OPINIÃO

José Matias-Pereira é economista e advogado. Possui doutorado em Ciência Política pela Universidade Complutense de Madri (UCM-Espanha) e pós-doutorado em Administração pela Universidade de São Paulo (FEA/USP). É professor-pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Ciências Contábeis da Universidade de Brasília. Autor, entre outros livros, de Finanças Públicas, 7. ed. GEN-Atlas, 2018.



José Matias-Pereira


A sociedade brasileira, sob a égide de uma severa depressão econômica no biênio 2015-2016, em decorrência da crise econômica-política-ética, vem sendo afetada pelo aumento acelerado do desemprego, queda na arrecadação e descontrole das finanças públicas. É sabido que, para reverter esse cenário socioeconômico preocupante serão necessárias, além de medidas de austeridades, a implementação de reformas estruturais, para permitir que o Brasil supere os seus gargalos econômicos e retome o caminho do crescimento. Destaca-se, entre essas reformas, a da Previdência Social.


Registre-se que o sistema de previdência social público brasileiro se caracteriza como contributivo, quanto ao custeio, e de repartição, quanto à forma de utilização de seus recursos, definindo, assim, seu aspecto de solidariedade. Esse sistema se compõe do Regime Geral de Previdência Social – RGPS, do Regime Próprio dos Servidores Públicos e do Regime Próprio dos Militares dos Estados e do Distrito Federal. Essa tarefa assumida pelo Estado visa garantir um direito social específico: a previdência social, a uma parcela da coletividade, composta de trabalhadores do setor privado e os servidores públicos.


Essa reforma tem como motivação os crescentes déficits do sistema previdenciário no Brasil. Em 2016 o Governo Central – Tesouro Nacional, Previdência Social e Banco Central – registrou déficit primário de R$ 154,2 bilhões. Desse total, R$ 149,7 bilhões (97%) vieram exclusivamente da Previdência Social, o que comprova que a deterioração das contas públicas acompanhou o crescimento do déficit da Previdência. Por sua vez, o déficit da Previdência dos servidores federais registrou um rombo de R$ 77,1 bilhões em 2016. É importante alertar que, a sociedade será chamada para financiar esses déficits crescentes.

 

Os indicadores socioeconômicos mostram que os brasileiros estão vivendo mais. Dessa forma, a tendência é que a população terá mais idosos, e os jovens, que sustentam o regime, diminuirão. Assim, a proposta em discussão é estabelecer uma idade mínima de aposentadoria de 65 anos, e unificação das regras de aposentadoria entre trabalhadores da iniciativa privada e servidores públicos federais. Os militares ficaram fora da reforma da Previdência que se encontra tramitando no Congresso Nacional.


Motivado por esse cenário é que tratarei de um tema que tem sido relegado a um plano secundário nas discussões que se travam no Congresso Nacional: o atendimento ao princípio do equilíbrio financeiro e atuarial da Previdência Social.


As reformas no Sistema de Previdência Social do Brasil, introduzidas pelas Emendas Constitucionais nº 20, de 1998 e nº 41, de 2003, promoveram diversas alterações no texto constitucional e na estrutura previdenciária brasileira. Essas mudanças, tanto no seu Regime Geral como nos Regimes Próprios, tiveram uma relação direta com o seu desequilíbrio financeiro e atuarial. O princípio do equilíbrio financeiro e atuarial foi inserido na Constituição Federal tanto para os trabalhadores da iniciativa privada – art. 201 –, quanto para os servidores públicos – art. 40. Por sua vez, a necessidade de financiamento da Previdência Social é sempre compensada pelo poder público. Assim, é importante entender que uma reforma consistente da Previdência Social exige o atendimento ao princípio do equilíbrio financeiro e atuarial.


O Princípio do Equilíbrio Financeiro e Atuarial está baseado em dois conceitos: o conceito do equilíbrio financeiro e o conceito do equilíbrio atuarial. O equilíbrio financeiro se refere ao equilíbrio entre o que se arrecada com as contribuições previdenciárias, contribuições do empregado e empregador, e o que se gasta com os benefícios previdenciários, como pensões, aposentadorias, auxílios-doença, entre outras. O conceito de equilíbrio atuarial diz respeito à relação entre o total das contribuições que determinado segurado faz para a previdência, considerando a contribuição de seu empregador, com as despesas de seu futuro benefício, se preocupando, dessa forma, com o custeio de cada benefício no futuro.


Constata-se, portanto, que o equilíbrio financeiro busca equacionar o sistema como um todo, de forma global, considerando diversas variáveis, para que não exista déficit financeiro no sistema e, assim, a previdência possa manter um equilíbrio entre suas receitas e despesas; enquanto o equilíbrio atuarial se refere à relação entre o montante utilizado para manter certo benefício e o montante arrecadado como contribuição para custear esse mesmo benefício. As contribuições feitas pelo trabalhador e pelo seu empregador, sobre sua renda, precisam ser suficientes para cobrir o montante que será destinado ao seu benefício.


Pode-se argumentar, portanto, que o grande desafio, na atualidade, dos governantes nos três níveis de governo é a que trata da efetivação do equilíbrio financeiro e atuarial da Previdência Social. É sabido que a preocupação com a observância dos critérios que preservem esse equilibro financeiro e atuarial tem como objetivo assegurar a proteção dos seus segurados em longo prazo. Por sua vez, a relevância de sua função social impõe que as suas necessidades de financiamento sejam compensadas pelo poder público, o que pode comprometer os orçamentos públicos em todas as esferas de governo. Ou seja, a manutenção desse direito, quando ocorrem desequilíbrios, se torna um ônus pesado para a sociedade como um todo.


Torna-se possível concluir, diante desse cenário, que a implementação de uma reforma consistente e profunda da Previdência Social no Brasil, como vem sendo destacada reiteradamente nos discursos oficiais, além de incluir os militares, necessita estar apoiada em estudos técnicos e atuariais consistentes, para evitar em médio prazo, seja necessária a realização de uma nova reforma da Previdência Social.

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