Nesta quinta-feira (7), quatro teses desenvolvidas no âmbito da pós-graduação da Universidade de Brasília serão laureadas na cerimônia de entrega do Prêmio Capes de Tese 2017. São trabalhos de quatro áreas distintas: Literatura, Psicologia, Relações Internacionais e Sociologia. Duas pesquisadoras – Karine Brito e Ligia Diniz – e dois pesquisadores – Pedro Herculano Guimarães e Ulysses Tavares – são os recém-doutores de destaque.
Pedro Herculano Guimarães é autor da tese A desigualdade vista do topo: a concentração de renda entre os ricos no Brasil, 1926-2013, desenvolvida no Departamento de Sociologia (SOL). A pesquisa também ganhou o prêmio da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs) de melhor tese de 2017 em Ciências Sociais.
“O trabalho do Pedro é muito importante, pois ajuda a contar a história econômica do Brasil pela ótica da desigualdade. Isso nos permite não só entender o passado, mas também pensar melhor sobre o que fazer em relação ao futuro. A pesquisa sobre a história da desigualdade é fundamental para desenhar políticas de desenvolvimento de longo prazo no país”, observa Marcelo Medeiros Coelho, professor orientador da tese.
Para Pedro Guimarães, olhar para a desigualdade a partir do topo é fundamental. "Em termos bem simples, é lá que está o dinheiro. O que faz do Brasil um país tão absurdamente desigual para padrões internacionais é justamente a concentração que existe no topo”, explica. Ele destaca como um dos efeitos colaterais desta concentração a distorção dos fundamentos da democracia, uma vez que "a má distribuição dos recursos favorece a captura do Estado por grupos de interesse".
O sociólogo espera que a tese possa estimular um debate maior sobre dois assuntos: a concentração de renda no topo e a trajetória de longo prazo da desigualdade no Brasil. “No primeiro caso, espero que um maior interesse acadêmico sobre o tema convença a Secretaria da Receita Federal a divulgar mais informações extraídas das declarações anuais de imposto de renda”, projeta.
A satisfação de ganhar o Prêmio Capes foi vivenciada em dobro por Pedro. Isso porque sua esposa, Lígia Diniz, também foi laureada com a tese Por uma impossível fenomenologia dos afetos: imaginação e presença na experiência literária, desenvolvida no Departamento de Teoria Literária e Literaturas (TEL), sob orientação do professor Robson Coelho Tinoco.
“Receber o prêmio junto com o Pedro – cada um em sua área – mais do que dobrou o contentamento. Afinal, trabalhamos todo o tempo lado a lado, dividimos as angústias e o cansaço. É incrível podermos compartilhar também a alegria”, comenta a recém-doutora.
Lígia conta que procurou responder na tese a seguinte pergunta: como uma atividade tão intelectual como a leitura de textos literários pode afetar tão intensamente nossas emoções e nossos sentidos?
“Para responder a essa questão, pesquisei e desenvolvi uma teoria a respeito da imaginação como uma dimensão híbrida da consciência, na qual sensações, memórias e imagens projetadas pela leitura literária se misturam", enuncia. "Com isso, proponho que, ao lermos poemas, romances, etc., ao mesmo tempo em que interpretamos e apreciamos intelectualmente, também vivemos corporeamente os efeitos dessas leituras”, completa.
Segundo Lígia, a pesquisa contribui para uma abordagem da leitura de literatura que escapa à regra de entendê-la exclusivamente como um processo de interpretação e produção de sentidos, colocando o corpo do leitor no centro da experiência. “Com isso, creio oferecer também subsídios para que pensemos ferramentas eficientes na formação de leitores nas diversas etapas da educação”, destaca.
VIOLÊNCIAS – Também focando grupos inseridos em processos educacionais, Karine Brito desenvolveu, no Departamento de Psicologia Clínica (PCL), a tese Mobilizando comportamentos de ajuda na rede de amizades: Uma estratégia de prevenção à violência no namoro baseada nos pares e na abordagem do espectador.
