COMPORTAMENTO

Mais de duas mil pessoas de 25 Unidades da Federação participaram da pesquisa

Estudo desenvolvido por doutoranda da UnB identifica principais motivos que levam alguns brasileiros a ignorar as medidas de isolamento social contra o novo coronavírus. Foto: Lucio Bernarno Jr/Agência Brasília

 

Renda, status profissional e posição política afetam, de fato, o comportamento das pessoas em relação ao isolamento social – medida de combate ao novo coronavírus adotada no Brasil e em diversos outros países. Foi o que constatou a pesquisa realizada por Jéssica Farias, estudante de doutorado do Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social, do Trabalho e das Organizações da Universidade de Brasília.

 

Entre 31 de março e 3 de abril, ela entrevistou 2.056 indivíduos de 25 Unidades da Federação por meio de formulário eletrônico. Com idades entre 18 e 88 anos, os participantes são majoritariamente mulheres (72%), com alto grau de instrução (56,7% têm curso de pós-graduação em andamento ou concluído) e com renda entre quatro e dez salários mínimos. As cinco regiões do país foram contempladas no estudo.

 

De acordo com a doutoranda, no grupo analisado, estudantes e desempregados demonstraram maior intenção de violar o isolamento social. Já os aposentados tiveram a menor intenção.

 

“Pessoas com menor renda, sem estabilidade profissional e com posicionamento no espectro político de direita tendem a violar mais o isolamento. Pessoas com alta intolerância a incerteza, uma variável que se relaciona com a ansiedade, também”, conta Jéssica Farias.

 

As variáveis em foco na pesquisa foram três: atitude quanto ao distanciamento social, intenção de violá-lo e opinião relativa a declarações dadas pelo presidente da República. Além destas, também foram consideradas a intolerância a incerteza, o partidarismo político, o status profissional e a renda percebida pelos participantes.

 

No artigo, a pesquisadora afirma que o posicionamento político tem impacto significativo nas atitudes referentes ao isolamento social: as pessoas tendem a questionar mais ou menos as medidas restritivas conforme suas crenças políticas. “É importante não polarizar o combate ao vírus porque acabar com essa pandemia está no interesse de todos, independentemente de partido político”, destaca a doutoranda.

 

POLÍTICAS PÚBLICAS – A intenção de Jéssica Farias é que os achados de sua pesquisa possam subsidiar governadores e demais autoridades a direcionar as atuais políticas públicas de combate à Covid-19. “O investimento em políticas de transferência de renda é essencial para que as pessoas de renda mais baixa possam permanecer em casa”, constata. Hoje é possível ter auxílio financeiro dos governos federal e distrital, além de outros disponíveis, conforme a situação do requerente.

Jéssica Farias aplicou questionários virtuais com 63 itens para serem respondidos. Foto: arquivo pessoal

 

“Sobre intolerância a incerteza e ansiedade, é relevante fornecer suporte psicológico para as pessoas que estão apresentando grau de ansiedade mais elevado, já que esse tem demonstrado ser um fator que interfere na violação do isolamento social e, portanto, no combate à pandemia”, avalia.

 

Jéssica Farias sugere a formação de parcerias entre governos e universidades, por exemplo, para fornecerem tal suporte. “O ideal seria um atendimento on-line para não desrespeitar as medidas de isolamento social, e não colocar psicólogos nem pacientes em risco”, completa a doutoranda.

 

Na UnB, o Centro de Atendimento e Estudos Psicológicos (Caep), vinculado ao Instituto de Psicologia, tem a finalidade de prestar serviços psicológicos à comunidade acadêmica e à sociedade de modo geral, e tem oferecido plantão de apoio emocional durante a pandemia. Por meio de escuta pontual, qualificada e acolhedora, terapeutas ajudam as pessoas a organizarem os sentimentos e lidarem com as emoções e os desafios únicos desse período.

 

Em regra, a marcação de atendimentos é feita somente por telefone às segundas-feiras, a partir das 8h30, no número (61) 3107-1680. Durante o período de isolamento social, porém, é possível marcar em outros dias da semana, conforme a disponibilidade dos profissionais. Para isso, é necessário mandar mensagem pelo aplicativo WhatsApp nos horários indicados na página do centro, diretamente para os telefones divulgados pelos terapeutas.

 

O número de vagas é restrito. Caso todos estejam ocupados no momento do contato, é possível ainda ligar para o Centro de Valorização da Vida (CVV) no telefone 188.

 

O subcomitê de saúde mental e apoio psicossocial do Comitê Gestor do Plano de Contingência da Covid-19 (Coes), liderado pela Diretoria de Atenção à Saúde da Comunidade Universitária Dasu/DAC, também está realizando diversas atividades de acompanhamento psicológico e psicossocial, de forma remota, para toda a comunidade (professores, estudantes e técnicos administrativos). Contatos podem ser feitos por meio do e-mail Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.. Para saber mais, acesse o Boletim do Coes

 

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PSICOLOGIA SOCIAL – Este campo da psicologia contribui de diferentes formas para a sociedade, mas, de forma especial, pode fornecer contribuições fundamentais para o enfrentamento de emergências como essa que se vive atualmente por conta da Covid-19.

A psicologia social interpreta diversos comportamentos da sociedade e pode auxiliar na elaboração de políticas públicas. Foto: Dênio Simões/Agência Brasília

 

“A psicologia social contribui para a compreensão de algumas variáveis que interferem nesse tipo de comportamento e, assim, pode auxiliar na elaboração de políticas públicas de combate à pandemia”, explica Jéssica Farias.

 

“Esse ramo da psicologia estuda o comportamento das pessoas em sociedade. Então, pensei em pesquisar a violação do isolamento social, que é uma das medidas mais eficientes no combate à pandemia. Esse comportamento envolve violação de normas, que é algo que eu já estudo no meu doutorado. Gostaria de contribuir de alguma forma”, declara a estudante, que deve concluir o curso até fevereiro de 2022.

 

O docente Ronaldo Pilati, orientador de Jéssica e coautor do artigo em questão, lembra que a intenção da dupla foi entender os fatores que influenciam na adesão ao distanciamento social.

 

“Na psicologia social consideramos fatores do indivíduo, da situação social imediata em que esse indivíduo se encontra e a forma como ele compreende e interpreta a realidade à sua volta para entendermos como as pessoas se comportam nos diversos ambientes em que vivem. No caso específico, nosso alvo foi compreender a adesão ao distanciamento social”, conta.

 

Pilati destaca que os resultados encontrados indicam que o sucesso de uma política de isolamento apenas ocorre se estratégias de intervenção nas atitudes da população também forem trabalhadas.

 

“Sem discursos contraditórios e não enquadrando as ações de combate a pandemia no âmbito da polarização política que vive o país nos últimos anos”, ressalta.

 

O artigo de Jéssica Farias e Ronaldo Pilati foi submetido a uma revista científica internacional e está em análise no momento. A versão preliminar com os dados obtidos, em inglês, está disponível para consulta on-line.

 

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