Luiz Carlos Lino para ser sua tutora. “Eu nunca havia tido contato próximo com pessoas com deficiência. Foi como entrar em um mundo totalmente diferente, mas que sempre existiu. É a oportunidade de dar lugar à acessibilidade e à inclusão. É tornar a UnB mais humana, respeitando a limitação do outro e olhando para ele não como diferente, mas como igual”, relata a estudante, que incentiva outros universitários a vivenciar a experiência.
Com sorriso no rosto, o tutorado Luiz Carlos Lino, de 22 anos, expressa gratidão à parceria de Ana Angélica. “Ela me ajuda muito, me apoiando dentro e fora da sala de aula com estudo compartilhado. É muito bom”, garante o jovem, que tem deficiência física, auditiva e baixa visão.
COMO FUNCIONA – Para se candidatar a uma vaga como tutor, basta comparecer ao Programa de Apoio às Pessoas com Necessidades Especiais (PPNE), localizado na ala norte do ICC, sala BT 678, do campus Darcy Ribeiro. O interessado deve portar a carteira estudantil ou documento comprobatório do vínculo universitário.
Para ser tutor é preciso atender alguns critérios, como estar matriculado ou ter cursado com aprovação disciplina em que haja estudante com deficiência solicitando o apoio acadêmico. O candidato não pode estar em outro vínculo de monitoria ou tutoria, mesmo que voluntária. Outra exigência é não ter reprovado em disciplina obrigatória de seu curso no semestre anterior. Os demais requisitos podem ser conferidos na Resolução do Cepe nº 10/2007.
Ao término do semestre, a atividade fornece dois créditos de módulo livre para o tutor, além de ficar registrada no histórico escolar. Há duas categorias de participação: tutoria voluntária, sem auxílio financeiro; ou tutoria remunerada, com concessão de bolsa de R$ 450. Na seleção para tutoria remunerada, é dada preferência a estudantes de baixa renda com estudo socioeconômico comprovado no Decanato de Assuntos Comunitários (DAC).
Thaís Imperatori, coordenadora do PPNE, explica que a proposta da iniciativa vai além do estudo compartilhado, com foco no acolhimento. “É uma ferramenta importante para promover a socialização na universidade e proporcionar o convívio com a pessoa com deficiência”, garante.
Outro objetivo é superar barreiras de preconceitos. “É frequente a ideia de que o estudante com deficiência sempre tem mais dificuldade de aprender, enquanto muitas vezes ele só precisa de acessibilidade”, observa Imperatori. Para quem se sente despreparado para a experiência, ela informa que o programa oferece suporte para tutores e tutorados, visando a melhor adequação e desenvolvimento das atividades.
“O primeiro princípio é que não existem regras fixas. Cada estudante tem uma necessidade e isso é avaliado e planejado individualmente. O segundo princípio é que ninguém está totalmente preparado. O mais importante é estar aberto para vivenciar essa experiência”, assegura Imperatori.
Outra recomendação é aprender com o tutorado. “Em caso de dúvidas, perguntar é sempre a melhor alternativa. Ninguém melhor que a própria pessoa com deficiência para saber quais adaptações e recursos ela precisa”, acrescenta a coordenadora do programa.
Calouro de Ciência da Computação, Guilherme Silva está animado para a troca de experiência. “Meu tutor se cadastrou na semana passada, agora só falta combinarmos o horário de estudo. Ele parece ser bem legal e, para mim, o principal da tutoria é o relacionamento. Ele pode aprender comigo e eu posso aprender com ele”, conta o universitário de 23 anos, que tem paralisia cerebral e deficiência física.
Desde sua criação, o Programa de Tutoria Especial já somou a participação de 1.548 estudantes tutores e 760 tutorados. No ano passado, 83 alunos com deficiência realizaram estudo compartilhado com 155 tutores. Vale lembrar que a tutoria é por disciplina, e não referente a todo o curso.
CONHEÇA – O PPNE tem como objetivo garantir igualdade de oportunidades e condições adequadas para o desenvolvimento acadêmico de alunos com deficiência. A adesão é voluntária e destinada a membros da comunidade acadêmica com deficiência sensorial, física, dislexia, transtornos globais do desenvolvimento, transtorno de déficit de atenção ou hiperatividade. O cadastro é feito mediante laudo médico com o diagnóstico do caso.
>> Saiba mais sobre o Programa de Apoio às Pessoas com Necessidades Especiais (PPNE)