Nelia Del Bianco
O rádio é historicamente observado na academia como um meio esquecido (Pease; Dennis, 1995), o primo pobre que recebe a menor parcela do bolo publicitário (Ortriwano, 1985), um meio cego (Crisell, 1994) ou invisível (Lewis; Booth, 1989) devido às características de sua linguagem e formas de recepção.
Porém o rádio é, sobretudo, resiliente. Transforma limitações técnicas da unisensorialidade em forças. É pelo poder da tradição cultural oral que se converteu no meio dos afetos. Como dizia McLuhan (1995), o rádio afeta as pessoas em profundidade, oferecendo uma experiência ao mesmo tempo particular e coletiva, enraizada nas práticas culturais do cotidiano. Como ouvir as notícias da manhã, conversar ao telefone com o comunicador predileto sobre os mais variados assuntos ou simplesmente apreciar música enquanto está no transito.
O rádio é algo que se pode transportar, não requer transmissão de dados, nem largura de banda da internet e é livre de custos. A acessibilidade tecnológica e o baixo custo de produção fizeram-no popular e o preferido para ativistas e movimentos populares.
No Brasil, alcança 89% da população nas principais regiões metropolitanas, o equivalente a 52 milhões de pessoas. Em média, as pessoas passam 4h36 sintonizados diariamente em alguma emissora, o que representa cerca de 20% do seu dia, segundo pesquisa Kantar IBOPE Media de 2017.
Diante da multiplicidade de oferta de plataformas, detém a confiança de 57% dos brasileiros, índice superior ao TV com 54%, de acordo com a Pesquisa Brasileira de Mídia 2016, realizada pela Secretaria de Comunicação do Governo Federal. E, ainda, desbanca a internet: 78% não confiam nas informações que circulam na web e 83% não acreditam nas redes sociais.
O rádio não perdeu seu propósito básico de interlocução mesmo diante do avanço das mídias digitais. Ancorado na experiência social sua relevância se prova na adversidade. Em situações de catástrofes naturais, guerras, desastres é ágil em informar e orientar a busca de socorro quando outros meios se tornam inacessíveis.
A permanência do rádio no ecossistema midiático reside na capacidade de absorver novas tecnologias. Integrado à internet e aos dispositivos móveis oferece conteúdos sonoros em linguagem hipertextual e interativa, proporcionando ao público experiências diferenciadas. Em particular, o celular tem alargado a mobilidade do rádio proporcionando uma espécie de conectividade perpétua (Castells et al, 2007) ao estar disponível em qualquer local e em tempo real com a vantagem da interação imediata.
Não faltam prognósticos quanto ao fim do rádio engolido pela internet. Em uma era que prioriza o conteúdo personalizado, sem dúvida o meio ainda é capaz de oferecer programação para todo tipo de gosto musical e conteúdo informativo. É a soma perfeita da imensa flexibilidade e da relevância do conteúdo de proximidade que mantém a identificação com a audiência. Quem tem dúvida percorra qualquer cidade do interior do país e pergunte onde é a sede da principal emissora de rádio. Todos saberão indicá-la.
Referências
CASTELLS, Manuel; ARDÉVOL, Miréia Fernández; QIU, Jack Linchuan; SEY, Araba. Comunicação móvil y sociedad: una perspectiva global. Barcelona: Ariel, Fundação Telefónica, 2007.
CRISSEL, A. Understanding Radio. Londres: Routledge, 1994.
LEWIS, P.M; BOOTH, J. The invisible medium. Basingstoke: Macmillan Llosa, 1989.
MCLUHAN, Marshall. Os meios de comunicação como extensões do homem. São Paulo: Cultrix, 2005.
PEASE, E; DENNIS, E. Radio – the forgotten medium. New Brunswick: Transaction Publishers, 1995.
ORTRIWANO, Gisela S. A informação no rádio – Os grupos de poder e a determinação dos conteúdos. São Paulo: Summus, 1985.
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