RECONHECIMENTO

Iniciativa que busca contemplar mulheres abre inscrições para novos públicos. Objetivo é fazer contribuições técnicas em área majoritariamente masculina

Integrantes do programa BOSS comemoram a vitória no Gnome Challenge. Imagem: Reprodução/YouTube

 

O ambiente tipicamente masculino e homogêneo do mundo da computação foi a inspiração para que uma professora, alunas e egressas da Universidade de Brasília – além de colaboradoras de outras instituições e empresas – criassem um programa de tecnologia inclusivo. A ideia era, em um primeiro momento, dar oportunidade a mulheres para que pudessem se aprimorar na área e ser capazes de dar contribuições técnicas, sobretudo a comunidades de software livre, que disponibilizam códigos-fonte em ambientes altamente colaborativos.

 

Batizada de Big Open Source Siblings (BOSS), a iniciativa ganhou o prêmio internacional Gnome Community Engagement Challenge – promovido pela Fundação Gnome, uma das principais organizações mundiais de software livre – em abril. Agora, está prestes a dar início à segunda edição do programa, que pretende ser ainda mais inclusivo.

 

>> Saiba mais sobre o programa BOSS

 

“Nós temos pessoas trans, negras, bi, lésbicas e homens gays. Pessoas trans hoje temos três, eu inclusa. É algo que estamos sempre olhando e tentando melhorar”, conta a mentora e organizadora Marina Joranhezon, de 23 anos, estudante do curso de Engenharia de Software da UnB, atualmente no último semestre.

 

“É muito importante ter ganhado esse prêmio não apenas para a organização, mas para a luta e o debate que estamos trazendo por meio da BOSS. Mostra o quão importante é o que estamos fazendo para trazer pessoas de grupos sub-representados para a tecnologia. Sabemos que isso é um problema social, então poder fazer essa discussão e ganhar um prêmio de uma fundação tão grande com certeza traz visibilidade e mostra a relevância dessa questão”, opina.

 

Marina lembra que, em agosto de 2020, o grupo tinha muitas ideias do que queria fazer, mas poucos processos definidos. Rapidamente, com a prática e os retornos de colaboradoras, criou métodos e evoluiu a ponto de ganhar o prêmio internacional.

Marina Joranhezon está no programa desde seu início e atua como mentora. Foto: Arquivo pessoal
 

“É uma evolução bem significativa para uma organização que começou suas atividades efetivamente em agosto do ano passado. Hoje, temos processos bem definidos do que estamos fazendo e estamos em um grande processo de expansão”, aponta a estudante.

 

“Queremos que nossa documentação seja acessível, para que qualquer pessoa possa conhecer, refletir e reproduzir programas de mentoria para grupos sub-representados em tecnologia”, completa.

 

Maria Flor, de 27 anos, graduou-se em Comunicação Organizacional em 2017. Depois de formada, o gosto pela informática a levou a ingressar em outro curso, o de Tecnologia em Sistemas para Internet. Após integrar algumas comunidades de tecnologia do Distrito Federal, conheceu o programa BOSS. Foi selecionada e participou da iniciativa bem no início, entre agosto e novembro de 2020.

 

“Minha experiência foi a melhor possível, porque tive a oportunidade de conhecer e conviver um pouco mais com a comunidade de tecnologia do DF. Além disso, a BOSS é especial, porque é formada principalmente por mulheres e por pessoas que fazem parte de minorias sociais”, declara Maria, ao ressaltar o viés inclusivo do programa.

 

“Fora isso, foi meu primeiro contato colocando a 'mão na massa' e me deu bastante experiência e uma visão mais consolidada ainda sobre o que é o software livre e como podemos contribuir com isso. Mesmo sem ser um profissional consolidado, com muita experiência de mercado, todo mundo pode contribuir um pouco. Foi muito bom para mim, me deu muita experiência, me fez crescer muito, aprender muito”, comemora a egressa da UnB.

 

A advogada Brenda Moreira, de 27 anos, também foi mentorada na primeira edição da BOSS, mesmo vivendo na Holanda desde 2019. A meta dela é preparar-se para mudar de área profissionalmente. “Ainda não atuo na área, mas espero trabalhar com isso em breve”, afirma Brenda. E acrescenta: “A BOSS me ajudou muito a acreditar que a tecnologia também é para mim, que eu também sou capaz”.

 

Ela conta que teve contato com a iniciativa ano passado por meio da irmã, que é uma das organizadoras. Como todos os encontros são virtuais, ela pôde participar mesmo de tão longe.