Orientada pela professora Sheila Giardini Murta, a recém-doutora elaborou uma intervenção para adolescentes do ensino médio, com faixa etária entre 15 e 18 anos. “Mobilizar comportamentos de ajuda é a grande chave para prevenir a violência no namoro, pois a rede de amizades fortalecida atua como fator de proteção para os adolescentes nesses contextos”, avalia.
“A tese tem o propósito de problematizar o mito de que não convém intervir em briga de casais. O que se observa é que as pessoas tendem a ajudar mais quando conhecem a potencial vítima ou agressor, do que quando são desconhecidos”, comenta Karine. A pesquisadora explica que a abordagem a partir do espectador é uma estratégia de ponta que auxilia no ensino de habilidades de ajuda aos adolescentes, ao fornecer modelos de papéis efetivos e seguros para se tornar um espectador ativo diante de situações de violência no namoro.
A pesquisa aponta que os adolescentes, ao se conscientizarem sobre o processo de tomada de decisão do espectador, se mostram mais propensos a ajudar, na medida em que reconhecem as principais barreiras à intervenção. Essas limitações envolvem não apenas variáveis de personalidade, como também fatores de influência social que estão em jogo na situação. “As pessoas carecem de informações sobre o que dizer ou fazer quando são espectadores de situações de violência no namoro e falham em ajudar por falta de habilidades”, pontua.
A tese campeã de Ulysses Tavares também aborda a temática de violência, desta vez em um escopo de relações internacionais. Intitulada Promoção de democracia e apoio a governos autoritários pelos Estados Unidos: transições de regime e realinhamentos de política externa no Irã e no Egito, a pesquisa foi desenvolvida com orientação da professora Maria Helena de Castro Santos.
Estudante da UnB desde a graduação, Ulysses começou a investigar o tema em 2007. A tese procura responder duas perguntas. A primeira questiona se o apoio norte-americano a governos autoritários se tornou combustível para a legitimação de movimentos antiamericanos em governos liberalizantes. A segunda procura saber como justificar o discurso democrático dos EUA e o apoio a ditaduras.
Nos anos englobados pelo estudo, Irã e Egito passaram, cada um, por três períodos de liberalização política. Esses seis períodos, no total, foram analisados por Ulysses. A tese destaca que não apenas os aspectos políticos e econômicos são relevantes nas questões de política externa. “Eles não dão conta de todo o jogo político nas relações internacionais”, ressalta, afirmando que é preciso também levar em consideração componentes ideacionais. “A tese chama a atenção para esta variável”, reforça a professora Maria Helena. “Muitos estudantes não percebem isso. Não observam que a explicação é geralmente simplista, apenas focada em interesses materiais e geoestratégicos”, completa a docente.
PRÊMIOS – A premiação promovida pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) consiste em diploma, medalha e bolsa de pós-doutorado nacional de até 12 meses para o autor da tese; auxílio para participação em congresso nacional para o orientador, no valor de R$ 3 mil; distinção a ser outorgada ao orientador, coorientador e ao programa em que foi defendida a tese; além de passagem aérea e diária para o autor e para um dos orientadores da tese premiada, para que compareçam à cerimônia de premiação.
Nesta quinta-feira (7), a melhor tese selecionada entre as vencedoras do Prêmio Capes, agrupadas em três grandes áreas, receberá o Grande Prêmio, que se dá em parceria com a Fundação Conrado Wessel. O Grande Prêmio consiste em certificado, troféu e bolsa de pós-doutorado internacional de até 12 meses para o autor da tese; auxílio para participação em congresso internacional, para o orientador, no valor de R$ 9 mil; e certificado de premiação ao orientador, coorientador e ao programa em que foi defendida a tese. Pela Fundação Conrado Wessel, são oferecidos três prêmios no valor de 15 mil dólares cada, um para cada premiado nas três grandes áreas.