O trabalho remoto tem alto percentual de aprovação no Distrito Federal, mesmo em período de grande adaptação e estresse em casa, como o constatado durante a pandemia do novo coronavírus. De acordo com estudo realizado em 93 órgãos públicos do DF pelo grupo de pesquisa E-Trabalho, do departamento de Psicologia Social e do Trabalho da Universidade de Brasília, 92% dos servidores consideram positiva a experiência durante a pandemia, 4% a avaliam como negativa e outros 4% são indiferentes.
“Há relatos de que o trabalho remoto não foi, para servidores públicos, uma dificuldade. Eles têm habilidades necessárias para aprenderem as ferramentas. No serviço público, a escolaridade geralmente é alta, então dominaram rapidamente essas tecnologias”, conta a professora de Psicologia Organizacional e do Trabalho da UnB, Gardênia da Silva Abbad. A docente lidera o grupo responsável pela pesquisa Trabalho Remoto no GDF – Enfrentamento à Pandemia Covid-19.
Apesar do alto índice de aprovação, ela destaca que também foram identificados impactos negativos em alguns grupos de servidores durante a pandemia, sobretudo de lares onde há crianças em idade escolar. “Encontramos dificuldades muito expressivas nas famílias com crianças pequenas: homens e mulheres dividindo afazeres domésticos e cuidados com os filhos em idade escolar. Com a pandemia, o trabalho remoto associou-se à perda de uma rede de apoio, familiar e de empregados domésticos, e ainda adicionou o home schooling".
Outras dificuldades constatadas foram em relação a não haver um local específico da residência preparado para o home office, à época em que ele se tornou compulsório no DF como medida de prevenção à covid-19, e à organização do trabalho desempenhado pela equipe.
“Gestores relataram dificuldades para conciliar os horários das pessoas, em função exatamente de terem os afazeres domésticos, o acompanhamento das escolas das crianças e os trabalhos. Nessas famílias, que têm outras pessoas em casa dividindo equipamentos, espaço e afazeres, o que se observa é um aumento do estresse relacionado a isso”, complementa Gardênia.
Porém, a docente ressalta que o teletrabalho, por si só, não foi algo traumático para o público estudado na pesquisa. “O traumático é não ter com quem contar para apoiar nas atividades domésticas e nos cuidados com filhos e idosos, que requerem espaço de tempo na agenda.”
De fato, o estudo aponta que, em um cenário pós-enfrentamento à covid-19, 89% dos servidores expressam o desejo de seguir com atividades remotas – 33% desses gostariam que fossem todos os dias e 56%, de duas a três vezes na semana. Entre os gestores ou líderes, 73% disseram que pretendem permitir que parte de sua equipe siga em trabalho remoto após a pandemia.
Os números surpreenderam a equipe de pesquisadores, segundo Gardênia. “Entre os servidores, quase 52% falaram que entre 76% e 100% das tarefas deles poderiam ser transformadas em trabalho remoto. Isso significa que as pessoas gostaram da experiência e acham que a maior parte daquilo que executam poderia ser feito a distância quando retornassem no 'novo normal', que não sabemos quando vai chegar”, conta a docente.
RECOMENDAÇÕES TÉCNICAS – Entre as oportunidades de melhoria e o que a equipe de pesquisadores do grupo E-Trabalho avalia que deve permanecer nas organizações pesquisadas, estão a importância de os servidores aprenderem a estabelecer limites de horário entre trabalho e outras demandas domésticas ou vindas de outras esferas de vida e de os gestores aprenderem a flexibilizar os horários de trabalho, além de lidarem com a sintonia e o engajamento da equipe.
“Envolve mais do que simplesmente conhecer as competências dos seus liderados, vai exigir que o gestor dê exemplo, que seja um modelo também de separação entre o que é exagero de trabalho e o que é limite entre trabalho doméstico e teletrabalho, que respeite as limitações e as dificuldades que as pessoas têm de operacionalizar o trabalho remoto. Uma recomendação que sempre damos é que as organizações precisam, então, mudar a cultura do presenteísmo, focado no controle de frequência. As ferramentas tecnológicas permitem hoje a avaliação por entregas de produtos, atividades, relatórios, pareceres, que podem ser vistos, armazenados, analisados”, explica a professora Gardênia Abbad.
Além dessas recomendações técnicas, ajustes em relação ao acompanhamento dos teletrabalhadores também são vistos como muito importantes pelos pesquisadores. “Temos aconselhado que tomem cuidado com o estresse em função do acúmulo de serviços domésticos e o possível conflito entre trabalho e família, no contexto atual. Fora da pandemia, a preocupação é que esses ajustes sejam vistos e que, ao longo do tempo, esse teletrabalhador seja acompanhado com entrevistas para verificar como ele está e evitar o isolamento social e profissional em longo prazo”, alerta.
Gardênia orienta os servidores que passaram a trabalhar a distância em tempo integral que tenham algum tipo de contato com a organização, seja virtual ou presencial, para manter o engajamento no trabalho ou na carreira.
“Em longo prazo, não se sabe ainda o que pode acontecer, mas há teorias e estudos fora do Brasil que mostram que, depois de passados dois a três anos em trabalho remoto, se essa pessoa não retorna e não mantém seus vínculos, não é algo tão positivo para o teletrabalhador. Então, essa é uma recomendação que fazemos aos órgãos públicos: que pensem como vão manter o vínculo, os encontros, os treinamentos, as reuniões síncronas, de modo a manter não só as relações de trabalho, mas também os vínculos de amizade, de comprometimento das pessoas com a organização. Tudo isso observamos a partir de entrevistas, grupos focais e aplicação de questionários”, detalha a docente do Instituto de Psicologia da UnB.
NÚMEROS – A pesquisa sobre o trabalho remoto compulsório em tempos de pandemia foi feita por meio do envio de questionários por e-mail aos servidores públicos do Distrito Federal. A coleta de dados foi entre 25 de abril e 31 de maio deste ano. Foram ouvidos 7.421 servidores, dos quais 1.455 possuem cargo de chefia.
No total, os questionários tinham 45 questões, que abordavam a experiência dos servidores com teletrabalho antes da propagação do novo coronavírus, características do home office (ferramentas de comunicação, mobiliário, uso individual ou compartilhado de equipamentos), interações com colegas e chefias, desafios da busca de equilíbrio trabalho-família-trabalho e dificuldades e demandas de aprendizagem.
O grupo de pesquisa E-Trabalho é composto pela coordenadora Gardênia da Silva Abbad, por uma estudante de doutorado em Administração da UnB e por outros seis alunos do curso de Psicologia.
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