 

“Achei muito incrível ter mulheres se propondo e se dedicando a ajudar outras mulheres, principalmente pelo fato de a área de tecnologia ser composta majoritariamente por homens. Me ajudou bastante a desenvolver diversas habilidades e trabalhar com tecnologias que não tive contato antes, além de ter um grupo de apoio maravilhoso, nos quais tanto as mentoras quanto as mentoradas estavam sempre dispostas a nos ajudar”, relembra.

 

PROGRAMA – A iniciativa Big Open Source Siblings (BOSS) nasceu a partir da provocação de três ex-alunas do curso de Engenharia de Software da UnB, que ainda mantêm contato com a docente da Faculdade UnB Gama (FGA), Carla Rocha, organizadora do programa. Juntas, decidiram adaptar a disciplina Métodos de Desenvolvimento de Software, que a professora leciona há anos.

A iniciativa ajudou a egressa do curso de Comunicação Organizacional Maria Flor a consolidar novos aprendizados. Ela elogia a perspectiva inclusiva do programa, sobretudo para mulheres. Foto: Arquivo pessoal

 

A professora cita que, em média, apenas 15% das pessoas no mundo que se formam em áreas da ciência da computação e afins são mulheres. Já no mercado de trabalho, elas são 10%, e apenas 3,6% dos desenvolvedores são pessoas negras e 0,9% são trans. Fora isso, afirma que geralmente as mulheres não ficam por muito tempo na área técnica da tecnologia da informação, enquanto homens permanecem até alcançarem cargos de gestão.

 

“As pesquisas mostram que isso se dá em decorrência de fatores como opressão e ambientes não receptivos. O programa surge nesse contexto de tentar incentivar mulheres a trabalhar nas áreas mais técnicas de TI. É muito importante ter uma equipe diversa para evitar um viés que chamamos de discriminação algorítmica ou fairness”, detalha Carla.

 

“Dou essa disciplina com a parte técnica, incluindo workshops de como contribuir para essas comunidades de software livre, como ensinar a pessoa a ser autodidata e aprender qualquer tecnologia, qualquer arquitetura, qualquer questão técnica relacionada. Essa metodologia é bastante madura dentro da disciplina e foi adaptada para a mentoria de forma mais enxuta, mas já validada dentro de sala de aula”, explica Carla Rocha.

  

Tal viés, segundo a docente, é quando um software não reconhece algumas parcelas da população justamente por ter sido desenvolvido por uma equipe extremamente homogênea e que não compreende ou não se atenta para certos aspectos sociais – por não serem uma questão para o contexto em que vivem.

 

COMO FUNCIONA – A iniciativa visa alcançar grupos sub-representados em tecnologia que desejam ser orientados e mentorados, a fim de aprender como contribuir para comunidades de software livre. Com três meses de duração, o programa conta com workshops técnicos, mentorias individuais semanais e lives em que profissionais desses grupos que já estão no mercado compartilham suas experiências. 

 

Segundo Carla Rocha, foram organizadas três edições da BOSS para testar o modelo de mentoria focado na promoção da diversidade: uma de open source (código livre), premiada pela Gnome; uma de jogos e outra de maratona de programação. Na execução do projeto piloto, participaram 16 mentoras e 16 mentoradas. Agora, o grupo se prepara para realizar pela segunda vez a edição de open source.

 

“Já estamos com mais de 120 inscrições de grupos sub-representados no Brasil inteiro para participar. Vamos fazer esse teste pequeno ainda (com 20 a 30 participantes), mas a ideia é conseguir escalar esse modelo de mentoria para, se der certo, na próxima atender centenas de pessoas”, projeta a docente. 

 

PRÊMIO – O grupo da BOSS venceu o Gnome Challenge após concorrer em três etapas do desafio com mais de 150 projetos de 38 países. A competição foi projetada para estimular ideias inovadoras que conectarão a próxima geração de programadores e para mantê-los ativos e engajados por muitos anos.

 

Com isso, a iniciativa vinculada à UnB recebeu aporte de 21 mil dólares da Fundação, que firmou o compromisso de ajudar o programa a encontrar novos financiamentos daqui em diante. “Eles deram o prêmio, e agora na segunda etapa, uma vez que estamos rodando o programa, são parceiros para procurar organizações que tenham interesse em continuar financiando a iniciativa”, reforça a professora Carla Rocha.

 

Assista à cerimônia de premiação:

 

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