No mês em que se celebra o Dia dos Povos Indígenas (19), a UnB esteve representada no Simpósio sobre Línguas Ameríndias (SAIL), realizado na Universidade do Arizona, em Tucson, Estados Unidos, nos dias 4 e 5. A professora Marina Magalhães, do Instituto de Letras (IL), líder do Núcleo de Tipologia e Línguas Indígenas (NTL), apresentou no evento resultados de seus estudos sobre a arte, a música e a poesia da etnia Guajá, que habita territórios no Maranhão.
“Meu foco é a relação que os Awa Guajá têm com a floresta e todos os seres naturais e sobrenaturais que nela habitam, e como isso se reflete na língua. Penso que o contraste entre povos com histórias de longo tempo de contato e massacre, como a dos indígenas norte-americanos, contrasta com a dos Awa Guajá, que são de recente contato e, por isso, ainda mantêm grande parte da sua cosmologia intacta”, observa a docente, que elogiou o espaço para diálogo entre realidades distintas encontrado no evento.
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SOBRE O NTL – Conforme indicado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) em seu Atlas das Línguas do Mundo em Perigo (Atlas de las lenguas del mundo en peligro – UNESCO Digital Library), o Brasil é o país da América Latina com maior diversidade de línguas nativas faladas – são mais de 170, mais que o dobro do México, em segundo lugar com 67 línguas faladas. Todas elas sofrem algum risco de desaparecimento.
Na UnB, o Núcleo de Tipologia e Línguas Indígenas (NTL) é um dos fóruns de pesquisa e discussão em prol da preservação destas línguas. Além da UnB, pesquisadores da Universidade Federal de Goiás (UFG), da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), da Universidade do Oregon, nos Estados Unidos, e do Centro Nacional de Pesquisa Científica (CNRS), da França, também integram o grupo de pesquisadores.
“Nosso objetivo é investigar fenômenos linguísticos de línguas indígenas faladas por povos originários do Brasil, descrevendo-os e explicando-os à luz da teoria funcionalista, que leva em consideração o contexto de fala e a visão de mundo dos falantes”, explica a docente, especialista na língua falada pelo povo Awa Guajá. O resultado mais recente sobre a manifestação poética dessa língua, por meio dos cantos xamânicos, foi apresentado durante o evento internacional.
Marina explica que as pesquisas do grupo não são dissociadas das ações de preservação e apoio às comunidades indígenas na luta pela conservação de suas línguas.
“Para além do âmbito da linguística, estamos envolvidos no registro e documentação das línguas, na produção de materiais didáticos voltados para as comunidades e também na formação de indígenas”, pontua. “O objetivo é garantir a ampliação da representatividade no mundo acadêmico, em parceria com os povos indígenas e a partir das demandas por eles apresentadas”, comenta a pesquisadora.
Ampliar este ramo de pesquisa, para os indígenas e com eles, é um movimento ainda em curso no Brasil, mas que vem ganhando mais espaço, principalmente, por meio das ações pensadas no âmbito da Década Internacional das Línguas Indígenas, instituída na Assembleia Geral das Nações Unidas, em 2019. “Isso têm possibilitado uma maior ênfase nesse tema em ambientes não acadêmicos, mas ainda há muito o que fazer”, reforça Marina.
Assim como no evento norte-americano, o NTL promove um encontro bianual denominado Americanistas no Cerrado, que terá sua 4ª edição realizada na UFG, no Núcleo Takinahaky de Formação Superior Indígena, com o tema: A retomada da democracia no Brasil: direitos territoriais dos povos originários.
O núcleo, composto por 37 membros, com nível técnico ao doutorado e diferentes linha de pesquisa, ainda promove discussões e eventos nos quais linguistas indígenas e não indígenas podem trocar experiências e compartilhar conhecimentos.
SOBRE O SAIL – Esta foi a décima edição do Simpósio sobre Línguas Ameríndias (SAIL), que é idealizado pelo brasileiro Wilson de Lima Silva, professor associado do Departamento de Linguística e Diretor do Programa de Mestrado em Línguas Indígenas e Linguística da Universidade do Arizona.
“A ideia do SAIL surgiu em 2013, quando eu estava iniciando minha carreira no Instituto de Tecnologia de Rochester. Lá, eu estava afiliado ao departamento de Sociologia e Antropologia, pois não há um departamento de linguística. Dois colegas daquele departamento eram indígenas, um deles era diretor de uma iniciativa da instituição que promove o engajamento de estudantes indígenas em cursos de graduação. Eles me apresentaram a um estudante que estava cursando doutorado em ciência da computação e trabalhando na criação de um dicionário digital para a língua do seu grupo. Eu conhecia alguns linguistas de instituições locais que trabalham com línguas indígenas. Então, resolvi planejar um encontro local com esses colegas”, conta Silva.
Hoje o SAIL proporciona um espaço para indígenas e parceiros de toda a América discutirem documentação, descrição, conservação e revitalização das línguas indígenas. Segundo Wilson Silva, os países mais presentes nas edições do SAIL são Estados Unidos, Canadá e México, com abordagens focadas principalmente na revitalização das línguas indígenas, documentação, aspectos linguísticos e também troca de experiências de metodologias para ensino das línguas indígenas.
Neste ano, pesquisadores vinculados a outras instituições de ensino superior do Brasil além da UnB, como Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat) e Instituto Federal de Brasília (IFB), apresentaram estudos no evento.
Para saber mais sobre os Awa Guajá, acesse estas reportagens:
>> National Geographic Brasil
>> Sumaúma
*com informações de Cleuber Amaro, da Funai.