Acontece nos dias 28 e 29 de agosto, no auditório do Memorial Darcy Ribeiro, o Beijódromo, no campus Darcy Ribeiro, o seminário Mulheres na Ciência e 100 anos de Berta Ribeiro, antropóloga e etnóloga que dedicou a vida a conhecer e valorizar as tradições indígenas brasileiras.
Nascida na Romênia em 1924, Berta veio para o Brasil com a família na década de 1930. Casada quase trinta anos com o antropólogo Darcy Ribeiro, conheceu diferentes comunidades indígenas, como os Kadiwéu, no Pantanal mato-grossense, e os Yawalapiti, Txikão e Kayabí, no Xingu, vindo a se tornar uma referência na área de Museologia e Antropologia, principalmente por seu trabalho sobre arte e cultura indígenas. Foi servidora do Museu Nacional no Rio e professora na UFRJ. Em 1995, recebeu do governo brasileiro a medalha de comendadora da Ordem do Mérito Científico, vindo a falecer em 1997.
“Durante muito tempo, as mulheres cientistas foram apagadas em função de seus maridos e Berta é um caso clássico desses”, diz Beth Brêa, uma das organizadoras do seminário e membro do Conselho Diretor da Fundação Darcy Ribeiro, em entrevista sobre o legado de Berta no canal History of Science. Segundo Beth, Berta foi vista como auxiliar de Darcy a vida inteira, apesar de sua enorme contribuição para o entendimento e divulgação do que é a Antropologia feita no país e de quem são os povos indígenas e seu lugar na realidade brasileira.
“Ainda tem muito a ser estudado sobre Berta”, ressalta Beth, que cita, entre as iniciativas pioneiras da pesquisadora, a cessão de todos os direitos autorais do livro Antes o mundo não existia ao povo indígena Desâna. Publicada em 1980, a obra é resultado de sua estadia naquela aldeia localizada no Alto Rio Negro, Amazonas, durante estudos sobre o trançado indígena. À época, contribuiu com Umúsin Panlõn Kumu e seu filho, Tolamãn Kenhirí, a dar redação definitiva a um conjunto de mitos que descrevem a história da criação do mundo sob a gênesis de seu povo.
Para a antropóloga Bruna Martins, que recebeu, este ano, o prêmio Martin Novión, promovido pelo Departamento de Antropologia da UnB, pela monografia O legado etnomuseológico de Berta Ribeiro e o Memorial dos Povos Indígenas, “uma das características mais marcantes de Berta é, justamente, o olhar cuidadoso e atento de encontrar os entrelaces entre áreas que, a priori, não se conectam. Ela foi uma pesquisadora e ativista múltipla, que possuía esse dom de enxergar os nós entre a Ecologia, a Antropologia, a Museologia e a Arte”.
“Vejo que o estudo da arte indígena é, também, o estudo da ecologia daquele lugar, porque é o meio que provém os materiais para o feitio da arte. É como se a intimidade com a ecologia e a adaptação ao espaço físico fosse tão plena que transborda na arte, e, a meu ver, o trabalho de Berta Ribeiro possui esse poder de olhar para os diversos espaços da vida cotidiana como entrelaçados e não somente áreas de estudo. Há um cuidado por parte dela em considerar o todo”, completa.
Bruna ainda destaca a importância do trabalho de Berta no campo da Museologia ao propor a construção do Museu do Índio em Brasília (posteriormente renomeado para Memorial dos Povos Indígenas) na década de 1980 e “a urgência em se pensar o museu como parte de algo maior em que se preservam as narrativas indígenas sem colocá-las em um passado remoto ou exotizante”.
Beth Brêa conta que Berta escreveu um plano-diretor do, então, Museu do Índio, no qual detalhou os objetivos e as propostas do novo espaço. Ademais, “doou para lá uma coleção composta por 380 peças etnográficas, resultado de mais de 40 anos de pesquisas realizadas por ela, Darcy Ribeiro e Eduardo Galvão”, detalha.
Para Brêa, o legado de Berta Ribeiro é um testemunho da importância da presença das mulheres no campo das ciências, em particular, das Ciências Sociais. “Comemorar os 100 anos de Berta significa comemorar o papel pioneiro e inovador das mulheres no pensamento científico e na construção do país”, decreta.
PROGRAMAÇÃO – Organizado pela UnB em parceria com a Fundação Darcy Ribeiro, o evento abre, no dia 28, quarta-feira, às 19h30, com uma conferência de Pagu Rodrigues, diretora de Proteção de Direitos do Ministério das Mulheres. No dia 29, às 9h, com mediação de Braulina Baniwa, Adélia Miglievich, Márcia Mura, Regina Abreu e Mariana Moraes falam sobre o tema Mulheres no campo e no laboratório. A programação segue com o painel 100 anos de Berta, às 14h, e se encerra com a exibição do curta de animação Gaín Pañan e a origem da pupunheira, de Luiz Fernando Perazzo, e do documentário Para Berta, com amor!, de Bianca França.